Busca no site da UFMG

Nº 1786 - Ano 38
20.8.2012

Também chamadas de “tags”, fazem o link entre a imagem de uma pessoa na foto e seu perfil no site.

Novas vozes da Amazônia

Obra da Editora UFMG revela discursos críticos e não hegemônicos sobre a região

Itamar Rigueira Jr.

O interesse crescente pela Amazônia – ainda mais valorizada, em tempos de aquecimento global, como reserva de água e da biodiversidade – despertou na pesquisadora Ana Pizarro, da Universidade de Santiago do Chile (Usach), uma inquietação: ela se deu conta de que os estudiosos da América Latina conhecem pouco ou nada da região. E entendeu que era preciso abrir o tema a estudantes e outros interessados. Ana Pizarro acaba de lançar o livro Amazônia: as vozes do rio, publicado pela Editora UFMG.

Segundo a pesquisadora, os discursos sobre a Amazônia, em geral, partem da perspectiva colonial, tratando-a como fonte de recursos para o desenvolvimento de regiões nas diversas latitudes. “É necessário possibilitar o acesso a outros discursos, os não hegemônicos e os críticos”, afirma Ana Pizarro, que leciona cultura latino-americana na Usach e atua no Instituto de Estudos Avançados da instituição.
De forma interdisciplinar, Ana Pizarro desenvolveu o trabalho a partir de literatura e dos discursos orais, obtidos em trabalho de campo. Ela revela e analisa as diferentes visões da Amazônia: a dos viajantes (os conquistadores e os naturalistas), aqueles ligados à exploração da borracha – quando começam a surgir, salienta ela, vozes alternativas – e os diversos discursos atuais: o dos intelectuais, os populares e os indígenas.

O trabalho de Ana Pizarro chama a atenção para a valorização de clichês que definem a Pan-amazônia e remetem às ideias de paraíso, reserva de vida do planeta, terra de ninguém. “Elas têm a ver com um olhar de fora que não considera os habitantes do lugar. E cria uma Amazônia que não é real, um espaço verde com indígenas”, ela comenta.

Composta por oito países, a região é habitada por 27 milhões de pessoas, e apenas três milhões de indígenas. Mas, como destaca a pesquisadora, o exotismo e o folclore ainda permeiam o imaginário sobre a região, fazendo com que muita gente ainda acredite que a aquela parte do mundo seja inteiramente habitada por índios. “Os outros grupos sociais ainda são muito ignorados. É como se uma cidade fosse caracterizada apenas por um de seus bairros.”

Problemas encobertos

Em Amazônia: as vozes do rio, Ana Pizarro ressalta ainda que o discurso que predomina hoje é o da reivindicação ecológica, e que há uma discussão teórica externa à região. “Ali dentro circula o discurso da sensibilidade ambiental vivida por seus habitantes”, ela escreve na última parte da obra, que chama de “epílogo da expedição”.

De acordo com a estudiosa, apesar de fundamental para o futuro do planeta, o discurso ecológico acaba relegando a plano secundário problemas como marginalização social, desigualdades, abusos de poder, violência, “além da apropriação simbólica, por parte das grandes potências, da Amazônia como reserva estratégica da humanidade”.

Ana Pizarro mostra a floresta também como palco de disputa de poderes e opções políticas. Guerrilheiros, narcotraficantes, paramilitares e forças armadas nacionais protagonizam a cultura da violência, marca de uma região transnacional que ocupa porções dos territórios de Bolívia, Colômbia, Suriname, Venezuela, Equador, Guiana, Peru e Brasil.

Para ela, estudar os discursos da região é conhecer as tensões originárias da cultura do continente. “Terra da promessa, espaço de renovadas utopias, a Amazônia abriga a diversidade, a multiplicidade cultural, o espaço do inacabado, do deslocamento”, afirma ainda em seu texto de conclusão. Pizarro acrescenta que esse exercício também significa colocar-se numa perspectiva que permite visualizar grandes problemas relativos ao futuro da humanidade, no atual jogo de poder internacional sobre a região. “Os discursos são uma metáfora dos grandes problemas que acompanham a história da humanidade: a desigualdade, a discriminação, a apropriação das riquezas pelo poder e o aquecimento global”, depõe a autora.