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Nº 1873 - Ano 40
25.08.2014

Do que morrem os jovens mineiros

Pesquisa da Enfermagem elabora perfil das causas de óbito de crianças e adolescentes no estado

Luana Macieira

Acidentes e violência representam 53% dos óbitos de crianças e adolescentes com até 19 anos em Minas Gerais. Entender como ocorrem essas mortes para propor medidas que as previnam foi o objetivo da dissertação Mortes por acidentes e violência em crianças e adolescentes de Minas Gerais: um enfoque sobre a natureza da lesão, defendida no Programa de Pós-graduação da Escola de Enfermagem da UFMG.

Por meio de análise de dados extraídos do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM Datasus), a pesquisadora Helena Serpa Passos Romero montou tabelas e gráficos que explicitam como ocorreram as mortes de 10.667 crianças e adolescentes em 853 municípios mineiros, de 2005 e 2010.

A pesquisadora e enfermeira da saúde da família no município de Betim distribuiu as crianças e adolescentes em cinco grupos: bebês com menos de um ano de idade, crianças de um a quatro anos, de cinco a nove anos, de 10 a 14 anos e de 15 a 19 anos. Em relação aos acidentes, foram considerados aqueles ocorridos dentro e fora de casa, como os domésticos e os de trânsito. Os casos de violência envolvem agressões, brigas e maus-tratos, que também podem ocorrem dentro e fora do lar.

As análises dos dados possibilitaram várias constatações: “No grupo de crianças com até nove anos estão concentrados os acidentes. Os adolescentes de 10 a 19 anos são vítimas sobretudo de agressões. Além disso, percebemos que grande parte dos acidentes com as crianças ocorre nos domicílios, sendo o afogamento a causa de morte mais frequente”, exemplifica Helena Serpa.

Para entender como ocorreram as mortes, o estudo observou, ainda, outras características relacionadas aos óbitos, como o grau de urbanização do município onde foram registrados, a idade da mãe e a raça/cor da criança ou adolescente. Duas das perguntas a que o trabalho buscou responder foram se o processo de urbanização aumentava o número de mortes causadas por acidentes ou por violência e como a raça das crianças e adolescentes aparecia nos bancos de dados.

Com relação à urbanização e à raça, as análises mostraram que, no caso dos adolescentes (entre 10 e 19 anos), quase 90% dos ­óbitos eram de negros e pardos. Além disso, os acidentes de trânsito ocorreram em maior número em municípios médios ou pequenos, com até 100 mil habitantes, o que surpreendeu a pesquisadora. “Associamos esse dado ao fato de que há menos sinalização e fiscalização nessas cidades, além da má conservação das estradas. Nas cidades pequenas, as pessoas trocaram os cavalos pelas motos, mas, muitas vezes, não têm habilitação para conduzir veículos”, explica.

A pesquisa conclui que, entre bebês com menos de um ano, a maior causa de mortes está relacionada à asfixia, que pode ocorrer por ingestão de alimentos ou penetração de corpo estranho nas vias aéreas das crianças. Em segundo lugar estão os acidentes de transporte que resultaram em traumatismos intracranianos, de tórax e abdome, além de hemorragias, normalmente verificadas quando o bebê não é transportado com segurança – sem a cadeirinha no banco de trás do veículo. “Um dado muito preocupante sobre os óbitos dos bebês com menos de um ano diz respeito à terceira maior causa de mortes, que são as agressões. Eles sofrem espancamentos, maus-tratos e negligência”, diz a enfermeira. Entre as crianças de um a nove anos, os acidentes de transporte e atropelamentos são a primeira causa de morte, seguidos pelos afogamentos. Já nos jovens entre 10 e 19 anos, as agressões ocupam a primeira posição, e os acidentes de transporte, a segunda.

Prevenção

Segundo Helena Serpa, muitas das mortes analisadas poderiam ser evitadas com medidas simples, que começam dentro de casa. “Em bebês com menos de um ano, as asfixias podem ser evitadas se eles forem mantidos no berço. Os pais podem, involuntariamente, sufocar com o braço as crianças que dormem em sua cama”, exemplifica a pesquisadora, que considera viável evitar esse tipo de morte com um trabalho já no pré-natal.

Além das ações de saúde, Helena Serpa também defende intervenção maior do Estado em relação ao cuidado com as crianças. “Os governos precisam, por exemplo, fornecer mais vagas nas creches públicas para que elas recebam atenção especializada enquanto os pais trabalham. Afogamentos e acidentes domésticos poderiam ser evitados se as crianças mais novas não ficassem sob os cuidados de irmãos mais velhos ou de pessoas pouco preparadas”, argumenta.

No caso dos adolescentes, grupo que mais sofre violência, a pesquisadora acredita que mortes poderiam ser evitadas se houvesse trabalho preventivo nas periferias, onde se concentra a maioria dos óbitos. “Se a base dos veículos do Samu ficasse mais perto desses locais, mais jovens conseguiriam ser atendidos mais rapidamente”, exemplifica a mestre.

Dissertação: Mortes por acidentes e violência em crianças e adolescentes de Minas Gerais: um enfoque sobre a natureza da lesão
Autora: Helena Serpa Passos Romero
Orientadora: Edna Maria Rezende
Defendida no Programa de Pós-graduação da Escola de Enfermagem da UFMG, em 2013