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Nº 1766 - Ano 38
12.3.2012

Tá limpo?

Software inova na gestão de resíduos sólidos industriais

Ana Maria Vieira

Um trabalho incomum, planejado durante seis anos, levou ex-aluno de doutorado da Escola da Engenharia da UFMG a viajar por 25 países no período de três anos. A motivação: visitar plantas industriais e recolher informações sobre as melhores tecnologias empregadas no tratamento de seus resíduos sólidos.

O conhecimento não ficou no papel. Apresentado no ano passado, na forma de tese, ele ajudou a gerar software destinado ao monitoramento desses resíduos, muitas vezes perigosos, e que já despertou interesse do governo federal. “O programa se baseia em modelo desenvolvido no doutorado, destinado a avaliar o gerenciamento de resíduos sólidos, com o objetivo de prevenir e controlar a poluição industrial”, sintetiza o autor do trabalho, Hosmanny Goulart Coelho.

Em linhas gerais, o modelo propõe dois índices capazes de qualificar procedimentos de gestão e tratamento do resíduo industrial. Eles são processados pelo programa, a partir de demandas dos usuários. Assim, para que uma empresa conheça sua performance nesses quesitos ambientais, basta inserir dados solicitados pelo programa, batizado de Software de Apoio ao Gerenciamento de Resíduos Sólidos (Sager).

“Ele é simples de utilizar”, garante Hosmanny. Um dos índices gerados pelo sistema, o de Destinação de Resíduos Sólidos Industriais (IDRSI), foi construído a partir da análise de dados em seis setores industriais, responsáveis por impactos ambientais relevantes: siderúrgico, automotivo, energético, de laticínios, cimenteiro e têxtil.

Os cálculos feitos pelo Sager também abrangem a minimização, reutilização, reciclagem, coprocessamento, incineração, disposição final e estocagem de resíduos industriais. A versão profissional do programa contém ainda o Índice de Tratamento Mais Limpo (IT+L). Composto de 14 indicadores, o IT+L fornece o desempenho ambiental de tecnologias de tratamento para água, ar, solo e materiais, além de informar a eficiência do aproveitamento da energia proveniente dos resíduos e a redução do consumo de combustíveis e emissão de gases, entre outros fatores. “É um recurso importante para comparar tecnologias utilizadas por diferentes setores da indústria no tratamento de seus resíduos”, observa Hosmanny.

O pesquisador informa que recorreu a técnicas de benchmarking, em que os recursos mais eficientes ambientalmente são pontuados para criar referências na avaliação de tecnologias usadas em três tipos de tratamento de resíduos: waste-to-energy, incineração e aterros de resíduos.

Foi para colher dados para esta etapa que Hosmanny realizou o périplo ao redor do mundo. Ao final, reuniu informações de 200 plantas de tratamento em 32 países, de todos os cinco continentes. Alunos da UFMG no exterior o ajudaram no trabalho.

Segundo a orientadora da pesquisa, professora Liséte Lange, os índices são consistentes. Para ela, as duas principais contribuições do trabalho são a elaboração de indicadores inéditos – como o de tratamento mais limpo – e sua aglutinação em uma ferramenta amigável.

O tratamento de resíduos é a etapa final enfrentada por gestores, após exaurirem todos os procedimentos de sua reutilização dentro ou fora da própria instalação. No Brasil, as soluções finais mais comuns para o “lixo” sólido industrial são o aterramento ou o seu coprocessamento em fornos de cimento, convertendo-o em matéria-prima para a fabricação do material. “Perdem-se recursos que podem ser transformados e cria-se um passivo ambiental muito grande com o aterramento”, avalia Hosmanny.

Nada a declarar

Para desenvolver o outro índice abrigado no Sager, o IDRSI, Hosmanny Coelho recorreu também à literatura internacional, a testes de avaliação de relevância de indicadores com grupos de especialistas e informações de campo.

“Visitei plantas em todo o Brasil, mas não há aqui cultura de transparência e enfrentei muitas dificuldades de acesso a dados. Depois de quatro anos, continuo sem resposta para muitas perguntas”, relata Goulart. A saída encontrada foi buscar informações em documentos públicos oficiais, como o Inventário de Resíduos Sólidos.

“Em geral, as empresas brasileiras ainda tratam a questão ambiental apenas como mais um custo de produção, que deve ser sempre monitorado, e por isso não dedicam atenção necessária a iniciativas de prevenção e controle da poluição, limitando-se a atender às demandas legais dos órgãos ambientais e normas relacionadas a processos de certificação e auditorias ambientais”, registra Hosmanny.

Ele observa, no entanto, que o cenário tende a mudar, e a metodologia proposta na tese poderá auxiliar na percepção sobre o valor econômico, social e ambiental da gestão de resíduos industriais. “Por meio do software, que padroniza e atualiza análises, o empresário pode compreender melhor o processo de destinação de resíduos e ajustar seus indicadores ao longo do tempo, para obter resultados compatíveis também com demandas externas”, diz Liséte Lange.

Entre as vantagens, a adoção da ferramenta facilitaria o alcance, pelas indústrias, de padrões superiores de gestão ambiental, elevando o valor de suas ações no mercado financeiro.

Tese: Modelo para avaliação e apoio ao gerenciamento de resíduos sólidos na indústria
Autor: Hosmanny Mauro Goulart Coelho
Orientadora: Liséte Celina Lange
Programa: Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Escola de Engenharia
Defesa: 2011