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Nº 1877 - Ano 40
22.09.2014

Sensíveis às ‘tenebrosas transações’

Pesquisador do DCP ganha prêmio internacional com trabalho sobre percepção da corrupção

Ewerton Martins Ribeiro

Pessoas que se posicionam à esquerda no espectro ideológico são mais sensíveis ao fenômeno da corrupção do que aquelas que se alinham à direita. Essa é uma das conclusões do trabalho Corrupção e indicadores de percepção: variações sob o efeito dos meios de comunicação e comportamento político, de Pedro Soares Fraiha, mestrando do Programa de Pós-graduação em Ciência Política da UFMG e membro do Grupo de Pesquisa Opinião Pública, Marketing Político e Comportamento Eleitoral.

O trabalho pretende identificar se a percepção da corrupção está sujeita à influência de fatores da cultura política, dos perfis socioeconômicos e da exposição ao conteúdo midiático. “De modo análogo, quis compreender possíveis lacunas e extensões imprecisas dos indicadores de percepção da corrupção”, diz Pedro Fraiha, que com o seu trabalho venceu o Prêmio Internacional Marcus Figueiredo, concedido durante o 6º Congresso Latino-americano de Opinião Pública da Wapor (World Association for Public Opinion Research), realizado em junho, no Chile.

O estudo, realizado por meio de parceria entre o Opinião Pública e o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), envolveu survey com 803 moradores de Belo Horizonte. O levantamento revela que o índice de percepção da corrupção não está necessariamente relacionado – tampouco é sempre diretamente proporcional – à recorrência de práticas corruptas. “Essa percepção é influenciada por aspectos internos e externos aos indivíduos. Características particulares como escolaridade, idade, ocupação, exposição à mídia e variáveis de cultura política podem alterar a forma como o indivíduo percebe a corrupção”, diz o pesquisador. A mensuração da percepção de práticas corruptas teve como principal referência o Índice de Percepção da Corrupção (IPCorr), indicador estabelecido pela agência não governamental Transparência Internacional (TI).

Variáveis

Na pesquisa, foi perguntado aos entrevistados, de maneira direta e apenas com as alternativas “sim” e “não”, se eles percebem que a corrupção está presente em Belo Horizonte. Quanto aos perfis dos entrevistados, foram observadas variáveis relacionadas a fatores econômicos, políticos e sociais, como escolaridade, ocupação profissional, interesse por política, autoposicionamento ideológico, avaliação da situação econômica, confiança na mídia, confiança nas instituições e frequência com que se informa sobre política pela televisão, rádio, jornais, revistas, internet.

Os resultados da investigação corroboram concepções prévias comuns sobre o tema da corrupção. Os cidadãos que trabalham no serviço público, por exemplo, percebem mais a corrupção do que os que trabalham em empresas privadas. “Considerando que a definição mais usual da corrupção exprime a ideia de que o fenômeno é a própria apropriação de um bem público para fins privados, é de se esperar que os funcionários públicos estejam mais expostos a situações cotidianas em que prevalece a prática de corrupção”, afirma o cientista político. Pessoas mais jovens, escolarizadas e residentes em áreas urbanas também tendem a observar mais a corrupção. “Todas as estimativas de escolaridade são estatisticamente significantes. Aqueles que cursaram ou cursam ensino superior ou pós-graduação, por exemplo, possuem 55% a mais de chance de perceber a corrupção, se comparados aos com outros graus de escolaridade”, salienta Pedro Fraiha.

Juízo moral

O estudo destaca ainda a exposição midiática dos indivíduos a informações sobre casos e escândalos de corrupção, assim como sua difusão em redes de socialização. Com efeito, o entendimento é de que os que têm os meios de comunicação em alta conta de credibilidade tendem a apresentar forte percepção da corrupção – que pode até ser desproporcional à realidade.

Segundo Pedro Fraiha, a visibilidade e a vinculação de conteúdos na mídia têm impacto na formação da opinião pública, e o tema da corrupção carrega consigo um juízo moral muito forte. “Os conteúdos veiculados podem gerar efeitos sobre a percepção na medida em que constroem imagens que agregam valor aos atores da representação política e às instituições”, afirma o autor. Nesse sentido, uma hipótese levantada pelo trabalho, e ainda não testada, sugere que a abordagem feita pela mídia faz a percepção do fenômeno superar a percepção de outros problemas sociais. “A alta exposição do assunto pode gerar proporções e dimensões que extrapolem relações causais, sobrepondo-se assim a problemas mais ou tão significativos”, diz o pesquisador, ao indicar nova frente de investigação.

Percepção e relevância

Em pesquisa de opinião realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em dezembro de 2012, os participantes chegaram a citar a corrupção como mais relevante que problemas como desemprego, educação, pobreza e desigualdade.

Além disso, Pedro Fraiha afirma que diferentes grupos socioeconômicos costumam se distinguir em suas demandas políticas. “É possível que indivíduos de estratos econômicos mais altos demandem prioritariamente o combate à corrupção, enquanto os mais pobres exijam políticas orientadas a aspectos relacionados a necessidades mais urgentes, como emprego, segurança e habitação”, completa o pesquisador do DCP.