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Nº 1633 - Ano 35
10.11.2008
Itamar Rigueira Jr.
O tema da corrupção foi escolhido pelo Centro de Referência do Interesse Público (Crip), da Fafich, como primeiro objeto de pesquisa. E o mais novo fruto desse trabalho é o livro Corrupção, democracia e legitimidade, de Fernando Filgueiras, bolsista de pós-doutorado na UFMG e integrante do corpo de pesquisadores do Crip. Dedicado às questões da corrupção e da democracia sobretudo a partir do mestrado, também na UFMG, Filgueiras resolveu tratar a corrupção sob a ótica da teoria política.
“O livro tem a pretensão de discutir o tema por um viés normativo, tratando-o em seus aspectos éticos e institucionais, e definindo a democracia como questão fundamental”, explica o autor, doutor em Ciência Política pelo Iuperj, do Rio de Janeiro. Ainda segundo ele, a obra quer investigar as formas que a corrupção pode assumir na ordem democrática e as conseqüências desse processo.
Filgueiras explica que o sentido original de corrupção, na perspectiva da filosofia grega, está relacionado à concepção de decadência de um regime político. A partir do Renascimento, especialmente em Maquiavel, o termo define a decadência da idéia de república. Na modernidade, com a concepção de História como processo, passa a se ligar à idéia de interesses. E, finalmente, nas sociedades mercantis, a corrupção se associa às rotinas administrativas do Estado – e o Direito tornou-se elemento crucial para definir o que é e o que não é corrupção.
A análise de Fernando Filgueiras parte do princípio de que a corrupção é uma forma de ação ilegítima dos atores políticos: “É a própia ilegitimidade, pois não é passível de justificação pública”. Ele considera também que, nas sociedades contemporâneas, que cultivam a democracia como valor universal, a questão da legitimidade precisa ser discutida “de forma mais abrangente, se quisermos debater publicamente o problema da corrupção”. De acordo com o cientista político, há uma crise de legitimidade nas democracias contemporâneas, e essa situação deve levar à discussão de reformas do Estado e da própria democracia, condição essencial para que se avance no desenvolvimento desse sistema político.
Ao falar de legitimidade política, Fernando Filgueiras desenvolve uma tipologia da corrupção. Ela pode assumir quatro formas: política, que tem como questão central a distinção entre público e privado, e remete à noção de decoro; cultural, relacionada, por exemplo, à questão da honestidade; social, que envolve o modo de controle do poder do Estado; e econômica, exclusiva da esfera privada e representada por fraudes contábeis e financeiras.
Filgueiras considera que falta às democracias uma noção de valores públicos. Embora se tenha avançado muito com relação aos controles institucionais da corrupção – com o aprimoramento do trabalho das polícias e de tribunais de contas, por exemplo –, e o tema seja central em uma série de tratados internacionais, o pós-doutorando avalia que é preciso começar a discutir a corrupção não apenas em sua dimensão institucional, mas no âmbito de toda a sociedade: “O controle da corrupção não pode ser assumido apenas pelo Estado, temos que pensar em termos dos valores públicos.” Ele lembra que a transparência é uma inovação muito importante, mas precisa permear também a publicidade. “Nesse sentido, a questão da transparência deve ser compromisso de sociedades inteiras e não apenas do Estado”, defende Filgueiras.
Se, por um lado, o autor tem percebido barreiras para o crescimento da corrupção – não apenas no Brasil, mas também na Comunidade Européia e em outros países da América Latina –, ele alerta para sua presença cada vez maior no âmbito das relações internacionais, especialmente no comércio. “Sabemos muito pouco sobre as relações de governos e grandes conglomerados internacionais, área pouco suscetível a controles”, diz Fernando Filgueiras.