Busca no site da UFMG

Nº 1831 - Ano 39
12.08.2013

No cantinho de dona Nailda

Itamar Rigueira Jr.

Ela fez 90 anos de idade este mês e ganhou um churrasco de comemoração na área externa do ICB. Foi avisada da festa, mas nem precisava: às vésperas de completar cinco décadas de UFMG, e 20 anos depois de aposentada, Nailda Maria de Almeida bate ponto todos os dias na copa do Departamento de Biologia Geral.

Espaço que, por sinal, tem nome: o Cantinho da Dona Nailda, instituído formalmente há cerca de oito anos e com direito a placa. Ali, ela passa o café até cinco vezes por dia – nas versões forte e fraco, mas sempre sem açúcar. Também naquela copa, Dona Nailda ouve todas as histórias, sobre a vida pessoal dos colegas e o desenvolvimento de pesquisas.

“É o melhor café do ICB”, garante o professor Francisco Barbosa, que se revela admirador incondicional de Dona Nailda. “Ela é inteligente, disciplinadíssima e incrivelmente lúcida. Além disso, é franca e discreta”, derrete-se.

Barbosa conhece Dona Nailda desde os tempos do Instituto de Biologia, que funcionava na Rua Carangola, no bairro Santo Antônio, e onde também trabalhava o ascensorista Sebastião Almeida, seu marido, já falecido. Ela ingressou na Universidade no primeiro dia de 1964, encarregada de serviço de limpeza, e mais tarde passou a atuar como assistente de laboratório. “Cuidava do material e sempre tomei todos os cuidados, nunca tive um acidente”, conta Dona Nailda, que viveu os primórdios do ICB no campus Pampulha, na década de 70, tempos em que era necessário buscar água numa mina para lavar os aquários.

Chega com o dia

Nascida em Mutum, na região de Governador Valadares, onde morou em fazendas, Dona Nailda chegou a Belo Horizonte em 1952. Teve apenas uma filha, mas anos depois viu a família crescer com a chegada de cinco netos e dez bisnetos. “Tentam me convencer a olhar os meninos, mas não gosto de ficar presa em casa. Respondo que eles devem ir para a escola”, ela diz. Dona Nailda chega ao seu cantinho às seis horas, arruma tudo, faz o café e sai para caminhar no campus. São duas horas de exercício em ritmo acelerado.

Junto com essa prática, os hábitos alimentares ajudam a explicar a boa saúde – são poucos os cuidados médicos, incluindo medidas de controle das funções da tireoide. Toma “um golinho” de leite desnatado antes da caminhada e come uma fruta às 9h. O almoço começa às 10h30, com uma salada (temperada com mais azeite que sal) e arroz e feijão com galinha ou peixe. À tarde faz um lanche leve e fecha o dia com um copo de leite.

Ela não se lembra de um só problema no ambiente de trabalho em todos esses anos. “Adoro todos os colegas, professores e alunos, tem sempre gente por aqui conversando, vêm pessoas de outras áreas”, conta Dona Nailda, que garante (e comprova) ter memória boa, traída apenas por pequenos lapsos. Ela faz questão de manter contato com o passado e a família no interior – quase todos os anos vai até Mutum e locais próximos para rever principalmente sobrinhos.

Um dos que contaram diretamente, e por longo período, com o apoio profissional de Dona Nailda – como quando comandou o Laboratório de Genética de Microrganismos –, o professor Edmar Chartone ressalta a sabedoria e o bom humor da amiga. “Ela cumpre uma função integradora que é muito importante para a instituição. Devemos muito a ela”, ressalta Chartone, ele também aposentado e em atividade voluntária no ICB.

Servidores e alunos se cotizam para pagar um “salário” mensal a Dona Nailda. Segundo Francisco Barbosa, a iniciativa tem muitas adesões, todas movidas por convicção e prazer. “É ótimo chegar aqui cedinho e encontrar um café cheiroso, gostoso e quentinho”, ele diz. “Mas, mais do que isso, é um privilégio compartilhar o dia a dia com uma pessoa que tem tanto sentido de compromisso. Dona Nailda encanta por seu temperamento e dedicação”, conclui Barbosa.