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Nº 1762 - Ano 38
6.2.2012

De sumidouro a fonte

Publicado na Nature, estudo de professor do IGC relata alterações nos ciclos de carbono na Amazônia

Ana Maria Vieira

Pressionada por desmatamento e queimadas, a Floresta Amazônica pode estar comprometendo a sua condição de sumidouro e se transformando em fonte emissora de carbono. Essa é uma das tendências apontadas por artigo publicado mês passado pela revista Nature, que tem, entre os seus autores, o professor Britaldo Silveira Soares Filho, do Instituto de Geociências (IGC).

Segundo os autores, as regiões mais afetadas são o Sul e o L este da bacia amazônica, onde ocorreu intenso desmatamento pela expansão agrícola, especificamente em áreas dos rios Tocantins e Araguaia. O efeito mais persistente observado nessas áreas, e principal evidência relatada no artigo, foi o aumento no volume de sedimentos e na descarga durante a estação chuvosa.

Denominado The Amazon basin in transition, o trabalho se baseia sobretudo em pesquisas realizadas no âmbito do Experimento de Grande Escala da Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), um dos maiores programas no mundo dedicados a pesquisa sobre meio ambiente. Na opinião dos cientistas, a dimensão do conjunto de descobertas do LBA pressiona por mais investimentos para melhorar a capacidade científica, tecnológica e de recursos humanos na região, buscando entender a dinâmica dos sistemas da Amazônia e assim mitigar impactos das transições biofísicas e socioeconômicas locais.

“As interações entre desmatamento, fogo e as mudanças climáticas são susceptíveis de alterar ainda mais o armazenamento de carbono, padrões de precipitação e vazão dos rios na região”, escrevem. Para conhecer melhor esse sistema em transição, eles destacam que as novas pesquisas deveriam focar as interações entre cobertura do solo, estoques de carbono, recursos hídricos, conservação de habitat, saúde humana e desenvolvimento econômico, por meio da modelagem de cenários futuros de mudança no clima e no uso da terra.

Resistência e fragilidade

“Os seres humanos têm sido parte do sistema da floresta e da bacia amazônica por milhares de anos, mas a expansão e intensificação da agricultura, exploração madeireira e núcleos urbanos durante as últimas décadas têm sido sem precedentes”, afirmam os pesquisadores no artigo. Dados apresentados por eles mostram a dimensão da ocupação: entre 1960 e 2010, a população na região aumentou de seis milhões para 25 milhões de pessoas, enquanto a cobertura vegetal diminuiu em 20%.
Nos últimos sete anos, foram empreendidas ações que contribuíram para reduzir os níveis de desmatamento em 68%. “No entanto, novas pressões para expansão da agricultura e, consequentemente, para afrouxar a legislação ambiental podem comprometer esse esforço”, observa Britaldo Soares Filho.

No artigo, os pesquisadores registram ainda que o sistema fluvial amazônico é responsável por pelo menos 20% da água doce do mundo, ao passo que a floresta local estoca cerca de 100 bilhões de toneladas de carbono, “que é equivalente a mais de dez anos de emissões mundiais de combustíveis fósseis”.

Em função da magnitude dos dados e das evidências de transição biofísica na região, eles reforçam que a manutenção da integridade do bioma e dos serviços ambientais que ela fornece para as comunidades locais, regionais e globais “exigirá uma melhor compreensão da vulnerabilidade e resiliência dos ecossistemas amazônicos em face das mudanças em curso”.

Em texto de divulgação sobre o artigo, a revista Nature endossa a análise dos autores e destaca que, embora seja resistente a perturbações individuais, como a seca, a Amazônia pode ter sua resistência aniquilida por distúrbios múltiplos. “Os efeitos das mudanças climáticas globais e regionais interagem com a mudança de uso da terra e fogo, aumentando a vulnerabilidade dos ecossistemas florestais à degradação. O artigo fornece um quadro para a compreensão das associações entre a natural variabilidade, fatores de mudança (como as alterações climáticas e
influências humanas), suas respostas e feedbacks complexos na bacia Amazônica”, sintetiza a revista.

O artigo tem como primeiro autor Eric Davidson, cientista e diretor executivo do The Woods Hole Research Center, situado nos Estados Unidos, e como coautores outros pesquisadores norte-americanos, de Porto Rico e das instituições brasileiras USP, UnB, Embrapa e UFMG – no caso o Centro de Sensoriamento Remoto, especializado em modelagem ambiental, do Instituto de Geociências.

Artigo: The Amazon basin in transition
Publicação: Revista Nature (www.nature.com/nature)
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