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Nº 1857 - Ano 40
31.03.2014

Investindo na subjetividade

Livro reúne reflexões sobre a construção da opinião na mídia e questiona a pretensa imparcialidade do discurso jornalístico

Ewerton Martins Ribeiro

Em muitos espaços de reflexão ainda é relevante a noção de neutralidade e imparcialidade do discurso jornalístico praticado em matérias e reportagens. Por essa corrente, a opinião ficaria relegada a editoriais e espaços oferecidos a articulistas. Por outro lado, já há algum tempo ganha força a ideia de que é impossível qualquer discurso escapar, por completo, do viés ideológico e do interesse em influenciar – e, por conseguinte, de ser, em alguma medida, opinião.

Na esteira desse embate, o livro A construção da opinião na mídia lança luz sobre a presença e as fronteiras da opinião no discurso midiático – e delimita como se dá a sua estruturação. Organizada por Wander Emediato, professor da Faculdade de Letras (Fale), a coletânea reúne artigos de 17 pensadores da UFMG, de outras universidades brasileiras e também de escolas de França e Suíça, tradicionais ambientes de reflexão em análise do discurso.

Na orelha da obra, Simone Mendes, pesquisadora do Programa Nacional de Pós-doutorado da Capes (PNPD) e autora do capítulo Opinião, argumentação e literatura: um estudo do cordel midiatizado, conta que a obra é o resultado de algumas discussões que finalmente vêm sendo consolidadas no Núcleo de Análise do Discurso (NAD) da Fale. “O livro apresenta um retrato ampliado do mecanismo de produção da informação como produto do trabalho jornalístico de gestão de opiniões”, diz.

A pesquisadora vê o espaço midiático como um universo tentacular e sustenta que um ponto de convergência dos estudos compreendidos na obra é a ideia de que a problemática da construção da opinião no discurso midiático passa por um ponto central: o investimento subjetivo do jornalista quando de sua escrita. Wander Emediato corrobora essa percepção no prefácio do livro: “É ingenuidade pensar que a objetividade e a imparcialidade jornalística ainda sejam um ideal da mídia contemporânea. Assim como não há nenhum discurso sem subjetividade, não se poderia igualmente cobrar da informação jornalística que ela fosse um discurso sem sujeito e sem intenções”.

Jornalismo-espetáculo

Ainda que qualquer discurso tenha viés intencional, Emediato aponta um deslocamento do fazer jornalístico no decorrer dos anos no que diz respeito à função que exerce na sociedade. “Estamos bem longe dos tempos em que o jornalista era visto como espécie de herói disposto a defender os ideais de uma sociedade aberta, democrática e justa.” Nesse deslocamento, sugere Emediato, a informação, que antes era, em tese, reportada, passa então a ser fabricada, controlada e posta em circulação por grandes corporações nacionais e internacionais em um “processo de encenação, dramatização e perspectivização que confunde”. Escreve o organizador: “A informação midiática é agora produto de um sistema fenomenal e global de produção de notícias”. Dito de outra forma: a informação jornalística se tornou o espetáculo da vida cotidiana.

O volume conta com 15 capítulos e tem mais de 400 páginas. Desde A construção de uma visão do outro a partir da leitura de fotografias jornalísticas (Janaína Barcelos) até a análise das relações entre Informação jornalística, publicidade e propaganda (Shirlei Maria Freitas de Mello e Wander Emediato), a obra reúne abordagens que traçam amplo panorama de como se dá A construção da opinião na mídia em suas diversas possibilidades. Os artigos expõem análises de casos e se aprofundam em subtemas, como as entrevistas, a imprensa popular, os argumentos ditos e os silenciados em determinados tipos de reportagens, e chegam a tratar de temas muito específicos, como no caso do capítulo Opinião no jornalismo religioso: uso de dogmas e falácias como estratégia argumentativa (Eduardo Assunção Franco).