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Nº 1789 - Ano 38
10.9.2012

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Comunhão de fé

Professor da FaE analisa em livro influência do comunismo e do comunitarismo religioso sobre o MST

Itamar Rigueira Jr.

Antes de suas manifestações políticas, trabalhadores organizados na luta pela terra não costumam dispensar rituais como o que promove a distribuição do pão e outros que clamam por maior força nos enfrentamentos. Nessas ocasiões, movimentos como o dos Trabalhadores Sem Terra (MST) deixam explícita a herança de sua origem ligada à religião, que se expressa também na pregação de uma forma de comunitarismo que não é usual no socialismo.

A necessidade de melhor compreender a combinação de ideias marxistas com fé religiosa que se encontra na filosofia e nas ações do MST deu origem a trabalho de pesquisa do professor Antonio Julio de Menezes Neto, da Faculdade de Educação da UFMG, que resultou no livro A ética da Teologia da Libertação e o espírito do socialismo no MST (Editora UFMG).
“Há uma cisão histórica entre lutas socialistas e posições da Igreja, mas, por outro lado, registraram-se rebeliões movidas pela Bíblia, como logo após a Reforma Protestante, quando camponeses tomaram terras da Igreja. Da mesma forma, contemporaneamente, trabalhadores fazem uma leitura da Bíblia que vai contra a visão mais conservadora da Igreja Católica”, explica Antonio Julio de Menezes Neto. Ele lembra que, no Brasil e na América Latina, esse embate desaguou na Teologia da Libertação, que optou por ler o marxismo para compreender as relações sociais.

Ainda segundo o professor da FaE, o MST teve origem e inspiração nas comunidades eclesiais de base, mas formalmente nasceu como organização desvinculada de instituição religiosa. “Pode-se dizer que o movimento é movido por uma ‘fé laica’, o que ajuda a explicar o desejo por justiça e solidariedade. Não são apenas as condições materiais precárias que impulsionam esses grupos para a participação política”, afirma Menezes Neto, sociólogo com doutorado em Educação pela USP e pós-doutorado em Sociologia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Institucionalização

Menezes Neto começa o livro discorrendo sobre igrejas, religiões e socialismo. Mostra a aproximação de religiosos e socialistas, representada pela Teologia da Libertação, analisa como o desenvolvimento histórico dessa teologia resultou em sua ascensão e crise, e como suas discussões e práticas contribuíram para a organização social no Brasil. Nos últimos capítulos, aborda a força do ecletismo teórico do MST e revela o resultado de entrevistas com educadores do Movimento sobre as suas relações com a educação, o socialismo e as religiões.

O autor lembra que a combinação do marxismo com a origem religiosa contribuiu também para que o MST continuasse avançando mesmo com a retração do socialismo provocada por eventos como a desintegração da União Soviética. A situação foi agravada com a relativa desarticulação da Teologia da Libertação, que perdeu um referencial importante, o socialismo, e sofreu com o avanço do conservadorismo no Vaticano. Mais tarde, a chegada do Partido dos Trabalhadores ao poder contribuiu para que o Movimento perdesse força.

“A aproximação institucional com o governo criou uma dubiedade em relação ao caráter do movimento, repetindo o que aconteceu com a Teologia da Libertação. Alguns nomes importantes da Teologia passaram a colaborar formalmente com o governo. Outros, ainda que não chegassem a negar a opção preferencial pelos pobres, tomaram rumos diferentes, passando a abordar preferencialmente temas de cunho culturalista e cosmológico”, aponta Antonio Julio de Menezes Neto. “Não se pode ignorar também o avanço do neopentecostalismo e do movimento carismático nas diversas religiões”, completa.

Independentemente dos caminhos que o MST venha a tomar, o professor da FaE conclui em seu livro que a ética religiosa e as teorias baseadas no marxismo, tidas muitas vezes como contraditórias, “se juntaram nas práticas do movimento como uma forma nova de fazer política, criando laços de solidariedade e relacionamento humanos”.

Livro: A ética da Teologia da Libertação e o espírito do socialismo no MST
De Antonio Julio de Menezes Neto
Editora UFMG
123 páginas
R$ 35 (preço sugerido)