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Nº 1590 - Ano 34
12.11.2007

Bom desempenho no Vestibular
é igual a bom rendimento na UFMG?

Glaura Franco e Rosângela Loschi*

O rendimento no Vestibular poderia explicar o desempenho do aluno na UFMG? O Projeto Vestibular, parceria entre Pró-Reitoria de Graduação, Comissão Permanente do Vestibular (Copeve) e Departamento de Estatística, iniciada em 2004, busca fornecer subsídios para a abordagem desta e de outras questões. O projeto propõe-se, ainda, a produzir informações que auxiliem a tomada de decisões da UFMG em temas como expansão de matrículas, adoção de políticas afirmativas e criação de cursos noturnos.

A princípio, considerando que o Vestibular tem o propósito de selecionar os estudantes mais preparados para seguir carreira universitária, dever-se-ia esperar uma correspondência direta entre o desempenho no concurso e o rendimento na Universidade. Os dados colhidos entre os alunos que ingressaram na UFMG em 2003 revelam, entretanto, que a questão é complexa, apresentando características diferentes, conforme a área do conhecimento ou curso considerado.

Para o conjunto dos estudantes, verificou-se uma correlação positiva, mas fraca, entre a nota no Vestibular e o Rendimento Semestral Global Médio (RSGM). Mas em algumas áreas – Ciências da Saúde e Ciências Sociais – não foi observada correlação entre as duas performances. Em outra – Ciências Humanas –, a correlação foi negativa. Ou seja, nesta última área, há indícios de que os estudantes com melhores notas na Universidade tendem a ser os de piores notas no Vestibular.

De uma maneira geral, o melhor desempenho médio no Vestibular é obtido pelos estudantes que se dirigem para os cursos de Ciências da Saúde, de Ciências Biológicas e das Engenharias. Mais da metade deles alcançou, no concurso de 2003, índice superior a 67%. Por outro lado, a pior pontuação no Vestibular é observada nas Ciências Humanas e em Lingüística, Letras e Artes. Nessas áreas, mais da metade dos aprovados não conseguiu ultrapassar o rendimento de 58%.

Ao observar o desempenho do aluno na Universidade, a situação é completamente diferente. Nos cursos de Ciências Humanas, Letras e Artes, mais da metade dos alunos apresenta RSGM superior a 80%, enquanto nas Engenharias, raros conseguem essa façanha. Neste caso, o RSGM não alcança 60%. Essas observações evidenciam uma possível injustiça ao se comparar notas de alunos vinculados a cursos diferentes, critério usado até recentemente no julgamento das bolsas de iniciação científica.

Quando a atenção se volta para cada curso, a discrepância entre a nota no Vestibular e o RSGM acentua-se. Dos 43 cursos oferecidos pela UFMG, a menor nota mediana no Vestibular foi obtida pelos alunos de Pedagogia Noturno, e a maior, alcançada por candidatos ao curso de Medicina. No entanto, quando se observa o RSGM típico dos alunos desses dois cursos, percebe-se que estudantes de Pedagogia Noturno apresentam o segundo maior rendimento na Universidade, enquanto alunos de Medicina ocupam somente a 23ª posição. Diferenças como essas se acentuam quando comparamos o RSGM dos alunos de várias áreas diferentes.

Por exemplo, o RSGM mediano de cada curso das Ciências Humanas é maior que o de todos os cursos de Ciências Biológicas, Engenharias e Ciências Exatas, apesar de as notas no vestibular, na maioria dos cursos de Ciências Humanas, serem geralmente menores que as dos cursos destas outras áreas.

Assim, qualquer comparação que visa a uma distribuição mais justa de recursos deve ser feita somente entre cursos da mesma área. Por exemplo, comparando-se os cursos da área de Ciências da Saúde, nota-se que os alunos da Medicina apresentam RSGM típico inferior aos obtidos pelos alunos de Enfermagem, Fisioterapia e Farmácia, cujas notas medianas no Vestibular foram menores que a observada para Medicina.

Da mesma forma, na área de Ciências Humanas, o curso de Ciências Sociais é o que abriga alunos de melhor rendimento no Vestibular, mas na Universidade seu RSGM mediano só supera o dos alunos do curso de História noturno. No caso das Engenharias, em cinco dos nove cursos – Controle e Automação, Química, Elétrica, de Produção e Mecânica Diurno –, a nota final típica no Vestibular foi superior a dois terços do total de pontos no Vestibular. A despeito desse notável desempenho – excetuados os alunos de Engenharia Química, que apresentam alto RSGM –, em todos os demais cursos da área de Engenharia os desempenhos dos alunos estão entre os mais baixos da UFMG.

O estudo evidenciou ainda que, para cerca da metade dos cursos da UFMG, a nota do Vestibular está associada ao rendimento na Universidade. Neste grupo, encontram-se os cursos das Ciências Biológicas, quase todas as Engenharias, outros cursos de Exatas (Geologia, Física Diurno, Ciência da Computação e Química Noturno), a maior parte dos cursos vinculados à Saúde e alguns outros das áreas de Ciências Humanas e Ciências Sociais.

No entanto, para a outra metade dos cursos, o desempenho no Vestibular não é relevante para explicar as notas na Universidade. Deve-se registrar, ainda, que a associação entre desempenho no vestibular e na Universidade pode ocorrer em curso ofertado no turno diurno e não ocorrer quando o mesmo é oferecido à noite, ou vive-versa. É o caso, por exemplo, de Química, em que a associação de desempenho ocorre no noturno, mas não no diurno; ou do curso de Física, em que a associação ocorre no diurno, mas não no noturno.

Analisando a totalidade de alunos que ingressaram na UFMG em 2003, percebe-se que a área à qual o curso pertence é a variável mais fortemente associada com o RSGM do aluno. Curiosamente, outras variáveis importantes no estudo, como o tipo de escola onde o aluno concluiu o ensino médio, o turno do ensino médio e o número de reprovações nos ensinos fundamental e médio, não são relevantes para explicar o desempenho do aluno na UFMG, embora o tipo de escola do ensino médio seja a variável mais fortemente associada com a aprovação do aluno no Vestibular.

Este estudo não é conclusivo, mesmo porque não se pode garantir que resultados observados em uma turma se reproduzam em outra. No entanto, alguns resultados deixam claro que a UFMG, ao estabelecer políticas para os seus cursos, deve levar em conta a diversidade das áreas.

*Professoras do departamento de Estatística do Instituto de Ciências Exatas da UFMG

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