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Nº 1874 - Ano 40
01.09.2014

Exercício contra a hiperatividade

Projeto de extensão da UFMG vale-se de atividades físicas para ajudar portadores do déficit de atenção a desenvolver habilidades motoras

*William Campos Viegas

“No colégio, eu tinha muita dificuldade com matemática. Não conseguia me concentrar, acompanhar o ritmo das aulas e fiquei em recuperação. Na época, a preocupação com a prova final mexeu demais comigo e me fez perder noites de sono”, relata Mateus Carneiro, estudante de Educação Física da UFMG, que foi diagnosticado, já adulto, com o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Diante do resultado, ele teve que superar os obstáculos comuns a quem sofre do distúrbio. “Na faculdade, as responsabilidades e as demandas cognitivas e sociais aumentaram, trazendo-me problemas no fim da minha formação, como o atraso da monografia. Foi difícil dar conta de atividades que exigiam muita atenção e planejamento”, lembra.

Causado por fatores genéticos, o transtorno neurobiológico acomete, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), até 5% das crianças e jovens em idade escolar. Seus portadores apresentam níveis de impulsividade, desatenção e hiperatividade elevados que comprometem, na infância, o rendimento escolar e o relacionamento com colegas, pais e professores. Os sintomas tendem a persistir na vida adulta, e os indivíduos enfrentam dificuldades para organizar as tarefas diárias, planejar o futuro e até manter o emprego.

Os problemas motores se juntam aos prejuízos psicossociais e cognitivos. “Estudos apontam que, a cada duas crianças com TDAH, uma tem déficit de controle motor, que provoca desde baixas destreza manual e capacidade de parametrização de força, até pouca precisão espacial e temporal”, explica o professor Guilherme Lage, do Departamento de Educação Física da UFMG e coordenador do projeto de extensão Intervenção Motora para Crianças com Transtornos de Atenção e Hiperatividade (IMPACTAH), do qual Mateus é bolsista. Atento a esses sinais, o projeto pretende, por meio de brincadeiras, esportes, danças, jogos e lutas, promover habilidades motoras e avaliar o impacto das atividades físicas no comportamento das crianças com TDAH. “Utilizamos conteúdos diversos para trabalhar as habilidades fundamentais, como saltar, correr e chutar”, explica Lage.

A iniciativa é uma parceria entre o Grupo de Estudo em Desenvolvimento e Aprendizagem Motora (Gedam), da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, e o Núcleo de Investigações sobre a Impulsividade e Atenção (Nitida), da Faculdade de Medicina da UFMG. Iniciada em janeiro, é realizada com crianças de 6 a 10 anos. No treinamento, elas são acompanhadas por profissionais de Educação Física que integram a ação. “Primeiro, todas passaram por testes para avaliar os aspectos motores. Ao final, serão reavaliadas para medirmos o efeito das atividades. Além disso, durante todo o processo, os aspectos psicológicos, comportamentais e cognitivos também são testados pelos integrantes do Núcleo. Assim, saberemos se a intervenção também contribuiu para melhorar a parte neuropsicológica das crianças”, relata o professor.

Apesar de benéficas, Guilherme alerta que as atividades não substituem o tratamento medicamentoso. “É uma medida a mais para controlar os sintomas de desatenção e hiperatividade. Com os exercícios, as crianças aprendem novos padrões de movimentos e aprimoram a parte motora e a coordenação. As atividades também reduzem os comportamentos negativos e melhoram as funções cognitivas dos alunos, que conseguem manter a atenção focada e diminuir a hiperatividade”, completa.

Na prática

Nas tardes de segunda e quarta-feira, José Alves costuma levar o filho, Pedro Gabriel, para participar das atividades realizadas nas quadras, piscinas, pista de corrida e outros espaços da EEFFTO. O pai já percebe mudanças comportamentais no garoto. “Ele era muito agitado. Na escola, os professores reclamavam da falta de concentração, do descompromisso com as tarefas e das notas baixas. Hoje, ele está mais calmo e focado”, comemora.

O menino gosta de brincadeiras ao ar livre. “Adoro futebol, nadar e correr. É muito legal vir aqui, brinco com os meus amigos e professores”, conta. Mas a escolha por atividades dinâmicas não é exclusividade apenas de Gabriel. “Eles não curtem exercícios que exigem mais atenção, preferem os que envolvem movimentos expressivos. Por meio deles, observamos melhor as questões, como a capacidade de discernir esquerda e direita” explica Mateus Carneiro, que é um exemplo de que as atividades ajudam. “Sempre pratiquei esportes, o que auxiliou a regular os sintomas. É fundamental que os pais insistam para que seus filhos façam exercícios físicos”, recomenda.

O projeto também oferece aos pais dos participantes material instrucional sobre o transtorno. As atividades são realizadas ao longo de todo ano, e os interessados podem entrar em contato pelo telefone (31) 3409-2394. As aulas ocorrem todas as segundas e quartas-feiras, das 9h30 às 10h30, e das 14h30 às 15h30.

*Bolsista de Jornalismo da Assessoria de Comunicação da Pró-reitoria de Extensão da UFMG