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Nº 1626 - Ano 34
22.09.2008

entrevistaGareth Mitchell


“As palavras evocam imagens incríveis”


A UFMG sediará, de 24 a 26 de setembro, o II Encontro Nacional de Rádio e Ciência, organizado pelo Núcleo de Apoio à Divulgação Centífica do Centro de Comunicação (Cedecom) e pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. O objetivo é debater o uso do rádio como veículo de educação científica e contribuir para a formação de profissionais. Para isso, o encontro abrirá espaço para experiências desenvolvidas pela rádio UFMG Educativa e por especialistas como Gareth Mitchell, jornalista científico da BBC Rádio, que fará palestra no primeiro dia de atividades.

Arquivo pessoal
Gareth
Mitchell: programas de ciência devem entreter e desafiar os ouvintes

Por e-mail, Mitchell concedeu entrevista ao BOLETIM, na qual discorre sobre o potencial do rádio como instrumento de divulgação científica. Para ele, a falta de imagens, suposta desvantagem em relação à TV, não chega a ser problema. “Não precisar delas é uma das vantagens. A ciência no rádio funciona especialmente bem ao comunicar conceitos difíceis de visualizar como partículas e cosmologia”, argumenta.

Qual é o papel do rádio na divulgação do conhecimento científico?

Vejo a função primordial da ciência no rádio como mais informativa do que educativa. Quando grandes acontecimentos irrompem na ciência, os noticiários realizam a cobertura dos pontos principais e programas especializados mostram um quadro mais geral, analisando o fato em diferentes contextos. Talvez eles revelem mais sobre os personagens, personalidades e histórias humanas por trás das manchetes. Ou talvez partam de um histórico mais amplo, com fundo cultural, preenchendo na estrutura da matéria o que as publicações deixam de fora. Normalmente, os programas especializados em ciência cobrem histórias interessantes, mas que não necessariamente têm a força ou a oportunidade que os impulsionaria para as manchetes jornalísticas.

E quanto à capacidade de levar ciência para mais pessoas?

A questão de atingir muita gente é problemática. Por definição, alcançar maior audiência significa se apresentar de forma mais popular. A maioria dos ouvintes de rádio ainda está interessada em música, notícias, esportes e entretenimento. A ciência geralmente encontra seu caminho por entre esses canais. Apresentação animada, humor e o enlace de outros enredos ao tópico principal podem ser meios de aumentar o apelo dos programas de ciência no rádio.

Mas – e isso talvez seja motivo de controvérsia – penso que faz sentido que esses programas tenham público mais restrito, deixando as transmissões de grandes notícias e de questões atuais para uma audiência mais ampla. Isso não significa dizer que os programas de ciência de rádio devem ser amenos. Eles precisam entreter e desafiar seus ouvintes. Claro que posso me dar ao luxo de falar como produtor de programa da BBC, rede para a qual, claramente, qualidade é mais importante que audiência.

Nesse contexto, quais seriam as vantagens e desvantagens dessa mídia em relação às outras?

Supomos em primeira análise que a principal limitação do rádio é a falta de imagens. Na verdade, não precisar delas é uma de suas vantagens. A ciência no rádio funciona especialmente bem ao comunicar conceitos difíceis de visualizar como partículas e cosmologia. As palavras podem evocar imagens incríveis. Não digo que o rádio é melhor que a televisão ou o contrário. Existem muitos documentários científicos de tevê que se mantiveram em minha memória por mais tempo que outros veiculados pelo rádio. O fato é que cada veículo tem suas peculiaridades e o sucesso dele depende da capacidade de o comunicador aproveitar suas especificidades.

Como ocorre a difusão do conhecimento nos países desenvolvidos?

O que diferencia o Reino Unido de outros países é a existência de uma emissora pública forte. Sem a BBC, é improvável que tivéssemos ciência no rádio de forma representativa na Grã-Bretanha, por não ser um tema sexy o suficiente para vender espaço publicitário ou atrair assinaturas em função de um comercial com uma modelo. A ciência ainda é vista como um elemento-chave da cultura nacional, junto com a arte, o esporte e o teatro, por isso se justifica na programação oferecida pelas principais redes nacionais da BBC.

Como torná-la mais eficiente?

A BBC tem aprendido – às vezes dolorosamente – como fazer produção para rádio, tevê e mídia on-line. Na teoria, os departamentos da BBC compartilham material por múltiplas plataformas. Na prática, isso é normalmente difícil de conseguir, mas, quando funciona bem, é altamente eficaz.

Quais as conseqüências da divulgação da ciência para o público?

Seria exagero dizer que qualquer comunicação científica transforma a vida das pessoas, mas mensagens cruciais de saúde mudam o comportamento das pessoas para melhor. Exemplo disso são as eficazes campanhas anti-Aids da BBC da década de 1980 que encorajavam sexo seguro e a extensa cobertura sobre a entrada em funcionamento do Grande Colisor de Hádrons {o maior acelerador de partículas do mundo} feita, recentemente, pela BBC Radio 4. Esperamos, pelo menos, ajudar os ouvintes no seu dia-a-dia.

A Rádio preparou um dia de programação em que o acelerador de partículas liderou a pauta sobre outras produções da rede. A revista radiofônica Woman’s Hour apresentou um debate sobre as mulheres na ciência; houve ainda um drama radiofônico encomendado aos autores da popular série de televisão Torchwood. Este, claro, é um caso especial de ciência no rádio com grande penetração. Sempre foi um desafio aproximar a ciência de uma audiência mais ampla. Só que isso precisa ser feito de uma forma interessante, acessível, relevante e leve.