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Nº 1844 - Ano 40
11.11.2013

Para acelerar a entrega

Em encontro na UFMG, rede de pesquisadores discute a incorporação das técnicas e processos da nanobiotecnologia em saúde ao sistema produtivo

Ana Rita Araújo

A utilização de sistemas nanocarreadores que entregam fármacos prioritariamente na região do organismo acometida pelo processo patológico já é uma realidade clínica. Contudo, ainda há desafios a vencer no uso da nanobiotecnologia em saúde, especialmente em países como o Brasil, reconhece Mônica Cristina de Oliveira, professora da Faculdade de Farmácia da UFMG e coordenadora da Rede Mineira de Pesquisas em Nanobiotecnologia (Nanobiomg). A demora entre a transferência de uma tecnologia para a indústria e a entrada do medicamento no mercado está relacionada, segundo ela, a aspectos como ausência de estruturas fabris capazes de implantar a produção desses sistemas e a falta de pessoal qualificado na indústria para trabalhar com nanotecnologia.

Nesse cenário, o papel dos grupos de pesquisa vai além do desenvolvimento e da transferência de tecnologia, pondera o vice-coordenador da rede, professor Frédéric Frézard, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG. “As indústrias nacionais não têm essa experiência, por isso a parceria universidade-empresa é ainda mais importante no processo de ampliação de escala”, ressalta. Ele defende que o pesquisador mantenha estreita parceria com a empresa que pretende desenvolver o medicamento e acrescenta que desde o desenvolvimento das formulações farmacêuticas os integrantes da Nanobiomg têm a preocupação de prever sua viabilidade na produção em larga escala. A incorporação da nanobiotecnologia ao sistema produtivo será um dos temas discutidos em simpósio que a Nanobiomg realiza no campus Pampulha de 18 a 20 de novembro, com a presença de convidados estrangeiros e de instituições brasileiras. O encontro também vai discutir avanços e desafios do emprego dos nanossistemas, especialmente no diagnóstico e na terapia de câncer e de doenças negligenciadas, assim chamadas por serem endêmicas em populações de baixa renda e despertarem pouco ou nenhum interesse das grandes empresas farmacêuticas para a produção de medicamentos e vacinas. As principais são leishmanioses, malária, febre amarela, tuberculose e chagas.

Ganhos

Os sistemas nanocarreadores conferem redução de toxicidade aos fármacos e maior eficácia às terapias, porque levam as substâncias diretamente às regiões do organismo que precisam ser tratadas, o que não ocorre nas formas tradicionais de combate ao câncer, por exemplo, nas quais os quimioterápicos circulam por todo o organismo, atuando inclusive em partes onde não há tumores.

Segundo Mônica Oliveira, atualmente há diversos sistemas que utilizam essa tecnologia, e cada grupo de pesquisa focaliza competências em áreas específicas. Em Minas Gerais, as quatro instituições que integram a Nanobiomg têm investido em projetos destinados ao preparo de produtos nanobiotecnológicos para fins de aplicação terapêutica e diagnósticos nas áreas de doenças infecciosas e parasitárias, com foco em câncer, malária, chagas, leishmaniose, aterosclerose e doenças infecciosas no gado. Além da UFMG, integram a Rede Mineira Nanobiomg, financiada pela Fapemig, a Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), a Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais (Cetec) e a Embrapa Gado de Leite.

A nanotecnologia é vista como uma das estratégias bem-sucedidas de tratamento das doenças negligenciadas, que atingem um sexto da população mundial e são combatidas com medicamentos antigos, em geral injetáveis de uso prolongado, com doses diárias e fortes efeitos colaterais. Frezard cita pesquisa segundo a qual, de 1975 a 2004, apenas 21 medicamentos foram desenvolvidos para esse grupo de doenças, o que corresponde a 1,3% da produção da indústria farmacêutica mundial no período. Um dos caminhos para ampliar o número de medicamentos disponíveis para essa classe de doenças é o chamado rejuvenescimento de fármacos já conhecidos. "A nanotecnologia representa a possibilidade de aprimorar medicamentos antigos usados em doenças negligenciadas, reduzindo, por exemplo, seus efeitos colaterais", aponta o professor.

Outras duas estratégias também são positivas, de acordo com Frezard: o reposicionamento, ou uso de um medicamento para outras patologias; e a associação de fármacos, que resulta em novas associações farmacêuticas e pode incluir sistemas nanocarreadores. “Nosso grupo tem foco no aprimoramento dos medicamentos à base de antimônio, que são os de primeira escolha para tratar a leishmaniose”, comenta. As formulações baseadas em lipossomas para o tratamento da leishmaniose visceral canina têm potencial para tratamento da leishmaniose visceral humana, destaca.

Aplicações

Para comemorar os dez anos de trabalho, a Rede promove este mês o Symposium on nanotechnology and its applications in health, que vai discutir o panorama brasileiro na área e identificar complementaridade de competências com outras redes similares, tanto no Brasil quanto no exterior, com o intuito de intensificar intercâmbio de conhecimento e partilhar o uso de infraestrutura física. “Na nanotecnologia, a multidisciplinaridade é fundamental”, ressalta Mônica Oliveira.

Entre os convidados do evento estão o professor Vladimir Torchilin, diretor do Centro de Biotecnologia Farmacêutica e Nanomedicina da Escola de Farmácia da Northeastern University (Estados Unidos), referência no preparo de sistemas nanocarreadores, e Gilles Ponchel, pesquisador do Institut Gallien Paris Sud, da Université Paris Sud.

Já o cenário de redes de pesquisa de nanotecnologia farmacêutica no Brasil será abordado em sessão específica com a presença dos professores Rubén Dario Sinisterra (UFMG), que integra a Rede CNPq/NanoFar; Ricardo Bentes de Azevedo (UnB), coordenador do INCT em Nanobiotecnologia; Robson Augusto Souza dos Santos (UFMG), coordenador do Instituto Nacional em NanoBiofarmacêutica (INCT-NanoBiofar); Valquíria Linck Bassani, da Rede Nano-Fito; e Sílvia Stanisçuaski Guterres, que integra o núcleo de coordenação da Rede de Inovação em Nanocosméticos (Sibratec). Outras sessões vão abordar a caracterização dos nanossistemas, bem como seu uso como ferramenta de diagnóstico, na terapia de câncer e no tratamento de doenças infecciosas e negligenciadas.

Mais informações na página do evento: www.symposiumnanotechnology.com.br.

A Rede

Atualmente com 42 pesquisadores, desde a sua criação, em 2002, a Nanobiomg tem se dedicado à execução conjunta de projetos de pesquisa, o que levou a geração de conhecimentos, aumento da produção científica de seus integrantes e construção racional de infraestrutura de equipamentos e material de consumo. "Ressaltam-se também a formação de recursos humanos na graduação e na pós-graduação e a aprovação de projetos conjuntos em editais de órgãos de fomento", observa a coordenadora.

Ela destaca que a consolidação da pesquisa científica desenvolvida na Nanobiomg contribuiu para que os seus membros participassem de outras redes, como a Nanobiotec/Capes, a Rede CON-Nano/Capes e os INCTs Nanobiotecnologia e Nanobiofarmacêutica. Na UFMG, inclui grupos de pesquisa das faculdades de Farmácia e Medicina e dos institutos de Ciências Biológicas e Exatas.