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Nº 1858 - Ano 40
07.04.2014

Para controlar a febre

Escola de Veterinária estrutura comissão para combater a febre maculosa por meio do monitoramento de seu vetor e dos hospedeiros, entre os quais as capivaras

Teresa Sanches

Carrapato-estrela, carrapato-de-cavalo, rodoleiro, micuim ou vermelhinho. Não importa como é chamado popularmente, mas o fato é que, em qualquer fase de seu desenvolvimento – ninfa, larva ou adulto –, a picada do A.cajennense pode levar pessoas à morte, caso estejam infectadas com a bactéria Rickettsia rickettsii. Sete a 14 dias depois aparecem os primeiros sinais, inespecíficos, como febre súbita, dor de cabeça, mal-estar, manchas vermelhas ou máculas no corpo.

Sintomas que se confundem com os de doenças muito comuns, como dengue ou leptospirose. Trata-se, no entanto, da febre maculosa, transmitida pelo carrapato do gênero Amblyomma, classificada pelo sistema de saúde como uma das febres hemorrágicas de alta letalidade. Com a verticalização das cidades e a procura intensa por áreas verdes e livres, como os parques, o risco de contaminação aumenta também para a população urbana. “Áreas como a região da Pampulha, onde o ambiente é compartilhado por pessoas, animais silvestres e domésticos, tornam-se ambientes propícios para a contaminação”, explica a professora Danielle Ferreira de Magalhães Soares, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Escola de Veterinária.

Com o objetivo de levar esclarecimentos à população e contribuir com órgãos executores no planejamento de ações para o controle da doença, a Escola de Veterinária da UFMG propôs a criação de comissão interinstitucional da febre maculosa, idealizada pela própria Danielle Soares e pelos professores Pedro Lucio Pereira e Leonardo Boscoli Lara. A comissão surgiu no âmbito do grupo de estudos Ecoas-Epidemiologia, que tem como foco a interface saúde humana-saúde pública-animais silvestres. “O problema da febre maculosa precisava ser melhor monitorado na capital com pontos de apoio conjuntos, para que as ações sejam eficazes e duradouras”, afirma Danielle Soares.

Proliferação

De acordo com a professora, o carrapato, que é o vetor da doença, tem como hospedeiros animais silvestres, como as capivaras, e os domésticos, a exemplo de cavalos e cães. Ele passa o maior tempo da vida no ambiente e procura os animais ou o homem para se alimentar. A estação seca é o período de maior contaminação e risco de proliferação, com grande número de larvas e ninfas. “É a época ideal para o controle, exigindo menos quantidade de produto químico, com menos riscos para os animais e maior eficácia contra os carrapatos”, explica Danielle Soares.

Por isso, o controle dos carrapatos deve acontecer conjuntamente nas hípicas, nos haras, nos cães das residências e nos que circulam na região da Pampulha e nas capivaras. “Não adianta, por exemplo, controlar apenas as capivaras, ou os donos dos haras fazerem o controle hoje e a Prefeitura monitorar os cavalos dos carroceiros só daqui a um mês. Se tiramos um hospedeiro, o carrapato busca outro, que pode ser o próprio homem”, alerta.

Algumas áreas consideradas de risco, como a região da Pampulha, já estão sendo monitoradas, de acordo com a professora da UFMG. “Mas ainda sem trabalhos conclusivos que mostrem o risco real de serem frequentadas”, ela observa.

“As capivaras são consideradas amplificadoras da doença. Elas podem ter a infecção e transmitir a bactéria ao carrapato em duas ou três semanas, sem manifestarem sinal clínico, o que mantém um nicho ecológico. Por isso, estudar o manejo das capivaras também se faz necessário, uma vez que esses animais não têm predadores naturais na região e sua população pode crescer ainda mais”, avalia Danielle Soares.

A população das capivaras na orla da Pampulha ainda é desconhecida e exige, além da quantificação, sua microchipagem. “Temos que considerar também que a lagoa se comunica com vários córregos, onde podem existir outros bandos. Por isso a necessidade do manejo, que precisa ser integrado, reforçando sempre que o foco é o controle dos carrapatos e da febre maculosa”, conclui.

Segundo Bruna Tourinho, da Secretaria de Saúde de Minas ­Gerais e referência técnica do Programa Nacional de Vigilância da Febre Maculosa no estado, a bactéria foi identificada em Minas no início do século 19, e já é considerada endêmica em alguns municípios, como Diamantina, Manhumirim e Juiz de Fora. Mas a grande dificuldade, observa Bruna, “é que diante dos sintomas inespecíficos o sistema de saúde é falho na rapidez do diagnóstico”. Segundo ela, os exames laboratoriais precisam ser repetidos no intervalo de 14 a 20 dias. “Mas o tratamento por antibióticos não deve aguardar esse período, pois pode ser tarde demais”, alerta. Participam da comissão representantes do Ibama e do IEF, gestores da fauna silvestre, da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), que coordena o trânsito de carroceiros na capital, e a Funed, responsável pelo diagnóstico da doença em humanos, e secretarias de Estado de Saúde e Educação.