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Nº 1598 - Ano 34
25.02.2008

O epicentro da interdisciplinaridade

Face chega ao campus Pampulha para ocupar, fisicamente, o espaço que sempre preencheu academicamente

Ana Maria Vieira

 

Tijolo com tijolo, num desenho lógico, como canta Chico Buarque, foi, nos últimos três anos, cena real para aqueles que passavam pelas imediações da Praça de Serviços, no campus Pampulha. O endereço é a confluência da avenida Mendes Pimentel com a rua Eduardo Frieiro. No local, uma equipe de pelo menos 300 operários empenhou-se em levantar o conjunto de 16,7 mil metros quadrados dos sete blocos de prédios que agora compõem a nova sede da Face, a ser inaugurada no dia 5 de março.

Esses construtores ergueram uma obra no único endereço que convém aos novos moradores. Identificada por seu ethos interdisciplinar, a Face se situa no campus onde sempre esteve academicamente – vizinha às sedes das faculdades de Letras, Ciência da Informação, Filosofia e Ciências Humanas e dos institutos de Geociências, Ciências Exatas e Ciências Biológicas. Seus professores e alunos devem, daqui para frente, estreitar parcerias com outros departamentos. E a recíproca também é provável. Tanto que os funcionários da Unidade já se preparam para isso, pois a presença da faculdade no campus facilitará a formação de novo ponto de convergência entre pesquisadores externos a ela.

“Já percebíamos demanda de alunos do IGC e da Fafich pelos serviços da biblioteca, e, por isso, planejamos o aumento do número de lugares para os usuários no novo espaço”, confirma Maria Célia Carvalho de Resende, chefe da biblioteca da Unidade, uma das áreas da Face caracterizada pela qualidade de sua estrutura e potencial para atrair a comunidade.

O acervo do órgão reúne, aproximadamente, 65 mil livros; 853 periódicos; Coleção Mineiriana com obras sobre Minas Gerais; Coleção Memória Documental, formada por obras publicadas por professores, alunos e funcionários da Face; Coleção Francisco Iglésias, composta por 4,5 mil itens, doados pela família do intelectual, ex-professor da Faculdade; além de documentos históricos e registros iconográficos da Unidade.

24 horas

Em sua nova sede, a biblioteca contará com 16 terminais de consulta ao acervo, além do Centro Integrado de Informação Digitalizada, com 15 computadores. Mas seu grande trunfo é o próprio espaço, que oferece 410 lugares em áreas de estudo e salas para uso individual e em grupo. No antigo endereço, a biblioteca comportava apenas 164 lugares.

No futuro, espera-se que o local funcione 24 horas. De acordo com Nélson Rodrigues da Costa, um dos engenheiros responsáveis pela obra, a estrutura modular do prédio permite que essa proposta se viabilize sem pôr em risco a segurança da faculdade. O órgão ocupa bloco próprio com entrada interligada a outras áreas da Unidade, e outra, independente, localizada em frente ao IGC. Desse modo, em horários especiais, apenas esta portaria seria aberta.

Com trabalhos de fundação iniciados em outubro de 2004, a construção teve custo final de R$ 24 milhões. O planejamento previa a finalização dos prédios em 25 meses, mas devido a interrupções no repasse de recursos financeiros, o prazo foi estendido em 14 meses, informa Luiz Felipe Calvo, coordenador do Campus 2000.

“Apesar da descontinuidade, que geralmente traz improdutividade e aumento de custos, foi possível economizar com as obras”, diz o coordenador. O orçamento original, de outubro de 2004, foi estimado em R$ 21,6 milhões, valor que hoje corresponderia a R$ 25,6 milhões, caso fosse reajustado pelo Custo Unitário de Construção Civil (CUB), do Sinduscon, índice de referência na construção civil.

Outro aspecto ressaltado pelo coordenador diz respeito à realização de ensaios para avaliar a qualidade do material recebido dos fornecedores em laboratórios certificados pelo Inmetro. “Devolvemos diversos deles, pois como não é comum essa prática no mercado, nem sempre possuíam as especificações declaradas”, diz Eugênio Fernandes Foreaux, da equipe de responsáveis técnicos pela obra.

 

Raio X da obra

Área construída: 16.743 metros quadrados
Início da construção: outubro de 2004
Estrutura: 7 blocos destinados a 170 gabinetes de professores; 27 salas de aula para atender 1261 alunos; 11 salas para laboratórios; cinco anfiteatros com espaço para 652 poltronas e 20 cadeirantes; e biblioteca com 926 metros quadrados e 410 lugares
Acessibilidade: elevadores com teclados em Braille; plataformas de acesso em bibliotecas e auditórios e sanitários equipados para cadeirantes
Iluminação: luminárias de máxima eficiência em salas com design para reflexão da luz e sistema de acendimento por estágio; nas áreas externas, uso de lâmpadas com células fotovoltaicas
Sanitários: registros de água dos mictórios masculinos abrem e fecham automaticamente por meio de sensor de presença
Origem dos recursos: Fundo de Desenvolvimento Institucional (FDI) da Fundep; recursos oriundos da transferência, ao Governo Federal, de prédios da UFMG no centro da cidade; recursos próprios obtidos com a venda de lote; MEC, Finep (CT-Infra) e recursos da Face doados pelo Ipead

Foca Lisboa
campus2
Panorâmica externa do prédio da Face, construído nas imediações de outras unidades da UFMG com as quais mantém afinidades acadêmicas

 

“Tivemos que nos formar"

Há 63 anos, na data de 5 de março, a mesma prevista para inauguração da nova sede da Face, o poeta Emílio Guimarães Moura, um dos nomes mais expressivos do modernismo mineiro, tomava posse como diretor da Unidade. Corria o ano de 1945. A Segunda Guerra Mundial chegava ao fim e novas mudanças se anunciavam em todo o mundo.

Moura permaneceu pouco tempo: renunciou, no final do mesmo ano, para assumir funções na administração estadual. Foi substituído, em 1946, por Yvon Leite de Magalhães Pinto. À época, a Face também vivia sua primeira reorganização, fruto de alterações na legislação federal no ensino de economia. Uma das novidades foi a instituição do Conselho Superior Administrativo, tendo a vice-presidência sido entregue a Juscelino Kubitschek de Oliveira.

Criada em 1941, com o nome de Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas de Minas Gerais, a Unidade oferecia inicialmente o curso superior de Administração e Finanças. Seu surgimento foi cercado de grande expectativa nos setores público e privado diante da perspectiva de formação de profissionais capazes de fomentar a modernização da economia mineira.

Mas as dificuldades eram muitas. Conforme relata o professor da Faculdade João Antônio de Paula, em seu estudo O ensino e a pesquisa em Economia na UFMG, publicado na edição de julho a dezembro de 2006 da revista Análise, a Universidade enfrentava restrições materiais e o desafio de formar professores, então pouco qualificados para atuar em suas disciplinas. “Tivemos que começar por nos formar, a nós mesmos”, relembraria, mais tarde, o diretor Yvon Leite de Magalhães Pinto.

A Faculdade transferiu-se em 1948 de sua primeira e acanhada sede localizada à rua Guajajaras, 496, para um andar inteiro no edifício Pirapetinga, à rua Curitiba, 656, onde funcionou até 1954. Dali mudou-se para a rua Curitiba, 832, um prédio de treze andares em que funcionou até o final do ano passado.

Em sua trajetória, a Face incorporou as novidades metodológicas e teóricas de diversas correntes do pensamento. O estudo de João Antônio mapeou grades curriculares para refletir sobre a evolução e a constituição das especificidades do curso de economia da UFMG. Outro aspecto abordado pelo professor é a relação da instituição com a vida cultural e econômica mineira e nacional. “A Faculdade tanto refletiu quanto incidiu e contribuiu para o desenvolvimento urbano e industrial de Belo Horizonte e Minas Gerais”, escreve.

Desde a criação da Face, 8.839 alunos concluíram os cursos de graduação em ciências econômicas, ciências contábeis, ciências atuariais, administração, sociologia política e administração pública. A pós-graduação se organizou a partir da década de 1970 e oferece mestrado e doutorado em administração, economia e demografia, além de mestrado em ciências contábeis.

Encontro marcado

Ricardo Bandeira

A chegada da Face ao campus significa, na prática, a transferência de cerca de 1.800 estudantes, professores e funcionários. Um encontro marcado com a tendência interdisciplinar da universidade contemporânea. “Apesar de encarnar com propriedade os valores da UFMG, a Face não tinha uma vida totalmente integrada à Universidade. Agora, ela vai estar no lugar que sempre reivindicou, ou seja, como parte da Instituição”, comenta o vice-diretor da Unidade, Reynaldo Maia Muniz.

Muniz destaca vantagens da transferência para a comunidade da Face, como o contato com a diversidade do campus, o entrosamento com as demais unidades e o ambiente agradável para estudar e trabalhar. O diretor da Face, José Alberto Magno de Carvalho, é dono de opinião semelhante. Para ele, professores, funcionários e estudantes terão mais segurança e qualidade de vida. “Estamos até sentindo falta do barulho do Centro”, brinca Carvalho.

De 1954 até o final de 2007, a Face funcionou num prédio de 13 andares na rua Curitiba, no centro de Belo Horizonte. Além de ocupar uma área menor – 13.303 metros quadrados frente aos 16,7 mil metros quadrados da nova sede –, insuficiente para abrigar as suas atividades acadêmicas, o prédio antigo apresentava outros problemas, ligados à idade e à localização. “Sofríamos com o trânsito, o barulho e a poluição”, afirma Ricardo Marques, funcionário da Face há 20 anos, atualmente na Seção de Pessoal.

O professor Rogério Mário Fernandes, docente há 37 anos, mora a apenas cinco quarteirões do antigo prédio, para onde sempre ia a pé. Engana-se, porém, quem imagina que ele torceu o nariz para a mudança. “Agora temos a tranqüilidade para trabalhar, escrever e fazer tudo que a atividade docente requer."

Memória

Em pelo menos um aspecto, o prédio da rua Curitiba deixará saudades, sobretudo entre os mais antigos: a rica história construída ali, ao longo de seis décadas. Para compensar a perda, a nova sede da Face terá uma exposição permanente de imagens e textos que contam a trajetória da Unidade. De acordo com o professor José Alberto Magno de Carvalho, a
mostra não ficará restrita a um espaço, mas sim espalhada por todos os setores do novo prédio. “Temos de dar continuidade a essa história, mas num contexto melhor e com qualidade de vida diferenciada”, defende o diretor.