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Nº 1565 - Ano 33
12.2.2007

Arquivo Pessoal
Amadeus Rossi e Heitor Martins
Heitor Martins (à direita), expoente da Geração Complemento, com o livreiro Amadeu Rossi

Embaixador da língua portuguesa

Ex-aluno da UFMG e integrante da Geração Complemento, Heitor Martins é professor da Universidade Indiana

Maurício Guilherme Silva Jr.

Í

cone da arquitetura de Belo Horizonte, o edifício Acaiaca, no
Centro da capital, foi, no século passado, palco do nasci- mento de brilhantes grupos artísticos e intelectuais. Na década de 1950, o prédio abrigava, em seus andares 19 e 20, a Faculdade de Filosofia (Fafi) da então Universidade de Minas Gerais, atual UFMG. Ali, Mário Casassanta, José Carlos Lisboa, Vicenzo Spinelli, Abgar Renault, Milton Campos, Artur Versiani Veloso, Alaíde Lisboa e Orlando de Carvalho eram responsáveis pela formação de novos mestres do pensamento nacional.

Um destes estudantes, integrante da chamada Geração Complemento (veja boxe) e hoje professor do Departamento de Espanhol e Português da Universidade Indiana, em Bloomington (EUA), recebeu, no ano passado, uma das mais importantes distinções acadêmicas conferidas a um docente. Organizado pela professora Darlene Sadlier, o livro Studies in honor of Heitor Martins (Luso-Brazilian Literary Studies, Volume 3 - 2006) representa uma homenagem à obra e à vida deste ex-aluno da UMG, fundador da Associação Brasileira da Indiana University (BAIU) e da Semana do Brasil em território norte-americano.

Reconhecido como um dos maiores especialistas em língua portuguesa no mundo, Heitor se recorda da vocação política da então UMG, onde ingressou em 1952: “A Fafi começava a ser o centro mais importante do que poderíamos chamar de ‘cultura liberal’ do Estado. Embora sua função prática fosse a formação de professores do ensino secundário, nem de longe pensávamos em seguir tal carreira”, conta. Na Instituição, Martins participava, ao lado de Geraldo Nunes, Sebastião Nery e Felipe Calvo, da criação de duas publicações mimeografadas, A Onda e Sebas, “esta última em homenagem à Sebastiana, funcionária da cantina”. Tal participação, segundo o professor, “valeu-lhes uma suspensão por alguns dias, coisa que nunca tinha acontecido antes com qualquer aluno”.

Influenciado pelos mestres José Carlos Lisboa e Rodrigues Lapa, Martins enveredou pelas literaturas espanhola e portuguesa. Lapa, inclusive, o estimularia a fazer concurso para livre-docente nas duas disciplinas, em 1962. “Embora aprovado, nunca lecionei na UFMG”, diz.

Teatro e exército

Em Belo Horizonte, Martins também esteve ligado às origens do Teatro Universitário e serviu o exército durante dois anos. “Excluído do CPOR em processo interno contra esquerdistas, fui para o corpo de tropa, e o golpe do general Lott estendeu meu tempo obrigatório de serviço”, relata. Atuou, ainda, como jornalista da Tribuna de Minas, do Diário de Minas, do Binômio e do Diário da Tarde.

Em 1960, terminado o bacharelado, “com um cabide de empregos burocráticos e sem a possibilidade de seguir carreira universitária em Minas”, Heitor é convidado a mudar-se para os EUA pela então adida cultural em BH, Elinor Halle. “Aqui começa minha carreira docente. Nesse momento, também acaba minha relação com a ainda UMG. De tudo, como diria Machado de Assis, creio ter um ‘pequeno saldo’: estes anos fabulosos não morreram nem sofreram o impacto de uma realidade que poderia tê-los deformado”, completa.

Obra reflete multiplicidade intelectual

O livro editado em homenagem a Heitor Martins reflete a multiplicidade de sua trajetória intelectual. Na obra, há artigos, em inglês e português, sobre modernismo, regionalismo, poesia e identidades brasileiras, Guimarães Rosa, Jorge Luis Borges e Machado de Assis. Além da organizadora, Darlene Sadlier, participam da coletânea de ensaios autores como Lúcia Helena, Doris Turner, K. David Jackson, John Dyson, Willian Rougle, Argemiro Ferreira, Renato Alvim, Eduardo Brondizio e Silviano Santiago, colega de Heitor na chamada Geração Complemento.

Grupo de escritores que se dedicou à publicação da Revista Complemento, editada em Belo Horizonte nas décadas de 50 e 60, essa geração reuniu alguns dos mais importantes nomes da intelectualidade brasileira. Além de Martins e Santiago, dela faziam parte, entre outros, Affonso Romano de Sant’Ana, Vicente de Abreu, Pierre Santos e Terezinha Alves Pereira, ex-mulher de Heitor que, hoje, mora nos Estados Unidos e responde pelo nome Teresinka Pereira.