Busca no site da UFMG

Nº 1579 - Ano 33
28.5.2007

Felipe Zig
Carlos Palombini
Palombini: academia deve se abrir para novos ritmos

Feita para dançar

Rádio UFMG Educativa lança programa de música eletrônica dançante

Ana Maria Vieira

N

o final dos anos 1930, grupos de jovens alemães que rejeitavam a estética hitlerista reuniam-se em porões de prédios para sua diversão predileta: tocar discos de swing, gênero norte-americano de música dançante de grande sucesso à época. Reprimida pelo nazismo, a experiência teve vida curta, mas fez história, sendo considerada por alguns estudiosos como precursora do surgimento dos DJs, figuras centrais de eventos musicais contemporâneos, em que predominam ritmos eletrônicos.

“Talvez esse seja o primeiro caso de discotecagem numa cena protoclub”, diz o professor da Escola de Música, Carlos Palombini, detalhando uma das histórias que deverá contar no programa Pra dançar, da rádio UFMG Educativa 104,5 FM. No ar desde 21 de maio, a atração veicula versões internacionais, brasileiras e mineiras dos diversos gêneros de música eletrônica dançante como house, hip hop, soul, funk, dub, disco, garage, techno e trance.

“Um dos objetivos do programa é mostrar que esse tipo música também é estudado na academia”, explica Raquel Freitas, estudante do curso de Comunicação Social, que divide a apresentação de Pra dançar com Palombini. “No Brasil, há desleixo com o estudo histórico e científico de manifestações como o funk carioca e de suas relações com a sociedade”, exemplifica o professor, ao observar a importância de a academia e suas mídias se abrirem para gêneros musicais e públicos que se encontram distantes dela.

Responsável, na UFMG, por disciplinas de música eletrônica dançante e eletro-acústica, história da música, tecnologia e criação, Palombini tem o funk carioca como um de seus focos de pesquisa. “Meu interesse não é formar compositores, mas trabalhar questões técnicas e de produção desses gêneros eletrônicos”, especifica. Ele ressalta, contudo, a importância de vincular tais ritmos a contextos sociais. “Pelo menos em sua origem, eles estão associados à expressão de culturas oprimidas, que encontram nas novas tecnologias uma maneira de se expressar e criar músicas para o próprio grupo”, reflete.

No Brasil

Pra dançar é veiculado de segunda a domingo, às 16h15 e a 0h15. Em cada semana, os produtores gravam uma série temática. Na sua edição de lançamento, o programa levou ao ar informações e músicas dos primeiros autores da house, nos anos 80. O gênero derivou da disco music, que havia experimentado seu auge na década anterior. “Nem sempre ela foi estereótipo: começou como cena de festas privadas para grupos minoritários em Nova York, mas o espaço que gerou música própria abrigava um público ligado a movimentos de liberação dos anos 60, como o feminista, negro e gay”, historia Palombini. Ele observa que a disco music, por sua vez, é um desdobramento da soul music, originária do Norte dos Estados Unidos. “Ela deu origem, na segunda metade dos 60, ao funky (o termo, que significava malcheiroso, era então usado para desqualificar os negros) de James Brown”, esclarece. O gênero, posteriormente, foi “substituído” pelo hip hop, que irrompeu como cultura de protesto entre comunidades negras do Bronx, em Nova York.

No Brasil, conforme assinala Palombini, a importação desse ritmos eletrônicos nascidas em comunidades excluídas seguiu vida própria. “Aqui, esses gêneros sofreram um processo de branqueamento, exceto o funk carioca que rompeu paradigmas de nossa história, como o mito de interação de classes”, analisa.

A constituição desse ritmo, ainda de acordo com o professor, não deriva do funky de James Brown, mas do Miami Bass, vertente do hip hop da Flórida. “A música, trazida por negros, foi assimilada por uma periferia econômica, dando origem ao funk carioca, que pode ser considerado nosso primeiro gênero de música eletrônica dançante”, diz.

Série sobre o ritmo também foi gravada por Palombini para a UFMG Educativa. Popularizado como “pancadão”, o gênero é, na avaliação do professor, o mais original e criativo movimento no cenário da música brasileira. “Em muitos casos, o charme e o interesse do funk carioca estão na simplicidade de sua textura musical e na aspereza da enunciação vocal, que é jocosa, direta e sexualmente explícita”, reflete.