A proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), encampada pelo governo federal, foi debatida na manhã desta sexta-feira, dia 7, durante sessão da SBPC Educação, no campus regional da UFMG, em Montes Claros. A SBPC Educação, realizada em parceria com a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEEMG), integra a programação dos 90 anos da UFMG e é uma prévia da Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que será realizada de 16 a 22 de julho, no campus Pampulha.

A mesa-redonda, da qual participaram Shirlei Rezende Sales, professora da UFMG, e Tatiana Clark Xavier, da Secretaria de Estado da Educação, foi marcada por controvérsias.

Para Tatiana Xavier, a iniciativa de proposição de uma base curricular é positiva, pois a proposta reúne os conteúdos básicos que devem ser ensinados no território nacional. “Pelo menos, ela garante o que não pode faltar, o que é comum em todo o território nacional”, explica. Segundo a professora, com a BNCC, garante-se “o direito à aprendizagem”, mas não há garantia de qualidade do processo de aprendizagem. “Esse é um aspecto que precisa ser verificado na prática, dentro da sala de aula”, pondera Tatiana Xavier, que é professora de História.

A professora da UFMG Shirlei Sales, por sua vez, opõe-se à ideia de uma base nacional curricular. Para ela, é preciso ter em mente que “o documento faz uma seleção interessada”.  Segundo a professora, é necessário refletir sobre os critérios que estão por trás das escolhas realizadas. A pesquisadora questiona, por exemplo, os efeitos da normatividade sobre a educação e a escola. “Para boa parte dos curriculistas, e me incluo entre eles, não existe conhecimento universal. O universal é posicionado politicamente a partir da definição de certos grupos. O currículo nacional é uma tentativa de controle e não se busca a qualidade da educação”, defende.

“O currículo nacional é uma tentativa de controle e não se busca a qualidade da educação”, defende a professora Shirlei Sales / Foto: Marcílio Lana-UFMG

Críticas compartilhadas

Apesar de ocuparem campos distintos, Tatiana Xavier e Shirlei Sales compartilham críticas em relação à proposta da BNCC. Elas destacam que o documento do MEC, que já está em sua terceira versão, excluiu a proposta para o ensino médio. O documento, que pode ser consultado no site do Ministério da Educação, traz somente as propostas para a educação infantil e para o ensino fundamental.

“Ainda não existe uma proposta para o ensino médio, que deve sair até o fim do ano”, projeta Tatiana, para depois questionar: “Mas é estranho imaginar uma reforma no ensino médio antes de se ter uma base nacional curricular para esse nível de ensino”. Shirlei Sales vai além: “O ensino médio está em uma caixa que a gente não sabe no que vai dar”.

As duas professoras também indicam contradições entre a versão do documento enviada ao MEC e a que está sendo apresentada pelo Ministério da Educação. Na primeira, diz Tatiana Xavier, havia o eixo de aprendizagem. No documento divulgado pelo MEC, não existe esse eixo, e, em seu lugar, são apresentadas as unidades temáticas, os objetos de conhecimento e as habilidades. “O ensino religioso foi retirado desse documento, e a língua inglesa aparece não como opção, mas como sinônimo de língua estrangeira”, afirma Tatiana Xavier.

Para Shirlei Sales, a versão do documento apresentada pelo MEC é resultado de uma “concepção neoliberal sobre a educação”.  Em sua visão, o documento proposto não contempla a diversidade. “O espaço destinado para incorporar o que interessa à comunidade local foi reduzido. Que escola vai investir tempo e recursos adicionais ao que a base propõe? A proposta da BNCC desse governo põe ênfase na avaliação. Ela vem para fundamentar as avaliações sistêmicas e não a qualidade”, critica.

Por outro lado, Shirlei Sales afirmou que próprio documento encampado pelo governo tem brechas que devem ser aproveitadas pelos educadores. “O MEC está empenhado em dissociar a BNCC do currículo. No meu ponto de vista, estamos com a faca e queijo nas mãos. O texto diz que a escola é que deve programar o currículo, e é por aí que poderemos agir”, afirma.

Equilíbrio

Para o secretário municipal de Educação de Coração de Jesus, Gilberto Medeiros, a ideia de se ter uma base curricular nacional não é necessariamente ruim. Mas ele questiona a forma como o governo federal está encaminhando o projeto.

“A BNCC é necessária. Mas precisamos discutir melhor o conteúdo. Discordo, por exemplo, da exclusão da proposta para o ensino médio e do ensino religioso do documento”, esclarece. Para o secretário, a religiosidade exerce uma influência muito positiva na formação dos jovens, sobretudo nas pequenas comunidades. “Somos definidos pela religiosidade. Ela é muito importante na formação e indica o tipo de educação que queremos ter”, defendeu o secretário.