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Nº 1694 - Ano 36
10.5.2010

opiniao

Maquinações intrapessoais
sobre o conceito de respeito

Daniel Rodrigues Costa*

Mesmo não sendo nenhuma autoridade em área alguma do conhecimento, gosto de sensocomungar que todo ser humano é um filósofo em potencial, um analista da vida, do universo e de tudo mais. E como é gigantesco o debate interno, com a nossa mente tentando entender furiosamente o funcionamento e a natureza das coisas, legitimo-me a escrever este artigo de OPINIÃO. Respeito é bom e todos nós gostamos.

“Compreensão não é um requisito para a cooperação.” Engraçado que alguns taxam essa frase como sinônimo de obediência cega, sem questionamento. Porém, a meu ver, é sinônimo de tolerância e (por que não?) respeito. Mas o que significa respeito? É seguir ordens cegamente? E, se não, o que diferencia hierarquicamente a obediência da cooperação? Está claro, rebatem meus pacientes botões, que, para esta última pergunta, a resposta é o exercício livre e consciente da vontade de cada indivíduo.

Respeitar, semanticamente, segundo o Aurélio, é “dar atenção ou importância a; considerar” (grifo meu). Portanto, respeito nada tem a ver com medo de punição, mas porque assim quer quem o faz, por admiração pelos atos, palavras e trabalho de alguma pessoa (física ou jurídica). Muito diferente do que a Sheila Madastavicius (da qual já virei seguidor invisível de seu blog – www.cinemeletras.blogspot.com) ensina lindamente em seu artigo publicado na edição 1.690, de 12.04.2010, do BOLETIM, intitulado Respeitabilidade e autoengano:

“[...] temos uma ideia bastante interessante do que sejam homens de respeito. Para nós, de modo geral, [...] eles devem ‘parecer’ honestos, e, de qualquer forma, ter boa aparência, apresentar títulos, manter relacionamento com pessoas influentes[...] (mas) não há como negar que muitos daqueles entre os mais respeitados homens por nós conhecidos sejam capazes [...] de expedientes silenciados até para si mesmos [...] sendo válida qualquer ação praticada, por mais vil que seja em si mesma, em nome de uma tal ‘respeitabilidade’”.

Essa respeitabilidade no sentido pejorativo é a falácia criada pelos ardis para deixar a alma do que venha a ser respeito para se tornar um facínora sedento por aprovação social. Quando nos inserimos em um organismo, que funciona coordenada e hierarquicamente, teoricamente estamos dizendo que, se estamos fazendo parte dele, é porque queremos. Quando percebemos que os contras do funcionamento pesam mais do que os prós, damos um jeito de mudar na medida do que podemos alcançar, mas se percebermos que seremos comidos vivos pelo Corpo, damos um jeito de sair. Daí a ideia de hierarquia, pois mesmo que nem sempre venhamos a entender ou a aceitar, temos respeito pela autoridade, apesar de muitos o fazerem por medo.

O medo, aliás, é outra manifestação equivocada de respeito. Ora, Sartre já nos mostrava o caminho do livre arbítrio, dizendo que agia com “má-fé” quem mentia para si mesmo, fugindo de suas próprias escolhas. “Assim, não há como responsabilizar o destino ou qualquer providência divina pelos acontecimentos de sua vida. Diria Sartre: “Estamos sós e sem desculpas”.

Quando se entra no mundo acadêmico, cria-se essa exigência de ostentar, de se exibir, a urgência reiterada por respeito como requisito. Primeiro vem o grito, “respeito!”, seguido da birra, “eu quero!”, finalizado com a arma em punho, como quem ordena: ”me passa todo o respeito que você tem agora, senão te mato”.

Sempre que algum amigo, colega ou professor me puxava para um canto me chamando a atenção pelo que fiz de errado, vinha, depois que a raiva da bronca passava, o respeito pela pessoa que teve o cuidado de falar a sós comigo e a coragem de me dar a bronca (ninguém gosta de dar bronca), pesando todas as palavras para não parecer rude nem superior a mim, e muito menos dar escândalo desnecessário na frente de uma multidão.

Portanto, a fórmula do respeito – posso concluir – é esta: seguir os princípios da dignidade humana e da empatia, fundamentos de toda a ética. Tolerância com o próximo, não no sentido de “deixar quieto”, mas também de cooperar quando se percebe a importância do significado de tal coisa para o outro, desde que não comprometa, claro, a própria noção de de tolerância. O dia vai fluir melhor, e vai fazer o dia do outro melhor, em constante aprendizado interpessoal. O Big Brother Brasil NÃO precisa ser aqui. Finalizo com as palavras de um certo vocalista Rodrigo, da Banda Dead Fish: “Não vou cantar / Esse hino que você quer me obrigar / O mundo é um globo como uma nação / se chama humanidade e parece sofrer em vão / Sou um cidadão / quero igualdade e não ser o chefão”.

*Aluno do quarto período do curso de Direito da UFMG

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