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Nº 1864 - Ano 40
19.05.2014

Luz, quero luz

Grupo da Escola de Belas-Artes trabalha pela preservação do saber associado aos processos fotográficos de base química

Hugo Rocha

Explorar métodos tradicionais e alternativos de fotografia. ­Resgatar o conhecimento construído durante séculos por meio dos processos fotográficos de base química e não permitir que ele se perca. Em tempos de protagonismo da fotografia digital, essa é uma das motivações do professor Adolfo Cifuentes, do Departamento de Teatro, Fotografia e Cinema da Escola de Belas-Artes. Ele é um dos idealizadores do grupo de pesquisa Al-química, criado no fim do ano passado por professores, funcionários e alunos da Escola de Belas-Artes.

Com o rápido avanço da técnica digital, a fotografia química perdeu adeptos. O termo “fotografia analógica”, usado comumente para descrever a modalidade de base química não é exato, na visão do professor: “Hoje é muito comum se falar do analógico em oposição ao digital. Eu não vejo sentido nisso. O termo analógico não especifica nada, é muito genérico”. Segundo o pesquisador, o que diferencia a fotografia tradicional da digital são os processos físico-químicos que as constituem. “O que define a fotografia tradicional é a base química, que tornou possível a invenção da fotografia ainda no século 19”, explica.

Cifuentes acredita que a fotografia química não vai desaparecer nunca, por ser a base de todas as atualizações e adaptações que a técnica sofreu ao longo dos séculos, dando origem, inclusive, ao formato digital hoje amplamente difundido. “O que se precisa para ter uma fotografia? Bastam um ambiente escuro onde se possa controlar a passagem da luz e um suporte que permita guardar a ‘memória’ dessa luz: o filme na fotografia química e o sensor nas câmaras digitais”, sintetiza. Houve um momento em que a migração do processo químico para o digital tornou-se obrigatória, mas a fotografia, garante Cifuentes, continua a mesma: “É um trabalho em que é preciso saber coordenar e controlar a luz”. O que mudou, de acordo com o pesquisador, é basicamente o suporte. “O fotógrafo continua sendo um pescador de luz”.

Magia em sua mínima expressão

A busca pela preservação do conhecimento relativo aos processos fotográficos de base química levou à formação do grupo Al-química. Com o objetivo de compartilhar a produção e desenvolver atividades de pesquisa e extensão, o grupo também conta com a participação de ex-alunos e pesquisadores, além de fotógrafos da comunidade externa.

O primeiro trabalho desenvolvido pelo Al-química – apresentado em exposição na Escola de Belas-Artes, durante os meses de abril e maio – foi feito por meio da câmara estenopeica, a popular pinhole, formada por uma câmara escura e um pequeno orifício para a entrada de luz. A pinhole foi escolhida justamente por representar um princípio básico diretamente ligado aos aspectos físico-químicos da fotografia tradicional. Além disso, a ausência de um visor aumenta a responsabilidade do fotógrafo na hora de tomar decisões que vão resultar na produção da imagem. “A pinhole é a fotografia reduzida à sua mínima expressão e possui toda a magia que está na base do processo fotográfico”, explica Cifuentes.

De acordo com o professor, os árabes já conheciam esse principio da câmera obscura desde o século 10. O que faltava era um suporte que pudesse guardar a “memória dessa luz” e da imagem formada por ela. Cifuentes lembra que a fotografia química envolve dois séculos de pesquisa, mobilizando empresas como Kodak, Ilford e Fuji, que se dedicaram ao estudo desses processos por meio da produção de filmes fotográficos, além do desenvolvimento de equipamentos e técnicas de revelação e ampliação. Essas corporações também tiveram que se adaptar aos processos digitais. “O grupo Al-química está focado em não deixar que todo esse saber desapareça”, conclui Cifuentes.