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Nº 1666 - Ano 35
7.9.2009

Os cenários de um combustível brasileiro

Dissertação da Face analisa a cadeia produtiva do biodiesel

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Léo Rodrigues

Não se sabe ao certo quando o petróleo acabará, mas até mesmo as projeções otimistas estimam que os combustíveis fósseis não passam deste século. Uma saída possível é o uso das fontes alternativas de energia e o Brasil aposta muitas fichas em uma delas: o biodiesel. O cenário da cadeia de produção desse tipo de combustível foi tema da dissertação de mestrado de Vicente de Paula Azevedo Júnior, defendida recentemente na Faculdade de Ciências Econômicas (Face).

O objetivo de Vicente Azevedo Júnior era analisar em que tipo de estrutura a indústria nacional do biodiesel tende a se instaurar. No seu percurso, ele esclarece características da produção desta fonte alternativa de energia, assim como analisa as políticas em curso no país e o potencial inclusivo. Suas considerações levaram em conta, sobretudo, o biodiesel produzido a partir da soja. “A diversidade de matérias-primas é grande e inclui girassol, algodão, sebo bovino, mamona, pinhão-manso. Mas a soja é uma cultura que conta com produção em larga escala. É a oleaginosa mais utilizada nas usinas de biodiesel, sem prejuízo à indústria alimentícia”, explica o pesquisador, informando que a produção de biodiesel no Brasil consumirá em torno de 11% do total da soja produzida na safra 2008/2009.

Em sua conclusão, Vicente Azevedo Júnior chama atenção para alguns dados. Ele percebeu que o processamento das oleaginosas corresponde à etapa de produção mais lucrativa, o que significa que a apropriação do faturamento da indústria é, geralmente, bem maior que o do agricultor – respectivamente, 47% e 33% por litro de biodiesel comercializado. Por outro lado, a renda dos agricultores familiares brasileiros, após a decisão do governo de acrescentar biodiesel ao diesel fóssil, elevou-se, em média, 3,5% ao ano do início da década até 2005, quando houve a implantação do marco regulatório do biodiesel no Brasil.

A pesquisa menciona os incentivos federais à indústria do biodiesel e relata que as políticas adotadas têm dado frutos. Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), órgão responsável pela regulação e controle do biodiesel ofertado ao consumidor, o biocombustível gerou economia de aproximadamente US$1 bilhão em 2008. Isso porque a importação do diesel fóssil foi reduzida em 1,1 milhões de litros.

O pesquisador acredita no potencial do biodiesel. Mas alguns desafios ainda precisam ser enfrentados. Um deles é a diversificação da matéria-prima, pois 80% da produção é baseada na soja. Por ser uma commodity, a soja tem seu preço regulado no mercado internacional, o que torna a cotação extremamente instável. “A Embrapa e a Emater desenvolvem pesquisas com outras culturas, mas ainda não as recomendam porque os conhecimentos técnicos sobre elas são incipientes”, esclarece Vicente Azevedo Júnior.

Decisão de governo

O biodiesel brasileiro ganhou status de alternativa energética a partir de 2005 com a aprovação da Lei 11.097, que regulamenta sua mistura ao diesel fóssil comercializável. De imediato, em caráter facultativo, houve a fixação de 2%. Em 1º de janeiro de 2008, a adição do biodiesel tornou-se obrigatória. O percentual da mistura passou para 3% em 1º de julho do ano passado. Um ano depois, novo acréscimo e o biodiesel passou a representar 4% da mistura. A partir de janeiro de 2010, a presença de biodiesel chegará a 5%.

Segundo a pesquisa de Vicente Azevedo Júnior, o biodiesel fabricado pelas usinas nacionais atende, até o momento, apenas a demanda interna. A produção é comprada em leilões públicos, meio encontrado pelo Brasil para garantir a mistura obrigatória dos combustíveis, reduzindo o risco de desabastecimento. As compras de biodiesel são viabilizadas pelo chamado leilão reverso, em que a ANP determina o produto que deseja adquirir e o valor a ser pago; empresas participantes precisam apresentar o menor valor para cada um dos lotes. Somente as empresas vitoriosas no processo licitatório poderão produzir o combustível alternativo.

Vicente Azevedo Júnior observou também que a política do governo brasileiro para o biodiesel lança mão de incentivos para promover a inclusão social de agricultores familiares na cadeia produtiva. Em 2005, foi lançado o selo Combustível Social, pré-requisito para obter financiamento federal. Para receber o selo, as usinas devem adquirir oleaginosas produzidas por agricultor inscrito no Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

Outra exigência para a concessão do selo às usinas é a formalização de contratos com os agricultores familiares que estipulam o período de parceria, os valores de compras, os fatores de reajustes e as condições de entrega das oleaginosas. Nos contratos devem constar a obrigatoriedade de assistência técnica aos agricultores familiares. Financiamentos do BNDES são obtidos apenas pelos projetos de produção de biodiesel que detenham o selo Combustível Social.

Dissertação: Indústria brasileira do biodiesel: cenário sobre estruturas e desempenhos
Autor: Vicente de Paula Azevedo Júnior
Defesa: 26 de junho, no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas (Cedeplar-Face)
Orientador: Ricardo Machado Ruiz