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Nº 1650 - Ano 35
27.4.2009

Originada dos caminhos que levavam às reservas de ouro e diamantes da capitania de Minas Gerais no século 18 e parte do 19. Em torno dela, formaram-se 179 municípios em Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.

E o ouro virou música

UFMG inaugura, em São João del-Rei, primeiro núcleo do projeto Circuito Musical Estrada Real

Patrícia Azevedo

Reverenciar o amor platônico com uma serenata sob a luz do luar pode parecer coisa do passado. Não para os cerca de 14 mil moradores de Entre Rios de Minas, no Campo das Vertentes. A cada 15 dias, o músico Tuca Boelsums se une ao grupo de seresteiros Rios ao Luar para cantar poesia pelas ruas da cidade, localizada a 110 quilômetros de Belo Horizonte. Aos poucos, o que era um espetáculo para os “sessentões” passou a atrair um público mais jovem, que se rendeu aos clássicos de Cartola, Noel Rosa, Chiquinha Gonzaga, Lupicínio Rodrigues e por canções de compositores locais.

O trabalho de Tuca e do grupo Rios ao Luar é uma das manifestações que serão catalogadas e divulgadas pelo projeto Circuito Musical Estrada Real, desenvolvido pela Escola de Música da UFMG, que inaugura nos dias 6 e 7 de maio seu primeiro núcleo regional. Com sede em São João del-Rei, o núcleo será responsável pelo levantamento da produção musical dos municípios da região. Todas as pesquisas serão armazenadas em banco de dados, reunindo informações sobre cantores, compositores, escolas, conservatórios de música e associações culturais. “O objetivo principal é fortalecer o intercâmbio cultural”, afirma Ângela Nogueira, coordenadora executiva do Circuito Musical.

Ela explica que a formação dos núcleos é etapa essencial do projeto, que busca constituir uma rede musical ao longo de 1.400 quilômetros da Estrada Real. Para estruturar a unidade de São João del-Rei, que atenderá 36 municípios, a Escola de Música conta com a parceria de músicos, organizações, entidades públicas e privadas. Também participam os bolsistas da comunidade, professores, técnicos e alunos da UFMG.

A iniciativa também busca contribuir para dinamizar a economia na região. “Esperamos que a rede incremente o turismo e a geração de empregos”, avalia Maurício Veloso, professor da Escola de Música e coordenador acadêmico do projeto. Segundo Ângela Nogueira, São João del-Rei foi escolhida pela sua localização estratégica no percurso da Estrada Real, pela infraestrutura e pela relevância de seus acervos culturais. “São João respira música”, resume.

Cantigas

Tuca Boelsums, de Entre Rios de Minas, é exemplo da vitalidade da produção musical da região. Além do grupo Rios ao Luar, participa do Samba do Bem, grupo de samba de roda formado por músicos da comunidade local, e do Grupo Viola Contemporânea, que trabalha no resgate de cantos e cantigas com as comunidades rurais. “As cantigas eram importantíssimas no cotidiano rural. Existiam canções para plantio, para a capina e para a colheita”, conta o compositor, que nasceu e cresceu em fazenda típica da região.

A música erudita também tem seu espaço. De acordo com André Cavazotti, professor da Escola de Música da UFMG, São João del-Rei é a cidade histórica mineira que melhor preserva a tradição da música sacra. Lá existem duas orquestras bicentenárias – a Lira São-Joanense e a Ribeiro Bastos – e acervo com manuscritos de compositores dos séculos 18 e 19, como José Joaquim Emerico Lobo e João de Castro Lobo. “Peças sacras são executadas até hoje, principalmente na Semana Santa”, conta o professor, especialista em música colonial.

Foi na música colonial da região que a flautista Salomé Viegas, de São João del-Rei, encontrou inspiração para seu mestrado e repertório para a Camerata Áurea Música, grupo fundado em 2006 e especializado em peças dos séculos 18 e 19. “Possuímos acervos, orquestras, compositores, músicos e tradição. No entanto, o público ainda é restrito. O projeto da UFMG chega com a proposta de promover discussões e alternativas para que a população tenha acesso a essa riqueza cultural”, avalia Salomé Viegas, que se apresenta com o Camerata Áurea Música durante a inauguração do Núcleo de São João del-Rei no dia 6 de maio. O segundo núcleo do Circuito Musical Estrada Real, já em estruturação, será sediado em Caxambu. O projeto, aprovado pela Lei Roaunet de Incentivo à Cultura, é patrocinado pela Cemig.