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Nº 1642 - Ano 35
2.3.2009

“Universidade é um patrimônio
a ser preservado”

Flávio de Almeida

Em entrevista ao BOLETIM, o reitor Ronaldo Pena explica a razão que levou a UFMG a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o acórdão do Tribunal de Contas da União, que aponta possíveis irregularidades na relação entre 16 universidades federais brasileiras e suas fundações de apoio. Para ele, o órgão extrapolou as suas atribuições. “Queremos saber da principal Corte da nação qual é o limite para a atuação do TCU”, explica o reitor.

Ronaldo Pena também analisou os resultados do bônus para alunos de escolas públicas, o crescimento de vagas na graduação propiciado pelo Reuni, as dificuldades de financiamento para a assistência estudantil e, dirigindo-se aos novos alunos, lembrou que a Universidade é um espaço que fornece amplas possibilidades de formação.

Por que a Universidade foi ao STF para contestar o acórdão do TCU?

A relação da UFMG com o TCU sempre foi pautada pela cooperação e pelo respeito. Mas, no nosso entendimento, o órgão exacerbou, ultrapassando a barreira do que entendemos como sendo sua área de ação. E foi aí que se estabeleceu o contraditório; não podemos aceitar essa situação como “desígnio de Deus”. Esse acórdão foi elaborado por pessoas falíveis, ainda que bem intencionadas. Ele compromete o trabalho das universidades, o seu desenvolvimento institucional e a gestão da pesquisa. E em relação à UFMG, a invasão de competência é ainda maior, pois estabelece uma determinação inaceitável, a de que o professor em regime de dedicação exclusiva não pode coordenar curso de especialização. É uma determinação que a UFMG só aceitará se o STF decidir que o TCU pode definir que tipo de professor deve dirigir curso de pós-graduação.

Por essa razão, a UFMG, que tem uma tradição de altivez, não acatou a determinação. Queremos saber da principal Corte da nação qual é o limite para atuação do TCU. E quem demarca esse limite, em nossa visão, é o STF. (Leia mais na página 7)

A relação da UFMG com a Fundep é o principal alvo do acórdão do TCU. A instituição teria chegado ao estágio atual sem o suporte de sua fundação de apoio?

A Fundep tem oferecido um apoio absolutamente estratégico para a UFMG. No atual arcabouço legal existente no Brasil, não dá para pensar em uma universidade sem a sua fundação de apoio. A legislação permite a relação entre as universidades e suas fundações de apoio, e entendo que a nossa interface com a Fundep está amparada por ela.

Como o senhor avalia os resultados do primeiro vestibular que utilizou o bônus para alunos de escolas públicas como fator de seleção?

Os primeiros levantamentos mostram o sucesso da medida como fator de inclusão de estudantes de escolas públicas, principalmente para os de escolas estaduais, onde se concentram os alunos mais pobres. Mas tenho a impressão de que o bônus pode ser aperfeiçoado. Vou apresentar ao Conselho Universitário a sugestão de ampliar, de sete para 11 anos, a exigência de estudo em escolas públicas para quem deseja se habilitar ao bônus. Existem algumas boas escolas públicas, como o Colégio Militar, que recebem crianças apenas na quinta série. Muitas delas, de famílias de bom padrão socioeconômico. É um grupo pequeno, mas neste caso o bônus não funcionou bem.

A Universidade está preparada para absorver o crescimento de matrículas provocado pelo Reuni?

Estamos aumentando vagas na graduação e isso significa que precisamos ampliar a nossa infraestrutura, o que não acontece no mesmo ritmo do crescimento das vagas. Claro que a comunidade universitária sofrerá um pouco, mas é preciso entender que é por uma causa maior. Estamos colocando mais 1.200 jovens na Universidade só em 2009. O que significa isso? Significa que estamos absorvendo jovens que acabariam se matriculando em escolas privadas ou que nem continuariam estudando.

Que medidas a Universidade está tomando para minimizar esse impacto?

Reativaremos o Restaurante Setorial 1, nas proximidades da Faculdade de Educação, vamos melhorar o tráfego no campus, incentivaremos as pessoas a deixarem seus carros no Mineirão (a Universidade mantém um convênio com o Governo do Estado) e pretendemos criar um estacionamento temporário nas proximidades da Escola de Música, onde há uma área usada como depósito de entulho. Além disso, a Escola de Engenharia abrirá um grande estacionamento próximo à entrada do campus pelo Colégio Militar.

No ano passado, o STF declarou inconstitucional a contribuição ao fundo de bolsas, que gerava recursos para financiar a assistência estudantil. Esse quadro ameaça a assistência aos alunos carentes?

Para este ano, os programas estão garantidos porque o governo alocou recursos para a assistência. Mas, no futuro, se o governo deixar de fazer aportes, a assistência estudantil poderá ser prejudicada.

Com o Reuni e o bônus, a demanda nessa área tende a crescer...

Sim. E se os recursos não forem suficientes, teremos que priorizar. Em primeiro lugar, a alimentação, em segundo a moradia e depois a assistência à saúde. Temos que fazer o que o recurso permitir.

Que mensagem o senhor deixa para os novos alunos da UFMG?

A Universidade oferece amplas possibilidades de formação. É um espaço público sem limites para o aprendizado. Quem determina esse limite é o estudante. A Universidade permite a convivência com a divergência, atributo fundamental para quem precisa avançar na sua formação de cidadão. Por outro lado, a Universidade é um patrimônio e ele precisa ser preservado, tanto no sentido físico, quanto no sentido moral. Essa é uma instituição onde se pode divergir e que estimula o debate de ideias, mas o respeito pelo interlocutor é fundamental. A população, que é quem paga a conta dessa estrutura, espera muito de nós. Não podemos desperdiçar a oportunidade de contribuir para o desenvolvimento do país.