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Nº 1588 - Ano 34
30.10.2007

Indisciplinados ou violentos?

Tese de doutorado defendida na FaE diferencia comportamentos de alunos de escolas da periferia

Luiz Dumont Jr.

aluno

Distinguir indisciplina de violência escolar e identificar as gradações da primeira entre alunos de escolas de periferia. Com esse objetivo, o pesquisador Luciano Campos Silva analisou durante um ano o comportamento de alunos de duas turmas da 8ª série de escolas da periferia de Belo Horizonte. Os resultados, materializados em tese de doutorado defendida no mês passado na Faculdade de Educação, sugerem uma nova forma de abordar o tema tanto numa perspectiva teórica quanto no próprio cotidiano das escolas.

Segundo o pesquisador, existe uma tendência dos atuais estudos de tratar indisciplina e violência escolar sob a mesma ótica. “O problema ocorre, basicamente, porque o conceito de indisciplina sempre foi usado para definir qualquer tipo de comportamento desviante observado na escola”, explica.

Em sua tese, Luciano Campos faz uma revisão dos estudos existentes e percebeu que alguns deles não tentam estabelecer diferenças entre indisciplina – a quebra de regras de convivência escolar – e comportamentos violentos, que transgridem regras sociais. “Posso dizer que há uma falta de definição dos termos ou uma confusão propriamente dita. O perigo é tomar como violento um tipo de comportamento trivial na escola, marcado pela quebra de regras internas, como conversas paralelas em sala de aula ou pequenos atos de desacato ao professor”, explica Campos.

Ele reconhece que a distinção não é das mais fáceis. “Mas os pesquisadores em educação não podem tratar as duas coisas como iguais”, argumenta. E exemplifica: “Um aluno que debocha do professor está primeiro questionando a autoridade dele e não a figura humana”.

Ambiente heterogêneo

Ao cotejar a literatura acadêmica e opiniões de vários setores da sociedade, Campos observou que há uma visão que associa indisciplina e origem social, tratando todos os alunos de camadas pobres como indisciplinados. “Há uma imagem consolidada, segundo a qual quanto menor a renda familiar dos alunos, maior é a indisciplina nas escolas que eles freqüentam”, diz. Um dos objetivos do estudo de Luciano Campos foi justamente verificar a veracidade dessa hipótese. Durante um ano, ele observou duas turmas de 8ª série de escolas da periferia da capital mineira – cada uma por seis meses. E diferentemente do que poderia supor o senso comum, o pesquisador encontrou um ambiente bastante heterogêneo.

Campos identificou três tipos de alunos, definindo uma terminologia para cada grupo. O conjunto de alunos mais disciplinados foi chamado de “freqüentes na disciplina”. Eles apresentam, em quase todos os momentos, uma atitude de obediência às regras convencionadas pela escola. “São jovens que não conversam em sala, são estudiosos, fazem as coisas sem o professor pedir. Enfim, assumem uma postura caracterizada pela auto-disciplina; não precisam ser fiscalizados”, explica. Outro grupo é formado pelos “freqüentes na indisciplina”, alunos que, em quase todos os momentos, protagonizam atos de indisciplina na escola e na sala de aula. “O termo freqüente define um comportamento constante dos alunos de cada grupo, mas que pode apresentar pequenas variações”, explica.

Luciano Campos: visão sociológica sobre a disciplina escolar
luciano
Foca Lisboa

O terceiro grupo corresponde aos estudantes de comportamento intermediário, classificados como “ocasionais na indisciplina”. É composto, segundo Luciano Campos, pela maioria dos alunos observados. Para o pesquisador, esse grupo é deixado de lado pelos teóricos, que costumam focar os extremos. “Esse grupo de alunos precisa ser observado com maior atenção, por ser mais influenciado pelo comportamento de cada professor e pelas situações que acontecem na escola”, defende o pesquisador.

Fracasso

De acordo com o pesquisador, o excesso de indisciplina na escola sugere que a instituição não está cumprindo seu papel. “As escolas de hoje se dizem preocupadas com a formação cidadã dos alunos e propõem o ensino de regras de convivência social. Por isso, a indisciplina ou o excesso dela demonstra fracasso no seu trabalho de socialização”, argumenta. A indisciplina afeta a vida escolar porque perturba a relação pedagógica, impactando negativamente o aprendizado dos alunos. Segundo Campos, existem pesquisas que demonstram que os alunos de periferia são mais afetados por esse distúrbio na relação de aprendizado. “Isso é mais uma barreira, que se soma às outras que a gente já conhece”, conclui.

Tese: Disciplina e indisciplina na aula: uma perspectiva sociológica
Autor: Luciano Campos Silva
Defesa: 21 de setembro no Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação
Orientadora: professora Maria Alice Nogueira