Rompendo a barreira da língua

Atenta à necessidade de internacionalizar sua produção, UFMG recebe especialista em práticas de escrita acadêmica em inglês

Luiza Ananda

O britânico Brian Street é uma das referências no campo do letramento acadêmico

A publicação de artigos acadêmicos em revistas de alcance global apresenta-se como um dos pilares do processo de internacionalização que envolve as universidades brasileiras. Nesse contexto, vem se consolidando, nas três últimas décadas, o campo de estudos sobre práticas de letramento acadêmico na Inglaterra, nos Estados Unidos, na França e, mais recentemente, no Brasil.

Um dos fundadores desse campo de estudos, o pesquisador Brian V. Street, professor emérito do King’s College London, ministra, neste semestre, na UFMG, uma disciplina para alunos de pós-graduação em que essa temática é amplamente discutida. Street adota abordagem social e antropológica para analisar práticas de escrita acadêmica em universidades de várias partes do mundo.

É dele a expressão hidden features of academic literacy, relacionada a aspectos linguísticos, culturais, editoriais e epistemológicos que, ao permanecerem ocultos, dificultam a produção da escrita acadêmica. “É necessário evidenciar quais critérios de avaliação estão em jogo e discutir como eles podem ser equacionados”, defende o pesquisador. Ele se alinha a uma corrente de estudiosos que partem do princípio de que tais aspectos que constituem a produção e avaliação de textos acadêmicos (artigos, monografias, dissertações e teses) são social e localmente definidos e variam segundo o campo disciplinar. Compreender como os critérios de avaliação de um texto variam entre contextos e áreas de conhecimento é fundamental no processo de internacionalização acadêmica.

Temática interdisciplinar

Na UFMG, Brian Street ministra a disciplina Academic literacies in the university, ofertada pelos programas de Pós-graduação da Faculdade de Educação e de Psicologia da Fafich. Segundo a professora Maria Lucia Castanheira, da FaE, estão matriculados alunos das áreas de educação, psicologia, linguística aplicada, biologia e ensino de ciências, o que, em sua opinião, é indicador do interesse e da importância interdisciplinar da temática. “A análise da produção dos alunos tem deixado visíveis os traços sobre o posicionamento do autor ou sobre a variação discursiva que separa as áreas de conhecimento”, afirma.

Matriculada na disciplina, a estudante de pós-graduação em Educação Flávia Pontes Carneiro enxerga duplo benefício na iniciativa: “Primeiro, porque torna possível compreender o quadro conceitual dessa área de estudos e refletir sobre suas implicações para a minha própria escrita e, segundo, ao possibilitar o uso do inglês, já que as aulas são nesse idioma”.

“A disciplina sintoniza os alunos com a produção internacional de textos acadêmicos em inglês e, para a internacionalização, a publicação em inglês é essencial. O conhecimento que produzimos precisa enfrentar a barreira da língua para circular”, afirma o professor Sérgio Cirino, diretor de Produção Científica da Pró-reitoria de Pesquisa. Para ele, o aluno que recebeu preparação em escrita acadêmica em inglês pode aproveitar as oportunidades de estudos no exterior, escrever melhor, ter artigos aceitos para publicação e levar o nome da UFMG para fora do país.

O professor Street destaca que muitos estudantes têm bom conhecimento de inglês, mas precisam de direcionamento para escrever no estilo acadêmico. “A escrita não tem um padrão único, e contextos diferentes exigem práticas de letramento diferentes”, defende o professor.

Além da disciplina na pós-graduação, Brian Street fará palestra aberta ao público na próxima semana. Ele vai abordar os diferentes tipos de escrita acadêmica com base em revisão da literatura internacional sobre o tema e tocará num ponto que aflige acadêmicos no mundo inteiro. “As diferenças no estilo de escrita e na abordagem dos resultados de pesquisa estão entre as razões mais frequentes para a não aprovação de artigos em revistas de língua inglesa de autoria estrangeira, a despeito das contribuições da pesquisa”, destaca Street.

Em setembro, a UFMG deverá realizar um colóquio internacional sobre o tema, com a participação do próprio Brian Street e de pesquisadores de Inglaterra, Estados Unidos, França, Peru, Argentina e Brasil.