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Nº 1425 - Ano 30 - 05.2.2004


Mergulho nos Arturos

Estudantes da UFMG desenvolvem projeto de extensão em comunidade remanescente de quilombo

Fiorenza Carnielli

oram apenas quatro meses. Mas o pouco tempo de trabalho não impediu que um grupo de alunos dos cursos de Farmácia, História, Biblioteconomia, Ciências Biológicas e Artes Cênicas da UFMG mergulhasse fundo na cultura da Comunidade Negra dos Arturos, grupo remanescente de quilombo que vive num pequeno sítio na área urbana de Contagem.

Sob a coordenação da professora Regina Helena Alves da Silva, do departamento de História e diretora do Centro Cultural UFMG, eles desenvolveram o projeto de extensão Unisol Quilombos, parceria com o programa Universidade Solidária. A equipe ofereceu à comunidade recursos metodológicos para ajudá-la a compreender seus problemas e a preservar traços de sua história e cultura. Mas a professora Regina Helena ressalta que o trabalho foi planejado a partir de propostas da comunidade. "Adotamos uma metodologia de diagnóstico participativo, assim a própria comunidade apontou suas necessidades", garante.

Um diagnóstico preparado pela equipe do Unisol Quilombos constatou que os principais problemas apontados pelos moradores dos Arturos são as condições de funcionamento da creche, as criações de animais, assistência à saúde, memória e patrimônio. No caso das creches, Regina Helena afirma que se trata de um espaço extremamente valorizado pelos Arturos, pois preserva um aspecto essencial de sua cultura: a oralidade. "A transmissão cultural dos Arturos está baseada no ato de contar histórias. E na creche isso fica a cargo das mulheres idosas que cuidam das crianças", justifica a diretora do Centro Cultural.

Uma das principais ações foi a criação do grupo de memória, formado por jovens da comunidade que elaboraram questionários para entrevistas com pessoas idosas da comunidade. "Os jovens que antes queriam deixar os Arturos, hoje estão cuidando da própria história", afirma Regina Helena. Everton Eustáquio Silva, de 17 anos, é um dos guardiões da memória dos Arturos. "Sentimos a necessidade de conhecer nossa história e registrá-la. Assim, quando alguém quiser conhecer nossa comunidade, já teremos os dados", afirma o jovem.

Também foram desenvolvidos projetos de leitura de textos do folclore brasileiro e clássicos da literatura infantil, oficina de pesquisa, organização da creche da comunidade, campanha de arrecadação de livros e oficinas de teatro. A partir das demandas apresentadas pelos próprios moradores, os pesquisadores da área da saúde fizeram palestras sobre diabetes, dengue, hipertensão, doenças sexualmente transmissíveis e higiene bucal.

Apesar do curto período de realização do projeto, Regina Helena diz que os resultados são positivos. "Os Arturos se envolveram com sua história e seus problemas e a continuidade dos projetos é responsabilidade deles", afirma a coordenadora, lembrando que a equipe continuará dando apoio técnico à comunidade.

Descendente do filho de escravos Arthur Camilo Silvério, daí a origem do nome, e de sua mulher, Carmelinda Maria da Silva, os Arturos são um grupo familiar que mantém tradições ancestrais da cultura africana em Minas. A comunidade preserva e celebra cotidianamente festas como a do Rosário, Moçambique, Folia de Reis e João do Mato.

 


"Queremos conhecer a história de Zumbi"

As oficinas de teatro foram as mais concorridas entre as atividades realizadas pela equipe do projeto Unisol Quilombos na Comunidade dos Arturos. A estudante Rosana Machado de Souza, do curso de Artes Cênicas, coordenou as atividades. Abaixo, reproduzimos o relato de seu primeiro encontro com os "jovens arturos".

A primeira impressão foi de um grupo consistente já que em poucos minutos conseguiram se reunir assim que souberam da "professora de teatro". Conversando com eles, fiquei sabendo que todos participavam do congado e alguns da dança afro, ambos realizados na comunidade. Interessante que, por várias vezes, chamaram o grupo de dança afro de "Axé".


— Grupo de "Axé"? - perguntei, um pouco preocupada.

— É... A gente sempre acaba falando "Axé", porque esse é o antigo nome do grupo.

— Mas o que vocês dançam de verdade?

— Dança afro! Axé era só o nome. É porque o grupo tem 12 anos e quando ele começou o Axé que a gente vê na televisão não era assim não!

— Aí colocaram o nome do grupo pelo significado da palavra que é paz, é como se a gente desejasse tudo de bom para as pessoas.

— Só que aí apareceu o movimento Axé na Bahia e sempre que se usa essa palavra pensa-se no É o Tchan! Mas o significado da palavra é outro...muito mais bonito...

— Sei...entendi. Mas me digam: eu sou uma professora de teatro, como vocês acham que eu poderia contribuir na melhoria da comunidade de vocês?

— A gente queria juntar o teatro com a nossa dança! Porque só dançar é uma coisa, mas nós queríamos dançar e ter alguma coisa a dizer.

— E sobre o que vocês querem falar?

— Zumbi! É! Um pouco da história dele.

— Vocês gostariam de falar e conhecer um pouco da história de personalidades negras?

— Isso!!!