(Reportagem: Matheus Espíndola)

A corrida dos pesquisadores por índices como fator de impacto e número de artigos publicados acabam formando uma indústria que, antes de colaborar para o desenvolvimento da ciência, alimenta uma “fogueira de vaidades”, conforme definiu o físico Peter Shulz, da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp. “Em vez de ser um fim em si mesmo, o exame quantitativo deveria dar suporte à avaliação qualitativa especializada. Decisões não podem ser tomadas com base em números”, disse ele.

A crítica de Shulz foi feita durante a sua participação na mesa-redonda Desafios dos periódicos brasileiros das ciências humanas e sociais: avaliação e gestão, realizada na tarde desta terça-feira, 18, durante a 69ª Reunião Anual da SBPC. Segundo o professor, a obsessão pelos indicadores se tornou um desarranjo a ponto de estarem constituídas, no meio acadêmico, estruturas de desenvolvimento e venda de indicadores e prestação de consultorias. “Todos corremos o risco de ser seduzidos”, observa.

Peter Shulz: fogueira das vaidades. Foto: Raíssa César / UFMG

Peter Shulz encerrou sua exposição citando o cientista social americano Donald Campbell: “Quanto mais um indicador social for usado na tomada de decisões sociais, mais ele se verá sujeito à corrupção, e mais será capaz de distorcer e corromper os processos que deveria monitorar”.

O assunto também foi debatido pela socióloga Maira Baumgarten, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que é editora do periódico Sociologias, e pelo professor Adrian Gurza Lavalle, do Departamento de Ciência Política da USP. Maira Baumgarten defendeu a comunicação da produção de conhecimento. “Trata-se de dimensão fundamental para a ampliação do debate público sobre a ciência e suas repercussões sociais”, afirmou.

Maira Baumgarten, da UFRGS, defende a comunicação do conhecimento. Foto: Raíssa César / UFMG

Entre os princípios resguardados pelos veículos de comunicação científica, Maira Baumgarten mencionou o respeito às características das áreas e peculiaridades do público-alvo, a internacionalização como estratégia de promoção de visibilidade e a interdisciplinaridade como mecanismo de estímulo à qualidade das pesquisas.

Baumgarten também propôs a ampliação do debate sobre a “avaliação de impacto” das publicações, feita com base em citações em trabalhos acadêmicos. “É necessário problematizar o uso dessa avaliação como instrumento de medição de qualidade no campo das humanidades”, opinou.

Profissionalização

O cientista político Adrian Gurza Lavalle, da USP, afirmou que o segmento de periódicos científicos comete uma “enorme falha” ao não promover o treinamento de uma geração de editores jovens e a profissionalização das equipes editoriais. “Embora seja uma atividade cada vez mais especializada, a edição da revista de um departamento acadêmico costuma ficar a cargo de um professor. É um absurdo que ainda não exista uma carreira acadêmica exclusiva e um profissional com dedicação integral para essa função”, analisou.

Para Adrian Lavalle, é necessário criar uma carreira de editor de periódico científico. Foto: Raíssa César