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Nº 1761 - Ano 38
12.12.2011

opiniao

A patente e suas vítimas*

Rogério Cezar de Cerqueira Leite**

“A patente é um direito outorgado pelo governo a pessoas ou companhias para impedir outras pessoas ou companhias de produzir, vender ou usar um produto ou um processo que foi inventado por outrem.” Acho que foi Perelman, em seu tratado sobre argumentação, que nos ensinou que, sempre que uma afirmativa não ficar clara em sua forma positiva, é conveniente reformulá-la na forma negativa.

É o que fizeram A. B. Jaffe e J. Lerner com a definição acima de patente. E, de fato, a patente tem sido usada antes para impedir a produção de um bem do que para realizá-la. A indústria de semicondutores, em seus primórdios, ou seja, até meados da década de 80, não tinha a patente como objetivo importante, talvez devido à crescente velocidade de obsolescência de suas tecnologias. Um filme recente exemplifica essa condição.

Após oito anos de prisão, o personagem encarnado por Michael Douglas em Wall Street 2 recebe os pertences entregues quando ali se apresentou. Dentre eles, o seu celular, um tijolo de um quilograma que não caberia no bolso e que não seria capaz de nada a não ser chamar um outro telefone. Ora, de que serviria patente de 20 anos se o tempo de obsolescência médio de uma inovação no setor é inferior a um ano, senão para impedir a evolução e o progresso?

Foi a Texas Instrument que, no início da década de 80, percebeu o maná que poderia ser a legislação patentária. Formou legião de advogados especializados em litígio, depositou uma imensidão de pedidos de patentes e logo viu suas receitas provenientes de litígios devidos à propriedade intelectual suplantarem aquelas relativas à produção.

O exemplo foi logo seguido por uma coorte de empresas, e viu-se a proliferação de advogados de patentes, firmas e consultorias. Quanto mais aplicações de patentes, mais litígio, mais legislação e, consequentemente, mais advogados, mais parasitas, constituindo um círculo vicioso cuja única ­consequência é o retardamento do desenvolvimento tecnológico.

Para setores em que intensivas pesquisas predominam, o benefício proporcionado pela introdução da inovação no mercado é suficiente como retribuição pelos investimentos em pesquisas e eventuais mudanças de processos de produção que possam ter exigido investimentos expressivos.
Diferentes setores têm diferentes tempos de vida de suas tecnologias, desde a área de construção civil, em que uma tecnologia resiste por séculos, até a de telecomunicação e informática, ou aeronáutica, por exemplo, em que esse período pode ser, em média, de um semestre.
É óbvio, portanto, que ter um mesmo rígido período de monopólio de 20 anos serve principalmente para retardar a evolução tecnológica e rechear os bolsos de advogados, burocratas e outros parasitas do tráfico patentário.

*Físico, professor emérito da Unicamp
**Artigo publicado na Folha de São Paulo de 2/12/2011

Homo innovatus: a evolução necessária para o século 21

Marcos Pinotti***

Quanto vale uma boa ideia? O que é uma boa ideia? Duas perguntas difíceis de responder e que estão relacionadas diretamente à inovação. Mas, afinal, o que é inovação? Este artigo não tem a intenção de definir o que é uma boa ideia ou dar o seu devido valor, mas de chamar a atenção para onde a famosa inovação pode nos levar.

Inovação é a introdução da renovação. Para a Engenharia, esta palavra vem sempre acompanhada: inovação tecnológica. Portanto, inovação é a introdução de novas práticas, métodos, pensamentos e técnicas para melhorar o conforto e a qualidade de vida das pessoas, para desenvolvimento econômico ou para refinamento do conhecimento.

Na sociedade do conhecimento, a inovação possui um dos pilares mestres apoiado na Universidade, onde o conhecimento é gerado, sistematizado e transmitido. Além disso, nossa interação com a sociedade tem se fortalecido de maneira importante nos últimos anos, quando nos tornamos mais um dos principais elos da cadeia da inovação, e, além do conhecimento, produzimos as patentes.

Essa evolução é consequência natural da sintonia que a nossa Universidade possui com o contexto e as necessidades do país. No entanto, para onde estão indo essas patentes? Fazendo um paralelo com a produção e publicação de artigos científicos, a de patentes deve acompanhar o seu licenciamento. Porém, para a publicação de um artigo, há dezenas ou até centenas de opções. Temos até uma ajuda extra da classificação do Qualis. Por outro lado, quais são as opções de licenciamento de nossas patentes? Onde estão os empresários, empreendedores, investidores interessados em nossas tecnologias? Há um grande esforço para atraí-los. Aos poucos eles chegam.

A UFMG se destaca não só na produção como no licenciamento. Mas não estamos felizes com isso. Não nos contentamos em ser melhores que outras universidades. Os números absolutos da quantidade de licenciamentos ainda são baixos. O que ajudará o Brasil será aumentá-los. É um longo caminho, porém irreversível e necessário. Já evoluímos com os marcos legais importantes, entretanto, precisamos promover mais uma evolução, que é disseminar para os nossos estudantes a necessidade de empreender e a sabedoria de reconhecer a importância de inovar e de crescer.

Devemos promover mais fóruns de discussão, como foi o nosso Dia da Inovação no UFMG Conhecimento e Cultura de 2011. Devemos implementar mais disciplinas ligadas ao empreendedorismo e à inovação. Devemos sensibilizar nossos estudantes sobre a necessidade de o Brasil saber inovar e transformar o conhecimento, que transmitimos às novas gerações, em novos produtos, processos e serviços. Precisamos desencadear o processo de evolução, de Homo sapiens a Homo innovatus, para sobrevivermos no século 21 como uma nação líder em inovação.

***Professor associado do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola de Engenharia da UFMG