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Nº 1677 - Ano 36
23.11.2009

O lixo que vira carvão

Tecnologia ambiental desenvolvida na Escola de Engenharia reduz volume de resíduos sólidos em 90%

Foca Lisboa
Reator da Ecobrás concebido para processar resíduos hospitalares

Bárbara Xavier França

Se reduzir a geração de lixo ainda é um sonho distante, apesar dos esforços de formação de uma consciência voltada para a racionalização do consumo, a diminuição do espaço físico ocupado pelos resíduos sólidos pode representar uma alternativa para ajudar a solucionar este que se apresenta como um dos grandes quebra-cabeças contemporâneos. O que fazer com o lixo? Onde depositá-lo?

Os pesquisadores Gilberto Caldeira Bandeira de Melo e Artur Torres, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG, em parceria com a Engenho 9, empresa com atuação na área ambiental, oferecem respostas para tais perguntas a partir do uso de uma tecnologia que batizaram de Pyrolix. Ela é inspirada no processo de pirólise, que decompõe ou altera a composição de materiais, submetendo-os a temperaturas superiores a 400ºC. Sem a presença de oxigênio, o resíduo se transforma em carvão, com redução de até 90% em seu volume.

“A tecnologia já é conhecida, mas o Pyrolix permite o reaproveitamento dos gases liberados no processo, uma forma inovadora de reaquecer o reator onde os resíduos são processados”, afirma Artur Torres. Assim, a técnica gera benefícios simultâneos: é autossustentável na produção de energia; impede a liberação na atmosfera de substâncias nocivas à saúde, como dioxinas e furanos; diminui a geração de poluentes como o metano e o gás carbônico, principais agentes causadores do efeito estufa; e pode, no futuro, representar uma alternativa aos aterros sanitários e à incineração, soluções de gestão de resíduos cada dia mais próximas do esgotamento. A tecnologia é patenteada pela UFMG, Engenho 9 e Fapemig, que oferece apoio financeiro ao projeto.

Segundo Gilberto Caldeira, que também é conselheiro da ONU para regulamentação do Protocolo de Quioto, o Pyrolix pode promover o sequestro de carbono. O lixo, quando estocado em depósitos, decompõe-se, produzindo o chorume, líquido altamente poluente. Com a pirólise, o lixo, transformado em carbono, fica inerte. Assim, não mais se decompõe. “Ao carbonizar o lixo antes de despejá-lo no aterro, enterramos o carbono e, dessa forma, também ajudamos no combate às mudanças climáticas”, completa o pesquisador.

Lixo hospitalar

As primeiras atividades do projeto lidavam com resíduos da indústria do couro. De acordo com Caldeira, como esse tipo de material contém cromo, metal pesado nocivo à saúde, era preciso desenvolver tratamentos adequados antes de simplesmente despejá-los em algum aterro. A partir daí, as pesquisas enveredaram para outros materiais, como dejetos das indústrias de borracha, plástico e farmacêutica.

No entanto, é o lixo hospitalar que demanda os maiores cuidados. De acordo com a Resolução 5/93, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), os resíduos sólidos decorrentes da atividade hospitalar devem receber tratamento diferenciado, como esterilização a vapor ou incineração, por conter alto grau de patogenicidade. Segundo Artur Torres, Belo Horizonte produz cerca de 40 toneladas de resíduos hospitalares por dia, destinados a uma vala séptica. Porém, a exemplo das demais áreas de aterramento, também atingiu seu limite, fazendo com que a Prefeitura lançasse um edital para que as empresas apresentassem tecnologias como solução ao problema. O Pyrolix foi apresentado por meio da Ecobrás, empresa licenciada para fazer uso comercial da tecnologia. “O Pyrolix é ideal por ser uma alternativa à incineração, comumente usada no trato desses resíduos, mas muito poluente”, afirma Gilberto Caldeira.

Um reator em escala semi-industrial já está sendo construído na Ecobrás, empresa que desenvolve técnicas de destinação de resíduos situada no distrito industrial de Sarzedo, a 33 quilômetros de Belo Horizonte. Estima-se que em janeiro de 2010 já esteja apto a processar 30 metros cúbicos diários de resíduos gerados pelas atividades de saúde, com flexibilidade para duplicação. Torres explica que a intenção é aprimorar os estudos para processar todas as modalidades de resíduos e diminuir os custos, que hoje superam os envolvidos nos processos de aterramento.

Problema a céu aberto

Belo Horizonte recolhe cerca de quatro mil toneladas de lixo por dia, sendo 2,6 mil toneladas só de lixo domiciliar.

O aterro sanitário da capital já atingiu sua capacidade máxima e atualmente o lixo recolhido é destinado a um aterro em Sabará, com concessão de 25 anos.

Dos 853 municípios de Minas Gerais, apenas 19 possuem aterros sanitários.

60% dos municípios mineiros ainda depositam seus resíduos sólidos em lixões, depósitos a céu aberto sem nenhum cuidado específico.

No Brasil, são produzidos cerca de 35 milhões de toneladas de lixo por ano.