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Nº 1814 - Ano 39
1.4.2013

Muito além da festa

Contrária ao trote, Administração Central defende caráter formal e solidário da recepção aos calouros

Ana Rita Araújo

Desde os anos 1990, a UFMG vem explicitando sua posição contrária ao trote, sobretudo depois que instituiu programação específica de recepção aos calouros, atribuindo oficialmente à Administração Central a tarefa de receber os novos estudantes. O aspecto formal desse formato de recepção é criticado por setores da comunidade universitária que desejariam uma programação mais festiva. “Contudo, mais importante que ser festiva é que ela seja mais participativa”, argumenta o diretor para Assuntos Estudantis da UFMG, Luiz Guilherme Knauer.

Knauer sustenta que, no ambiente institucional, não é fácil lidar com a informalidade, sobretudo porque “uma universidade não é necessariamente local de festas”. Mesmo que seja possível construir, junto com o movimento estudantil, uma recepção mais festiva, a parte formal não pode ser abandonada, porque esse é o papel da Universidade, ressalta. O diretor discorda dos que dizem que a falta de festa ou de trotes poderia inviabilizar ou atrapalhar a integração dos calouros à comunidade: “Inúmeras pessoas se recusam a levar o trote e continuam inseridas. Eu mesmo, há 30 anos, me recusei e não acho que tenha tido problemas de inserção na Universidade”, diz.

Para Knauer, o fato de algumas pessoas consentirem com as brincadeiras aplicadas durante a atividade não exime a comunidade universitária de uma responsabilidade maior – a da cidadania. Em sua opinião, tais práticas, de caráter opressivo, atingem não apenas os calouros que são alvos delas, mas toda a comunidade. “E a opressão é sempre péssima para a sociedade”, afirma.

Sanções

Com relação às sanções pela prática do trote, Knauer cita o Regimento Geral da UFMG, que em seu artigo 192 define que a ordem disciplinar na Universidade deverá ser mantida com a cooperação ativa dos integrantes do corpo discente, como condição indispensável ao êxito dos trabalhos de toda a comunidade universitária.

O artigo seguinte determina que os integrantes do corpo discente estão sujeitos a penalidades que vão desde advertência a suspensão das atividades escolares por até 30 dias, por um período letivo e até o desligamento, sendo as duas últimas passíveis de aplicação, por exemplo, “por prática de atos incompatíveis com a dignidade universitária”.

Luiz Guilherme Knauer lembra que a Universidade trabalha com instrumentos típicos do serviço público. “Para os trotes considerados ofensivos, imediatamente é instituída comissão de sindicância, que eventualmente pode virar uma comissão de inquérito e um Processo Administrativo e Disciplinar (PAD), para que os alunos sejam punidos por suas atitudes”, explica.

A intenção de levar o estudante recém-aprovado no vestibular a se sentir responsável pela vida em comunidade tem marcado as programações das semanas de recepção ao calouro. Em março de 1999, por exemplo, os novatos foram chamados a se engajar na campanha UFMG contra a dengue, iniciada no ano anterior e que se intensificou com a chegada das chuvas.

A Diretoria para Assuntos Estudantis, a Coordenadoria de Assuntos Comunitários (CAC) e o Diretório Central dos Estudantes (DCE) estão preparando uma grande campanha de doação de sangue, que abrangerá todos os cursos. A intenção é mostrar aos estudantes que a entrada na Universidade é também, segundo Knauer, “um momento para as pessoas entenderem que vivem em comunidade e, por isso, devem ter atitudes solidárias”.

Isabella Lucas
João Vítor Rodrigues: atividades positivas para promover a integração
João Vítor Rodrigues: atividades positivas para promover a integração

Alternativas de integração

“Mesmo quando parece brincadeira inofensiva, o trote carrega uma dose subliminar de opressão e de subjugação”, avalia o coordenador geral do Diretório Central dos Estudantes (DCE), João Vítor Leite Rodrigues. Segundo ele, o tema é um dos eixos básicos do trabalho da atual gestão do órgão – o combate à opressão, objeto de núcleo específico criado no início da gestão. “Trata-se de assunto muito caro para nós”, reitera o estudante de Ciências Econômicas.

Para ele, o trote é “desnecessário” como atividade de integração de veteranos e calouros, e outras alternativas podem ser pensadas com essa finalidade. Nesse sentido, o DCE está firmando parcerias com a Coordenadoria de Assuntos Comunitários (CAC) e com a Diretoria para Assuntos Estudantis (DAE) para a formulação de campanhas positivas de recepção aos estudantes. “Além da campanha de doação de sangue, estamos planejando uma espécie de ‘feira de livros’, no intuito de incentivar os veteranos a doarem os seus antigos livros e apostilas para os calouros” diz ele. “Se visa promover a interação de calouros e veteranos, como alguns argumentam, então o trote é desnecessário. Outras atividades, mais positivas, podem favorecer essa interação. É nisso que acreditamos”, conclui o estudante.