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Nº 1641 - Ano 35
16.2.2009

Campo minado

Municípios mineiros adotam armadilha desenvolvida
na UFMG para capturar mosquito da dengue

Ana Maria Vieira

Foca Lisboa
Alvaro Eiras
Alvaro Eiras: tecnologia permite informação em tempo real

Armadilhas de captura do mosquito Aedes aegypti, vetor da dengue, começaram a ser instaladas em 23 cidades mineiras por iniciativa da Secretaria Estadual de Saúde. O trabalho, iniciado na primeira semana de fevereiro, integra plano de controle do vetor que deverá destinar R$ 6 milhões para diversas ações em Minas Gerais – metade delas para a implantação das armadilhas.

Desenvolvida há cerca de nove anos pelo pesquisador Alvaro Eiras, do Departamento de Parasitologia do ICB, a tecnologia, conhecida como Monitoramento Inteligente da Dengue (MI-Dengue), permite identificar o local de infestação do Aedes, controlando informações georreferenciadas e em tempo real sobre a densidade da população do vetor da dengue. A novidade recentemente incorporada ao sistema é a detecção dos mosquitos infectados pelo vírus desencadeador da doença.

Conforme explica Eiras, os recursos do sistema de monitoramento gerados pela armadilha permitiam, até então, conhecer sobretudo o local e a intensidade do vetor numa região – denominado índice entomológico –, sua evolução no tempo e a associação desses dados com casos de dengue. Entretanto, nem sempre locais com altas taxas de infestação produzem índices reais para transmissão da doença. “Identificar locais de ocorrência de mosquitos infectados com o vírus da dengue fará toda a diferença, pois permitirá ao gestor público redefinir prioridades, otimizar recursos e evitar a contaminação da população”, observa o professor.

Até o momento, sabe-se que o ciclo de contaminação está restrito ao mosquito e ao homem. “A fêmea do Aedes transmite o vírus também para os ovos, mas a doença pode reduzir seu tempo de vida e capacidade reprodutiva”, diz o professor Álvaro Cantini, do Departamento de Biologia Geral do ICB. Ele é o responsável pela metodologia de detecção da infecção que será adotada pelo MI-Dengue. A técnica está sendo testada com Aedes capturados no campus Pampulha, Vitória (ES) e Campos dos Goytacazes (RJ).

“Os insetos capturados são colocados em tubinhos com substância preservadora de ácido nucléico e enviados pelo correio ao nosso laboratório”, diz Cantini. Na UFMG, os vírus são liberados das cavidades internas dos insetos por meio de maceração manual. As etapas seguintes envolvem extração do RNA e realização de reações até chegar à identificação do sorotipo. Por essa rota, o resultado é obtido em 15 dias. Mas, diante da necessidade de produzir informações em escala ampliada – a meta é processar 10 mil amostras por mês –, os pesquisadores pretendem automatizar o processo. Segundo Cantini, recursos da ordem de R$ 2 milhões já foram solicitados ao BNDES para aquisição de equipamentos, que poderão dar conta de todas as etapas em apenas dois dias. Os recursos também se destinam ao custeio de bolsas e manutenção.

Vantagens

O sistema MI-Dengue está implantado em 13 cidades de Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Espírito Santo e em Cairns, na Austrália. No Brasil, os municípios usam recursos próprios, pois a tecnologia ainda não foi aprovada pelo Ministério da Saúde, o que impede o uso de verbas federais. “A metodologia para indicador da dengue adotada oficialmente é de 1920 e foi desenvolvida para febre amarela”, explica Eiras. O índice informa, basicamente, o percentual de residências infestadas pelo mosquito.

Para o professor, o método oficial é falho porque desconhece o número de mosquitos e larvas presentes em cada domicílio. “Pode haver situações em que o risco de dengue detectado pelo sistema não traduza a realidade: um indicador de 0,5% (cinco casas em mil, onde há larvas de A. aegypti) pode ser baixo, mas se houver piscina nelas, o número de larvas será muito maior que em outros locais onde o indicador apresenta-se superior, mas com menos focos”, argumenta. O uso do MI-Dengue evita este equívoco, pois monitora em tempo real o número de mosquitos em raio de 200 metros quadrados do local onde está implantada a armadilha.

“Agentes de campo vistoriam semanalmente as armadilhas, recolhendo os insetos ali capturados por meio de atraentes químicos também desenvolvidos na UFMG. Dados sobre eles são digitados no mesmo momento em computadores de mão e enviados on-line para o gestor”, relata Alvaro Eiras. Softwares do sistema geram mapas e gráficos mostrando a evolução ao longo do tempo. Pelo método oficial, os dados são consolidados em cerca de 30 dias, e podem conter erros, adverte o professor.

Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, é um caso exemplar do uso do sistema de monitoramento. Em 2007, informa Eiras, houve 3,5 mil casos de dengue no município. No ano passado, depois da adoção do monitoramento, foram registradas 50 ocorrências.

Captura em massa

Os resultados de novos testes sobre aplicações relativas ao controle da população do Aedes aegypti pelo MI-Dengue deverão ser conhecidos ainda este ano. Trata-se de estudo que integra ações do Instituto Nacional em Pesquisa da Dengue, coordenado pela UFMG e recentemente aprovado pelo CNPq. Seu objetivo é reduzir o número de casos da doença por meio de captura massiva do vetor. O trabalho está sendo realizado em Manaus, com a instalação de 900 armadilhas em um bairro – uma por residência. “Serão feitas coletas de sangue dos moradores no início e ao final dos testes para comprovação científica da redução da transmissão de dengue”, informa o professor Alvaro Eiras. O projeto recebeu R$ 1,2 milhão do Banco Mundial, do CNPq e da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado da Amazônia.