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Nº 1488 - Ano 31 - 16.6.2005

Elas não querem filhos,
mas não têm como evitá-los

Dissertação da Face traça perfil de mulheres não-atendidas pelos métodos contraceptivos

Andréa Hespanha

e uma mulher sexualmente ativa e em idade fértil não deseja mais filhos ou pretende postergar a maternidade, ela recebe a indicação de uso de algum método contraceptivo. Mas há um grupo de mulheres que, mesmo não querendo ter filhos, não utiliza métodos para evitar uma gravidez, seja por motivos culturais e religiosos, seja pela falta de um parceiro fixo ou por não ter acesso a qualquer método.

Esse universo de mulheres que forma o chamado grupo de demanda insatisfeita por contracepção teve seu perfil traçado pela socióloga Marisa Lacerda. As conclusões de seus estudos estão na dissertação de mestrado defendida, em março, junto ao Programa de Pós-Graduação em Demografia da Face.

Usando como base de dados o Programa Saúde Reprodutiva, Sexualidade e Raça (SRSR), coletados em 2002 pelo Cedeplar, Marisa Lacerda comparou os municípios de Recife e de Belo Horizonte. "De posse desses dados, levantei a proporção dessas mulheres e procurei traçar os possíveis perfis", explica a socióloga. Segundo a pesquisadora, em Belo Horizonte o índice de demanda insatisfeita por contracepção é de 6%, enquanto em Recife chega a 7%.


Marisa Lacerda: perfis de mulheres que não usam métodos contraceptivos
Foto: Foca Lisboa

Vulnerabilidade

Para traçar o perfil de mulheres com demanda insatisfeita por contracepção, Marisa Lacerda levou em consideração a heterogeneidade do grupo. O desenho dos perfis foi criado com base em três escalas de escolaridade: de zero a três, de quatro a sete e de oito ou mais anos de estudo.

Marisa Lacerda concluiu que as mulheres de menor escolaridade têm mais chances de pertencerem a todos os grupos com características mais vulneráveis: serem residentes em Recife, negras, unidas ou separadas, desempregadas, sem acesso a rede de esgoto, mais velhas e que tiveram mais filhos do que desejariam. "Enfim, todas as características limitadoras do acesso ao contraceptivo", ressalta Marisa.

Depois de traçar os perfis dessas mulheres, a pesquisadora comparou-os aos das que possuem alguma demanda por contracepção. "Percebi que as mulheres esterilizadas também se associam às características mais vulneráveis e são menos escolarizadas", aponta Marisa Lacerda. Segundo ela, a esterilização é um método mais prático, dispensando acompanhamento profissional. Por isso, prevalece entre as mulheres de menor renda. "As mulheres esterilizadas pertencem ao grupo de demanda satisfeita por contracepção, mas talvez estejam nesse grupo por falta de opção e de esclarecimento", intui.

Fecundidade

A pesquisa apresenta dois componentes principais: queda da taxa de fecundidade no Brasil e demanda insatisfeita por contracepção. O País apresentou uma queda muito grande da taxa de fecundidade, que mede o número médio de filhos de uma mulher em idade fértil. Em 1960, esse índice era de 6,2, caindo, em 2000, para 2,3 filhos. "A mudança ocorreu em contexto de total ausência de políticas públicas de controle da natalidade, já que, somente a partir de 1996, o Sistema Único de Saúde passou a oferecer contraceptivos gratuitos à população", aponta Marisa Lacerda.

A socióloga acredita que seu estudo pode ser uma ferramenta útil para descobrir como a demanda por métodos contraceptivos é atendida pelas políticas governamentais. "Além disso, levanta uma série de questões, como observar porque a mulher não usa anticoncepcional ou porque usa um específico", diz Marisa Lacerda.

Segundo a socióloga, as mulheres de baixa escolaridade com demanda insatisfeita por contracepção não se valem de métodos contraceptivos principalmente por desconhecimento, enquanto as de alta escolaridade não usam porque não têm parceiro sexual fixo. "A idéia é conhecer o perfil desses grupos para ir direto ao ponto com ações mais específicas", defende.

Dissertação: Perfis de demanda insatisfeita por contracepção nos municípios de Belo Horizonte e Recife, 2002

Autora: Marisa Alves Lacerda

Programa: Pós-Graduação em Demografia

Orientadora: professora Paula Miranda Ribeiro

Defesa: 29 de março