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Nº 1832 - Ano 39
19.8.2013

O boom das “ômicas

Professor do ICB lança livro que descreve universo de áreas emergentes das ciências biológicas

Ana Rita Araújo

Utilizado para descrever diversos campos emergentes da biologia, o sufixo omic abrange áreas que abrem vastas possibilidades de conhecimento e podem levar a caminhos para o enfrentamento de demandas globais em biomedicina, agricultura e meio ambiente, comenta o professor Vasco Azevedo, do Departamento de Biologia Geral do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

Editor de livro sobre o tema lançado este ano em parceria com pesquisadores indianos, Azevedo afirma que o principal desafio das chamadas ciências ômicas é “minerar e organizar dados no dilúvio de informação que cresce a cada hora, para serem capazes de interpretá-los”. Ele lembra que a palavra ‘genômica’ nasceu em meados da década de 1980, junto com as primeiras tecnologias de sequenciamento de genomas. “A princípio, achava-se que bastava a genômica estrutural, ou seja, era só sequenciar o DNA. Depois é que se percebeu a importância de outras duas: a funcional, que faz o estudo do RNA e das proteínas, e a comparativa”, lembra.

Logo começaram a aparecer as primeiras derivações para as ômicas, com a transcriptômica, ou seja, sequenciamento de RNA, e a proteômica, sequenciamento de proteína. Na mesma linha, surgiram áreas de estudo como farmacogenômica, epigenômica, toxicogenômica, metabolômica e interatômica. No livro Omics: applications in biomedical, agricultural, and environmental sciences, Vasco e os coeditores indianos propõem o termo unknowwn-omics/unknowwnomics para fazer referência aos novos campos de pesquisa que, acreditam, em futuro próximo serão incorporados sob essa terminologia.

Segundo ele, com a descoberta de novas tecnologias e conhecimentos, o número de campos em omics e as suas aplicações tem aumentado rapidamente na era pós-genômica. A farmacogenômica, por exemplo, revela que determinados medicamentos – para câncer ou para doenças autoimunes – e até vacinas podem agir em um indivíduo e não em outro, já que o efeito depende da resposta imune, e seria preciso conhecer a genômica do paciente para garantir resultado satisfatório.

“Mas isso teria um preço enorme, seria economicamente inviável em grande escala”, adverte. Já a interatômica lida com a ligação que ocorre, por exemplo, entre o genoma humano e o das bactérias que habitam esse organismo. “É comum que falhas nessa interface gerem problemas, como doença inflamatória de intestino. Há estudos que sugerem que esse tipo de interação pode estar ligado a situações como diabetes e obesidade”, comenta o professor, citando também outros campos, como toxicogenômica e avaliação de poluentes ambientais, nutrigenômica e suas aplicações terapêuticas, e biomarcadores de câncer de mama para detecção precoce.

As ômicas também têm ampla aplicação na melhoria de plantas e produtos e no controle de pragas, e as grandes commodities como soja, milho e arroz já foram sequenciadas. Vasco ressalta que, através da genômica, é possível inserir genes que confiram às plantas resistência a solos ácidos ou arenosos ou desenvolver espécies capazes de transferir certos genes para que culturas de ecossistemas áridos se tornem menos dependentes de água. No entanto, a ciência ainda não conhece o real efeito no organismo humano de uma planta modificada. “É uma tecnologia extremamente poderosa, que precisa que ser testada e validada, pois podem ocorrer acidentes graves, até ambientais”, observa o pesquisador, que defende a existência de uma espécie de selo, emitido pelas universidades, para garantir a segurança de produtos transgênicos. “Sou a favor da ideia de transgênico, mas cada transgênico é um, cada evento é diferente do outro, por isso cada um precisa de certificação. E as empresas devem investir recursos para obterem um selo de certificação expedido pelas instituições públicas de pesquisa”, reitera.

Vazio coberto

Em parceria com os pesquisadores indianos Debmalya Barh e Vasudeo Zambare, Vasco Azevedo lançou o primeiro livro que traz uma visão geral da diversidade das ômicas e suas aplicações em vários campos da biologia. Os artigos foram escritos por 78 docentes e pós-doutorandos de países como Dinamarca, Austrália, Estados Unidos, Índia, Portugal, Paquistão e Brasil. Cada capítulo descreve um omic em particular e as tecnologias associadas a aplicações. Voltada sobretudo para alunos de pós-graduação e profissionais, a obra tem 26 capítulos, divididos em três partes. A primeira trata do mundo dos omics e aplicações nas ciências biomédicas, a segunda aborda aplicações em plantas e ciências da agricultura, e a última mostra o emprego nas ciências ambientais.

“É uma obra extensa, com 713 páginas, toda escrita em língua inglesa. Mas escrever livros na área de ciências biológicas é uma atividade sem retorno, em todos os sentidos”, pondera Azevedo. Ele comenta que na área biológica o CNPq não reconhece livros como atividade acadêmica. Além disso, autores e editores cederam o direito financeiro à editora. “Trata-se de um trabalho exaustivo, mas fomos estimulados pelo desejo de cobrir um vazio editorial existente na área, já que os livros disponíveis têm focado apenas em ômicas específicas ou aplicações de várias ômicas para uma área em particular”, justifica o professor.