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Azul da cor do amar

O que é azul para você?

 

25 de fevereiro de 2025

 

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Por Sarah Lima, 

estudante de arquitetura e bolsista de som do Espaço do Conhecimento UFMG

 

Você é o tipo de pessoa que associa cores a sentimentos? É bastante comum, por exemplo, relacionarmos o amarelo à felicidade, o vermelho à paixão, e o azul a emoções mais melancólicas, como a tristeza e a solidão. No inglês, a expressão feeling blue (em tradução livre, “sentindo azul”) é popularmente utilizada para dizer que estamos tristes. É daí que vem o nome do gênero musical blues

 

Originada por afro-americanos, o blues é caracterizado por seu estilo rítmico, os vocais carregados de emoção e a presença marcante da guitarra. Suas raízes estão nos cânticos que pessoas escravizadas entoavam enquanto trabalhavam e que, muitas vezes, traziam letras de inspiração bíblica, com ritmos lentos, introspectivos, estruturas simples e repetitivas, geralmente em torno de refrões. A melancolia, o tom arrastado e a contemplação dessas canções formam o ponto de partida do blues. Esse gênero não é apenas um reflexo da resistência de seus criadores, mas também o alicerce de toda música popular e comercial desenvolvida ao longo do século XX. Em muitos sentidos, o blues é a base de tudo que conhecemos musicalmente hoje.

 

Capa da música Crazy Blues, de Mamie Smith e Jazz Hounds. (Créditos: Reprodução/The New York Times).

 

Já na língua portuguesa brasileira, a relação com a cor azul segue um caminho bem diferente. Por aqui, é comum usarmos a expressão “tudo azul” para indicar que está tudo bem, tranquilo ou em perfeita harmonia. E, caso seja fã de música popular brasileira, você sabe que para muitos artistas brasileiros, o azul é a cor do amor. Djavan, Gal Costa, Tim Maia, Roupa Nova… todos concordam que o amor vibra no espectro entre verde e violeta. Esse tom pode ser associado à imensidão, à calma e à serenidade, evocando sentimentos de paz e profundidade. Para Milton Nascimento, falar da cor dos temporais, do céu azul e das flores de abril pode querer dizer amor. Segundo Claudinho e Bochecha, com a presença da pessoa amada tudo fica blue. Para Elis Regina, a pessoa amada é feita de azul e a cantora suplica: “me deixa morar nesse azul”. 

 

A humanidade possui uma relação enigmática com a percepção da cor azul. Registros de civilizações antigas, como os épicos gregos e as escrituras hebraicas, não fazem menção à essa cor. Em obras detalhadas como “A Odisseia” de Homero, o mar e o céu são descritos como “semelhantes a vinho” ou por meio de metáforas associadas a metais, sem qualquer referência direta ao tom azulado. Isso levou estudiosos, como Lazarus Geiger, a questionar se a percepção da cor azul realmente existia nas culturas antigas.

 

Tons de azul em um mar agitado. (Créditos: Fernando Silva).

 

A investigação sobre a presença da tonalidade revelou que em diversas literaturas antigas a menção da cor era praticamente inexistente. Essa ausência pode ser observada em textos que vão desde histórias chinesas e sagas islandesas até as primeiras versões hebraicas da Bíblia e os hinos védicos hindus. Ainda hoje, alguns grupos, como os Himba da Namíbia, não possuem uma palavra específica para o azul, tratando-o como uma variação do verde e demonstrando a variação cultural da percepção das cores.

 

A ausência de menções à cor azul na antiguidade está associada a dificuldade de replicar essa tonalidade. Apesar de estar presente no céu e nas águas, a maioria dos elementos que percebemos como azuis não possuem pigmento dessa cor. O que enxergamos é, na verdade, uma ilusão óptica provocada pela dispersão da luz. A coloração das penas da arara-azul, por exemplo, é resultado da forma como as penas filtram a luz branca, refletindo apenas a luz azul. A raridade dessa cor na natureza dificulta a obtenção e o uso de pigmentos azuis até hoje.

 

A sociedade egípcia, entretanto, tinha uma palavra que nomeava o azul, devido ao fato de que foi uma das primeiras civilizações a incorporar o pigmento em objetos, produzindo esse tom ao moer sílica, cal e cobre. O pigmento era utilizado para decorar artefatos, como estátuas fúnebres, estatuetas e tumbas, refletindo a crença de que a cor oferecia proteção na vida após a morte. Na cultura egípcia, o azul possuía um simbolismo profundo, sendo associado ao céu, às divindades, à água e ao rio Nilo – era a cor da vida, da fertilidade e do renascimento.

 

Talvez, inspirados pela raridade do elemento, o significado da cor azul tomou diferentes rumos em diferentes culturas. Para nós, fica claro a associação à imensidão, aos sonhos, à esperança e ao amar. E para você, o que é azul?

 

Referências

Alles blau, tudo azul?

Azul da natureza

Civilizações antigas não tinham termo que representasse a cor azul

We got the blues for you: a história do gênero musical que é a base para toda a música popular e comercial