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Nº 1857 - Ano 40
31.03.2014


O Rio de Janeiro continua sendo?

Tese defendida na Face analisa declínio da capital fluminense e possível recuperação do seu protagonismo

Ewerton Martins Ribeiro

O Rio de Janeiro foi o principal centro urbano por um longo período da história do Brasil – da chegada de Dom João VI, em 1808, até meados do século passado. Porém, com a ascensão de São Paulo como motor da economia nacional na primeira metade do século passado e com a transferência da capital para a recém-inaugurada Brasília na segunda metade, esse cenário mudou drasticamente. A cidade sofreu um dos mais significativos processos de declínio político e econômico do sistema hierárquico urbano brasileiro, em um esvaziamento econômico talvez só comparável ao registrado no Nordeste no século 18 (com a decadência da monocultura e o início do ciclo do ouro no Sudeste) ou o declínio da região Norte no início do século 20 (resultado do fim do ciclo da borracha).

Por outro lado, uma série de acontecimentos recentes pode estar representando um ponto de inflexão nesse declínio. O Rio de Janeiro caminha para uma recuperação de seu protagonismo? Essa é uma das questões que a tese Formação, declínio e inflexão: reflexões sobre a centralidade da cidade do Rio de Janeiro, defendida recentemente por Bruno Martins Hermann na Faculdade de Ciências Econômicas, busca responder.

O pesquisador faz uma profunda abordagem do processo de formação dessa centralidade política, econômica e cultural e analisa como um círculo vicioso de esvaziamento acaba promovendo o declínio dessa centralidade. “Após a transferência do setor público federal para Brasília, o Rio tornou-se vulnerável ao efeito polarizador de São Paulo em relação ao seu setor privado, perdendo vantagem competitiva principalmente em relação às suas atividades centrais”, diz Hermann.

Ele também aponta como fatores a perda de participação do Rio de Janeiro na indústria do país sem que, em contrapartida, houvesse uma apropriação das atividades de gestão e comando e de serviços especializados. “Todos esses fatores repercutiram num progressivo esvaziamento daquelas funções responsáveis pelos seus chamados ‘anos dourados’ do Rio”, diz o autor, que foi orientado pelo professor Clélio Campolina, ex-reitor da UFMG e novo ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação.

Evidências

As primeiras menções a uma possível reversão da tendência de esvaziamento econômico do Rio de Janeiro surgiram nos anos 1990, diante de evidências que apontavam para a interrupção no processo de perda de participação da economia fluminense no cenário nacional – especialmente por conta da expansão da produção petrolífera na bacia de Campos. Mas é só no século 21, e especialmente na segunda década, que os principais vetores dessa mudança começam a despontar com mais clareza. “Para confirmar a existência desse ponto de inflexão, o mais adequado é observarmos a carteira de investimentos anunciados para o estado e as projeções de atividade econômica baseadas nesses investimentos”, explica Hermann.

O estudo compreendeu pesquisa qualitativa por meio de entrevistas em profundidade com agentes do setor público e privado. Foram ouvidos 24 profissionais, entre líderes empresariais e gestores públicos de alto escalão. Essa pesquisa, somada à revisão bibliográfica abordada, aponta o desenvolvimento do setor de óleo e gás e seus efeitos sobre toda a cadeia produtiva como o principal desses vetores.

Na sequência, destacam-se aspectos como a melhoria na gestão pública, a queda nos índices de violência a partir de meados dos anos 2000, os grandes eventos que vêm sendo realizados e os que estão previstos para o estado (e sua consequente influência na ampliação da visibilidade internacional do Rio), os investimentos na indústria de transformação e infraestrutura, as vantagens logísticas recuperadas nos últimos anos, o desenvolvimento de setores como o de comunicações, especialmente do campo da produção audiovisual, entre outros.

Em contrapartida, Hermann pondera que essa recuperação, ainda que promissora, não está totalmente garantida. “Trata-se de um cenário muito recente. Há riscos envolvendo a política macroeconômica e industrial atual, notadamente a mudança advinda com o novo marco regulatório para a exploração petrolífera no Brasil. Também há sérias deficiências sociais: baixa qualidade da educação pública, desigualdade e índice de pobreza extremamente pronunciados na Região Metropolitana do Rio”, argumenta o recém-doutor.

Tese: Formação, declínio e inflexão: reflexões sobre a centralidade da cidade do Rio de Janeiro
Autor: Bruno Martins Hermann
Defesa: 21 de fevereiro de 2014 junto ao Programa de Pós-graduação em Economia do Cedeplar/Face
Orientador: Clélio Campolina Diniz