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Nº 1811 - Ano 39
11.3.2013

opiniao

Serra do Gandarela: turismo ou mineração?

*Charles de Oliveira Fonseca e **Vagner Luciano de Andrade

A Serra do Gandarela é uma das formações geomorfológicas pertencentes à área do Quadrilátero Ferrífero, localizada entre os municípios de Santa Bárbara, Rio Acima e Barão de Cocais. Destacam-se em suas paisagens a importância da água confinada em aquíferos, a formação litológica, as formas de relevo, as espécies existentes e a conexão harmônica de todos esses aspectos com as comunidades/localidades inseridas em seu entorno.

Ao observar a dinâmica do ambiente (interações geodinâmicas, formação de paisagens) e a interação e pressões dos atores sobre a região, percebe-se que a serra possui grande potencial para estudos programados extraclasse relativos a aspectos físicos e/ou sociais. Além disso, a serra também é palco de fluxo de diversos visitantes, motivados principalmente pelas múltiplas possibilidades de lazer, contemplação e pesquisa.

Todavia, nem sempre um visitante ou estudante dominam assuntos relacionados à percepção e análise da paisagem, e, muitas vezes, os elementos naturais e culturais passam despercebidos. Com isso, o entendimento do valor do patrimônio existente fica confinado ao contexto teórico dos profissionais de áreas específicas como geografia, história, ecologia e geologia, dentre outras. Nesse sentido faz-se necessária a mobilização em prol da percepção da Serra do Gandarela como uma das áreas mais importantes de Minas Gerais por salvaguardar elementos naturais e culturais de extrema relevância.

Atualmente, a região do Gandarela passa por conflitos ligados a interesses particulares da mineração que se confrontam diretamente com interesses coletivos ligados à constituição de uma área de proteção integral. Última área de mata atlântica primária em plena região do Quadrilátero Ferrífero, no entorno metropolitano, a serra tem sido alvo de disputa, cujo resultado poderá beneficiar toda uma nação, ou apenas um pequeno grupo socioeconômico. Região de paisagens únicas com atributos e características naturais e culturais inenarráveis, a Serra do Gandarela corre o risco de virar mais um grande empreendimento minerário, caso não seja transformada efetivamente em parque nacional. Dotada de imenso potencial turístico com paisagens geológicas, geomorfológicas, culturais, arqueológicas, ecológicas, sua efetivação como unidade de conservação não somente preservará uma das últimas áreas intocadas da região, como garantirá acesso à água potável de qualidade para a população da capital mineira, evitando que os atuais mananciais entrem em colapso.

Contudo, sua importância socioambiental transcende essa discussão. É necessário romper esse ciclo que associa Minas Gerais apenas à mineração: Minas é natureza, cultura, diversidade, acolhimento. Essa opção dos mineiros ficará claramente demarcada com a preservação ou destruição da Serra do Gandarela. Há um patrimônio natural (geológico, ecológico), histórico (antropológico, arqueológico) e cultural (pedagógico, científico) com um futuro a ser decidido. Quem vencerá essa luta? Qual paradigma se consolidará nas paisagens daquela região? Que sociedade nós queremos: cartesiana ou holística? Que paradigma teremos que resgatar: cartesiano ou holístico? Ecológico ou minerário? Precisaremos rever nossas concepções e modelos de desenvolvimento e reaplicá-los na direção da verdadeira sustentabilidade. E isso pode ser feito agora. Resta-nos olhar para a realidade mineira e minerária com outros olhos.

E a região tem potencial para o turismo, levando em consideração que a previsão da Embratur e da Organização Mundial do Turismo é de que o Brasil atraia 14 milhões de turistas estrangeiros em 2020, crescendo a um ritmo médio de 5,2% ao ano desde 2000. A entrada de turistas no Brasil também tende a crescer e muito em decorrência de dois eventos internacionais: a Copa do Mundo, em 2014, e os Jogos Olímpicos, em 2016. Diante dessa perspectiva favorável e considerando que Belo Horizonte sediará alguns jogos em 2014, essa relevante discussão “mineração versus turismo” não pode passar em branco.

Mas a reflexão vai além: a preservação da serra garantirá o aproveitamento turístico local gerando inclusão e renda para as comunidades e ampliando as possibilidades de visitação aos eventuais torcedores estrangeiros que aqui passarão no ano de 2014, além de se tornar ponto de atração para visitantes brasileiros e referência para os mineiros.

Do contrário, a área estará seriamente condenada a crateras, erosões, desmatamentos e outros impactos visuais significativos da mineração que, com discurso econômico de desenvolvimento, afetarão a qualidade de vida e a dignidade de milhares de moradores adjacentes a tais empreendimentos. Assim, é indispensável que a sociedade mineira se mobilize pela criação do Parque Nacional da Serra do Gandarela e mostre ao mundo em 2014 que o Brasil tem muito mais do que bola no pé: sua cultura é fascinante, a natureza, excepcional, e a hospitalidade, incomparável.

Mineiros, mobilizem-se: a Serra do Gandarela é patrimônio da sociedade e não dos mineradores.

*Turismólogo e mestrando em Geografia pelo IGC
**Geógrafo e graduando em Educação do Campo/Ciências Sociais e Humanidades pela Faculdade de Educação