A Foto do Invisível – Espaço do Conhecimento UFMG
 
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A Foto do Invisível

Como fotografar algo tão distante que não emite e nem reflete luz?

 

15 de julho de 2025

 

Por João Victor Lima Evangelista, 

estagiário no Núcleo de Astronomia do Espaço do Conhecimento UFMG

 

Em 1826, Joseph Nicéphore Niépce tirou a que é considerada “primeira foto” da história. Somente 14 anos depois a humanidade conheceu o primeiro registro de um corpo celeste, nesse caso, a Lua. E, após 128 anos, a primeira imagem colorida da Terra foi feita. A evolução da fotografia e dos equipamentos de observação do céu ao longo dos anos nos permitiram enxergar de forma cada vez mais distante.

 

Boa parte dos objetos que fotografamos, ou emitem luz própria ou são capazes de refletir a luz de outra fonte. Mas como poderíamos fazer isso com um objeto que não emite luz? Esse é o caso dos buracos negros. Por aqui, já exploramos o processo de formação desses objetos em textos do blog como “As estrelas morrem?” e “Uma introdução a buracos negros”, além da live no YouTube “Descobrindo o Céu: Vida e morte das estrelas”.

 

Bem antes de falarmos sobre Buracos Negros, em 1915, Albert Einstein publicou sua famosa Teoria da Relatividade Geral, na qual ele nos apresenta o conceito de que a matéria pode distorcer o que chamamos de espaço-tempo. Apesar de abstrato, é um conceito relativamente simples. Pense em uma piscina cheia de gelatina: ao jogar uma bola de boliche em seu centro, a deformação será muito mais intensa do que se você jogasse uma simples bola de gude.

 

 

Representação artística do espaço-tempo como uma superfície simplificada e bidimensional, que está sendo distorcida pela presença de três corpos, representados como esferas. A distorção causada por cada esfera é proporcional à sua massa. (Créditos: ESA–C.Carreau)

 

Sabendo que a matéria distorce o espaço-tempo por onde a luz percorre, quanto mais massivo o objeto, maior o caminho que a luz vai ter que percorrer próximo a ele. Agora imagine um objeto de densidade infinita. Esse é o caso dos Buracos Negros, objetos que eram previstos pela teoria do Einstein. A distorção causada por eles no espaço-tempo é tão grande que a luz, que possui a maior velocidade do universo, não consegue escapar quando está próxima a ele.

 

Quando uma estrela com pelo menos oito vezes a massa do Sol chega ao fim de sua vida, ocorre um evento que chamamos de Supernova. Nesse fenômeno, a estrela explode e lança sua matéria para o espaço, restando um núcleo que pode se tornar um objeto extremamente denso: um buraco negro, onde toda a massa se concentra em um ponto infinitamente pequeno. Esse objeto pode ser dividido em três partes importantes: a Singularidade, o Horizonte de Eventos e o Disco de Acreção.

 

Diagrama adaptado mostrando algumas regiões do Buraco Negro. (Créditos: ESO, ESA/Hubble, M. Kornmesser).

 

Então como poderíamos tirar uma foto de um objeto que nem a luz é capaz de escapar e que está tão distante de nós? Apesar de o buraco negro não emitir luz, o gás superaquecido do disco de acreção, que gira em altíssima velocidade ao seu redor, brilha em diferentes frequências. É exatamente isso que conseguimos fotografar. Mas como lidar com a enorme distância? Esse desafio é mais complicado, já que, quanto mais ampliamos uma imagem, pior tende a ser sua qualidade.

 

De maneira geral, quanto maior o diâmetro da lente (ou abertura) de um telescópio, mais luz ele capta e melhor a resolução da sua imagem. Contudo, existe um limite prático de quão grande pode ser um telescópio. Para resolver o problema de construir um telescópio gigante e de fotografar um objeto tão distante, foi desenvolvida uma técnica chamada Interferometria de Longa Linha de Base.

 

Diagrama mostrando a localização dos telescópios utilizados no EHT. (Créditos: M. Wielgus, D. Pesce).

 

Essa técnica consiste em combinar a imagem de múltiplos telescópios menores para criar um “telescópio virtual”, em que a abertura é a distância entre os dois telescópios mais distantes entre si. No caso do Event Horizon Telescope (EHT), que fotografou o Buraco Negro, a abertura é a distancia entre os telescópios IRAM 30m telescope, localizado em Pico Veleta na Espanha, e o South Pole Telescope (SPT) no Polo Sul, totalizando um diâmetro para o telescópio virtual de 12.742 km, basicamente o diâmetro do planeta Terra. Além desses dois, outros oito foram usados para formar a imagem.

 

Foram quatro dias de coleta de dados ao redor de todo o mundo, totalizando 5 petabytes de dados, ou 5.000.000 gigabytes. Sincronizando os dados coletados através de uma marca de tempo, foi possível produzir uma imagem com resolução 4.000 vezes maior que a do Telescópio Espacial Hubble.

 

 

Referências e Para saber mais

How did they actually take this picture? (Very Long Baseline Interferometry)

Episode II ALMA is State of the Art Technology

Event Horizon Telescope Animated Movie

How Scientists Captured the First Image of a Black Hole

Interferometria