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Nº 1348 - Ano 28 - 09.05.2002

ICB desenvolve tecnologia para

padronizar "produtos da roça"

Pesquisas controlam processos de fermentação e produção da cachaça mineira, do queijo e do pão de queijo

Murilo Gontijo

 

s imperdoáveis oscilações de qualidade que sempre afetaram a cachaça artesanal, o queijo minas e o pão de queijo, três legítimos representantes da tradição mineira, estão com os dias contados. Pesquisas desenvolvidas pela equipe do professor Carlos Rosa, do departamento de Microbiologia do ICB, farão com que os processos de fermentação e de fabricação dos produtos sejam rigorosamente controlados, o que permitirá a repetição de paladar. "Nosso objetivo é dominar as boas raças de microorganismos e introduzi-las no processo de fermentação, que deixará de ser espontâneo", diz o pesquisador. Segundo ele, outras variáveis alteram o produto final, mas os microorganismos representam o principal elemento de definição do sabor.

Carlos Rosa afirma que os estudos de produção da cachaça estão mais avançados, e que já na safra deste ano raças de Saccharomyces cerevisiae poderão ser vendidas a produtores interessados. A raça consegue sobreviver por 30 dias, o que permite sua participação em 30 ciclos de fermentação. "São introduzidos 10 litros em uma dorna de 1.000 litros. Depois de quatro dias, já se pode fazer a primeira alambicada", explica o pesquisador.

As pesquisas para buscar a padronização produtiva da branquinha começaram em 1994, com a verificação dos microorganismos que prevaleciam em cada fase da produção. Em 2000, um produtor mineiro iniciou a fabricação de cachaça com processo padronizado. Hoje, são quatro marcas padronizadas: Boralina, Cana Brasil, Calibrina e Ilha Grande. "Antes, todos eles deixavam a fermentação ocorrer espontaneamente, e a repetição do paladar, ao longo dos anos, dependia da sorte", diz o professor.

A equipe do professor Carlos Rosa firmou um acordo com o Sebrae/MG para desenvolvimento da tecnologia de produção da Seleta & Boazinha, de Salinas. Serão investidos R$ 9 mil nesse projeto. De acordo com o professor, os produtores da Seleta & Boazinha esperam saltar de uma produção de 600 mil litros, alcançada no ano passado, para um milhão de litros, este ano, e dois milhões, em 2005. Também a Associação de Produtores de Cachaça de Ouro Preto está investindo na padronização do processo de produção utilizado pelos seus 11 cooperados. "A estabilização da qualidade garantida pela introdução de levedura selecionada é essencial para a exportação", garante Carlos Rosa.

A dose do santo pode estar com os dias contados. Afinal, quem vai desperdiçar?

Higiene e qualidade também para os queijos

A cachacinha pede um bom tira-gosto. Que tal um queijo minas? Esse produto também está sendo estudado pela equipe do professor Carlos Rosa (foto). Para isso, foram visitadas dez fazendas da região da Serra da Canastra e outras dez nas proximidades de Serra do Salitre, na região do Alto Paranaíba, onde são produzidos os queijos tipo Araxá. "Nessa segunda linha de pesquisa, verificamos que os queijos, produzidos com leite cru, são manipulados sem muitas preocupações com a higiene, por exemplo", diz o pesquisador, lembrando que o leite cru representa perigo, já que pode ser veículo de transmissão de microorganismos patogênicos. Carlos Rosa afirma que o objetivo agora é conhecer o queijo, implantar as boas práticas de produção e separar bactérias que garantam a qualidade do produto. "Nossa intenção também é padronizar o processo de produção, gerando a estabilização do paladar", explica Rosa.

Ao observar a produção do polvilho azedo a partir do qual se faz o pão de queijo, os pesquisadores concluíram que a qualidade do ingrediente não é padronizada. "Também vamos estudar o polvilho", explica Carlos Rosa. Ao final dos trabalhos, os pesquisadores querem conhecer os processos produtivos artesanais de Minas Gerais, para aliá-los à tecnologia.

 

A branquinha em números

Minas Gerais possui

8.466 produtores artesanais de cachaça.

O setor gera cerca de 240 mil empregos diretos e indiretos no estado.

O estado produz 230 milhões de litros por ano. O Brasil, 1,5 bilhão.

Cachaça vira fonte de divisas

Bebida oficial do Brasil, a cachaça deve render cerca de 200 milhões de dólares em exportações nos próximos dez anos. Por definição, a branquinha deve ter entre 38 gl e 54 gl, o que equivale a teores alcólicos entre 38 e 54%.

Ela pode ser produzida de maneira industrial, em destiladores de coluna, num processo semelhante ao da fabricação de álcool combustível. E, de forma artesanal, em alambiques de cobre.