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Nº 1572 - Ano 33
9.4.2007

Conexão Sul-Sul

Parceria deve acelerar instalação de curso de ciência da informação em Moçambique

Ana Maria Vieira

Acriação de curso de graduação em ciência da informação em Moçambique está mobilizando equipe de professores da UFMG. Em parceria com pesquisadores do país africano, o grupo está concluindo estudo de viabilidade do projeto, cujo relatório final deverá ser apresentado, em outubro, na capital moçambicana, Maputo. O trabalho, considerado pioneiro na Universidade, tem o objetivo de estabelecer cooperação técnica e científica com os africanos, por meio da formação de recursos humanos em área estratégica para o desenvolvimento de Moçambique.

Foca Lisboa Grupo Moçambique
Pesquisadores de Moçambique e da UFMG: cooperação na área de ciência da informação

“Em nosso país, a situação das bibliotecas, dos centros de documentação e dos arquivos pode ser considerada caótica, pois grande parte não passa por tratamento da informação, como catalogação e classificação”, diz Aissa Mithá Issak, diretora da Biblioteca Central do Instituto Superior Politécnico e Universitário (Ispu), de Moçambique, ao ressaltar a necessidade de pessoal especializado para organizar o setor.

Ex-colônia portuguesa, o país conta apenas com um curso de ciências documentais em nível médio, além de 28 profissionais, graduados e pós-graduados na área em instituições do exterior. O atendimento à demanda das unidades de informação das empresas, do Estado, da academia e das instituições civis é feito, majoritariamente, por especialistas formados em outras áreas ou pelos trabalhadores da informação, os “documentalistas”. Parte desse grupo possui baixa qualificação técnica, mas desempenhou importante papel na história recente de Moçambique.

“Com a saída dos portugueses dos cargos públicos, após a independência, em 1975, foram esses trabalhadores que mantiveram abertas as portas das bibliotecas”, observa Wanda Maria Peres do Amaral, diretora do Instituto Médio de Ciências Documentais (Cidoc) e assessora do Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa (FBLP). Wanda e Aissa integram a equipe de 17 pesquisadores de Moçambique e da UFMG, responsável pelo estudo de viabilidade. O trabalho foi iniciado há um ano, com a coleta de dados nos dois países. Em visita à UFMG, na última semana de março, elas participaram de nova etapa de discussão do projeto, acompanhadas por Almiro Lobo, diretor-geral do Instituto Superior de Administração Pública (Isap).

Oralidade

“O curso que estamos projetando deverá estabelecer uma relação entre a realidade do mundo digital e a tradição local, em que a oralidade possui importante função na transmissão dos conhecimentos”, antecipa a professora da Escola de Ciência da Informação (ECI) da UFMG, Maria Aparecida Moura, que coordena os trabalhos.

O perfil do curso não foi definido. “Estamos analisando dados pesquisados nos dois países”, diz a coordenadora. Segundo ela, foram coletadas informações em Moçambique sobre os profissionais da área, as instituições de ensino e outras que possuem serviço de informação, incluindo itens como infra-estrutura e tecnologia disponível. No Brasil, a equipe desenvolveu estudo teórico e histórico sobre a constituição da sociedade de informação; o conceito de formação e a estrutura curricular dos cursos de biblioteconomia, ciência da informação e arquivologia; e os profissionais egressos desses.

“Com o trabalho, será possível extrair tendências e estabelecer um diálogo entre esse campo do conhecimento no Brasil e em Moçambique e, assim, definir as ações que o projeto vai gerar”, pontua Maria Aparecida. A metodologia de constituição do curso – que se beneficiou das afinidades culturais entre os países e de avaliação da realidade moçambicana – é considerada inovadora pela professora da ECI e integrante do grupo, Maria Guiomar da Cunha Frota. “Não vamos exportar para eles o modelo da UFMG”, assegura. O trabalho conta com financiamento do CNPq e o apoio de instituições moçambicanas.

Um país em reconstrução

moçambiqueEntre 177 países de todo o mundo, Moçambique ocupava, em 2004, a 171ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Mas, se a pobreza de sua população, estimada em 18,9 milhões de pessoas, é por demais conhecida, outra face dessa sociedade não é notícia: trata-se do esforço de reconstrução, empreendido desde 1992, com o fim da guerra civil. Iniciada em 1976, ela destruiu parte da infra-estrutura do país, inclusive a educacional. O empenho dos colonizadores nesse campo foi mínimo: o ensino superior foi implantado em 1962, mas somente 1% dos moçambicanos o freqüentava. Apesar disso, os índices de alfabetização passaram de 7%, em 1975, para 56,7%, em 2000; hoje, o país conta com 15 instituições de nível superior. Paralelamente a esse trabalho, está em curso projeto de modernização do Estado. Segundo Almiro Lobo, mais de 80% dos funcionários públicos têm apenas o ensino básico e, por esse motivo, sua capacitação é considerada fator essencial na melhoria da gestão pública. “A preparação na área de ciência da informação deverá contribuir, decisivamente, para tornar o Estado menos pesado, mais transparente e eficiente”, avalia. Moçambique integra o grupo de países africanos que mantêm taxas de crescimento econômico acima da média mundial. Na última década, a expansão do PIB moçambicano foi da ordem 8% ao ano.