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Nº 1604 - Ano 34
04.04.2008

entrevista

Arte que gera desenvolvimento

Itamar Rigueira Jr. e Luiz Dumont Jr.

Foca Lisboa
Ann
Ann Markusen: temporada na UFMG para estudos sobre cultura e economia

A relação entre cultura e desenvolvimento regional é um dos principais itens da pauta de debates da UFMG. Uma das maiores especialistas no assunto, Ann Roel Markusen, diretora do Centro de Economia Industrial e Regional da Universidade de Minesotta, nos Estados Unidos, é convidada do Programa Cátedras, do Ieat, para fazer conferências e discutir com pesquisadores da Universidade as peculiaridades da indústria cultural brasileira. Ann Markusen recebeu a reportagem do BOLETIM para falar dos benefícios econômicos da cultura como indústria e de sua participação na pesquisa da UFMG.

 

Desde quando se estuda a relação entre cultura e desenvolvimento?

O interesse pelo tema surgiu há cerca de 30 anos, com enfoque na relação entre cultura e desenvolvimento urbano, através da construção de prédios com finalidades culturais nos centros das cidades e da revitalização de municípios degradados. Nos últimos 10 anos, os estudos da estrutura das economias regionais passaram a envolver a cultura.

Antes dessa consciência sobre os benefícios da indústria cultural, o que perderam países e regiões?

Acredito que eles perderam a oportunidade de crescer de forma mais balanceada. Se um país se concentra em indústrias de alta tecnologia, por exemplo, e ignora as outras possibilidades, arrisca-se a tornar-se dependente dessa indústria. A cultura é um setor muito estável – pessoas do local patrocinam atividades artísticas e turistas visitam a região. Além disso, há indústrias que criam livros, filmes, CDs e exportam esses produtos. Existem também os criadores, artistas e outros profissionais, incluindo técnicos e operários, que tiram seu sustento do desenvolvimento local.

O que países e regiões podem fazer para extrair mais benefícios da indústria cultural?

Como ocorre com outras indústrias, é preciso estudar e compreender o mercado. O turismo, por exemplo, cresce em todas as partes. O Rio de Janeiro e a Itália já são muito desenvolvidos nesta área, mas ainda podem estudar o mercado e encontrar novos grupos de pessoas atraídos por diferentes tipos de atividades. Eu acredito que Belo Horizonte é uma ótima cidade para se conhecer andando. É muito bonita, suas ruas são muito arborizadas. O objetivo deve ser o de distinguir a cidade dos outros lugares. O Nordeste faz o marketing de suas praias, mas existem outros lugares com praia no mundo. Se a Bahia tem um ritmo único de música e de festa, ela se diferencia. Muitas cidades pequenas dos Estados Unidos tornaram-se centros importantes por causa de diferentes estilos musicais, como country, folk, jazz e blues.

Como é seu trabalho com pesquisadores da UFMG?

Estamos organizando os dados que temos no Brasil, um perfil das pessoas que trabalham na indústria cultural. Se há mais músicos em uma região, atores em outra, por exemplo. Em pouco tempo, seremos capazes de mostrar a concentração da indústrias televisiva, fonográfica, cinematográfica. Queremos entender como a indústria cultural brasileira vem mudando nas regiões através dos tempos. Quais são os problemas com os direitos autorais. Onde o trabalho criativo está localizado. Queremos identificar o movimento de migração dos artistas para as grandes cidades. Vamos abordar os distritos culturais nas cidades e tentar compreender como municípios históricos, como Diamantina e Ouro Preto, usam a cultura para se revitalizar.

De que forma governos e empresas podem se beneficiar de estudos desse tipo?

Quando realizo uma pesquisa, penso sempre no mercado em que ela poderá ser aplicada. Desenvolvo conexões. Antes de vir ao Brasil, visitei o consulado brasileiro em Los Angeles para entender como o governo realiza sua política cultural e se estaria interessado no trabalho que nós fazemos. Há diferentes grupos nos governos. O Ministério das Relações Exteriores precisa levar a cultura brasileira para outros países, então está muito interessado em saber como as coisas funcionam. O Ministério da Cultura tem recursos para financiar a produção cultural, incentivos fiscais para filmes e outros projetos. Eles querem saber como usar melhor os recursos disponíveis. É importante que governos e outras instituições incentivem a produção cultural, como incentivam a ciência e tecnologia. É preciso encorajar a produção e a educação cultural.

Uma particularidade da cultura brasileira são as festas. Isso afeta a maneira como a cultura está relacionada com a economia do país?

Escrevi um livro questionando o que há de diferente entre as cidades, como forma de atrair pessoas para viver, visitar e investir. Acredito que o Brasil já é muito forte nesse sentido. Nós sempre pensamos no dinheiro vindo de outro lugar, por meio de turistas. Isso é importante, mas se existem diferentes festivais, em várias cidades, pessoas da região vão gastar dinheiro freqüentando esses festivais, comprando arte, escutando músicas. Esse dinheiro não seria gasto se não houvesse o evento. Essa é uma forma de substituição de importação, já que as pessoas acabariam gastando esse dinheiro no shopping. O dinheiro que gastam com a cultura da região acaba circulando ali mesmo.

O Brasil está atrasado quanto ao aproveitamento do potencial econômico da indústria cultural?

Talvez, mas outros países também estão. A Itália tem estado à frente, por causa do aspecto histórico, mas eu não acredito que outros países perceberam isso tão cedo. A idéia de usar arte e cultura como parte estratégica do desenvolvimento econômico é muito recente. No Brasil, há o carnaval, o turismo; ainda é tempo de aproveitar todo o potencial.