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Nº 1773 - Ano 38
30.4.2012

Aprender a ensinar

Tese defendida na FaE analisa a formação de professores universitários no contexto do Reuni

Gabriella Praça

A academia precisa investir mais na formação de docentes de ensino superior, e não apenas em pesquisadores. Essa é a conclusão da tese Processos de constituição da docência universitária: o Reuni na UFMG, defendida em fevereiro na Faculdade de Educação (FaE) pela pedagoga Maria de Lourdes Coelho. A autora investigou o processo de formação docente diante das diretrizes, práticas e estratégias adotadas nesse campo pelas universidades públicas. Funcionária da UFMG há mais de 20 anos, ela elegeu a instituição como objeto de pesquisa, no contexto da implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), criado em abril de 2007.

“O Reuni orienta que graduação e pós-graduação se integrem, com a preparação de mestrandos e doutorandos para a docência, e não apenas para a pesquisa acadêmica”, salienta a recém-doutora: “Muitas vezes, os alunos se tornam pesquisadores de excelência, com brilhantes publicações no currículo, mas sem nunca terem refletido sobre o que é aprender e ensinar.” Para atender essa exigência, a UFMG criou o núcleo que hoje se chama Diretoria de Inovação e Metodologias de Ensino da Pró-reitoria de Graduação, também conhecido como GIZ, destinado a trabalhar com a formação de docentes no âmbito da Universidade. Por ter experiência com plataformas de educação a distância, Maria de Lourdes foi convidada para compor a equipe, já que o Reuni prevê utilização de tecnologias para otimizar o trabalho do professor em sala de aula. Aliando teoria e prática, a autora promoveu discussões e dinâmicas de grupo com turmas de pós-graduandos que cursaram a formação em docência promovida pelo GIZ.

Perfis e estereótipos

Homem, careca, de óculos e boca grande, autoritário, amigo, sem dinheiro, preocupado com a família e sem tempo para o lazer. Essa é a imagem que mestrandos e doutorandos da UFMG demonstraram ter a respeito de professores universitários. Nos primeiros encontros de cada uma das 14 equipes didáticas que passaram pelo GIZ entre 2008 e 2011, formaram-se subgrupos nos quais um dos alunos deveria se deitar sobre duas folhas de papel craft colocadas sobre o chão, para que se pudesse traçar o contorno de seu corpo. A seguir, eram oferecidos materiais de desenho e pintura, de forma que cada um, em silêncio, representasse a ideia que fazia do professor. “Entre os vários elementos que se repetiam, notava-se a presença de balões com a expressão ‘blá-blá-blá’ escrita no interior, a falta de orelhas e o uso de relógios”, observa Maria de Lourdes. “Esses são os estereótipos interiorizados nos alunos”, diz a pedagoga, ressaltando que a maioria dos desenhos retratava o professor por meio da figura de um homem, ainda que a silhueta tivesse sido traçada a partir do corpo de uma mulher.

Ao término do curso, a mesma proposta foi feita para representação do modelo de estudante universitário – só que, nesse caso, prevaleceram as imagens femininas. Segundo a autora, estatísticas ajudam a explicar o fenômeno, já que o número de mulheres tem crescido nas universidades brasileiras. Nos desenhos feitos pelos alunos, essas estudantes eram retratadas com fones de ouvido, celulares e notebooks, além dos cadernos, livros e mochilas. Perguntas “vazias”, como “Onde vai ser a calourada?”, “Como assim, professor?”, e “Isso vai cair na prova?” também foram recorrentes.

O exercício lúdico suscitava o questionamento sobre o que é ser professor universitário, e a discussão prosseguia na plataforma virtual Moodle, utilizada para ensino a distância. Por meio da ferramenta, os pós-graduandos acessavam textos sobre o tema, compartilhavam experiências e visualizavam os desenhos produzidos em sala de aula. A autora analisou as 60 mensagens postadas no fórum de uma das turmas, por meio da técnica do “discurso do sujeito coletivo”. “Utilizei um software para fundir todas as mensagens em um único discurso, que representa a visão do grupo”, esclarece.

O resultado revelou que, para os pós-graduandos, o professor universitário é um sujeito que vive no meio de livros e bibliotecas, constrói espaços de formação e reflexão, estimula o uso da criatividade, convive com diversas categorias profissionais, recupera a importância do diálogo e aprende a ouvir os alunos. “Se nos desenhos o docente é retratado de maneira caricatural, no discurso do sujeito coletivo ele aparece como uma projeção dos pós-graduandos do que seria o professor ideal”, avalia a autora.

Novo paradigma

Para Maria de Lourdes, o atual momento histórico exige uma nova postura do professor, que não combina mais com a posição de “dono inquestionável do saber”. Em vez disso, precisa se manter aberto ao aprendizado de novos métodos e ao uso de tecnologias avançadas. “O docente de hoje está sempre em formação”, sentencia.

Implementado entre 2008 e 2011, o Reuni propiciou a criação de 27 novas graduações e aumento de 30% no ingresso de alunos por meio do vestibular.

Tese: Processos de constituição da docência universitária: o Reuni na UFMG
Autora: Maria de Lourdes Coelho
Orientadora: Ângela Imaculada Loureiro de Freitas Dalben
Defesa: 16 de fevereiro de 2012, na Faculdade de Educação (FaE)