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Nº 1909 - Ano 41
22.06.2015

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Atalhos do raciocínio

Aluno do Coltec será um dos seis representantes do Brasil em competição mundial de matemática, na Tailândia

Itamar Rigueira Jr.

Foca Lisboa
João César: estudo conciliado com namoro e lazer
João César: estudo, namoro e lazer

Duas provas em dois dias, cada uma delas com quatro horas e meia de duração. Não, ainda não se trata do Enem ou de algum outro vestibular. Essas provas são compostas de três problemas, cada, e vão ser feitas longe, muito longe daqui. Um dos seis representantes do Brasil, João César Campos Vargas, 17 anos, aluno do segundo ano do Colégio Técnico da UFMG (Coltec), se prepara para participar da Olimpíada Internacional de Matemática (IMO, na sigla em inglês). A competição será em julho, na cidade tailandesa de Chiang Mai.

Embora nunca tenha feito uma viagem tão longa, João César está longe de ser um neófito em competições internacionais. Nos dois últimos anos, ganhou medalhas de prata nas Olimpíadas da Lusofonia, em Moçambique, e do Cone Sul, no Uruguai. Em 2014, venceu a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) e ficou em oitavo lugar na OBM, que inclui as instituições particulares. Foram esses resultados que lhe abriram as portas para os testes de seleção que carimbaram seu passaporte para a Tailândia.

João percorre o Brasil desde bem mais jovem, não apenas para os certames nacionais, mas também em temporadas de preparação com mestres que podem vir até do icônico Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. Agora mesmo está em São Paulo, para 15 dias de treinamento visando às provas na Ásia.

O professor Airton Carrião Machado, do Coltec, explica que as questões propostas em provas como a de julho próximo exigem conhecimentos que extrapolam os da educação básica – e muito raciocínio. “Estudantes como o João César assimilam com facilidade técnicas novas e as aplicam em diversas questões. Encontram caminhos mais simples para soluções que poderiam dar muito trabalho. E podem mesmo mostrar esses atalhos para nós, professores”, diz.

Criança de ouro

Tudo começou quando João César ainda cursava os primeiros anos do ensino fundamental em Passa Tempo (MG), onde nasceu, e entrou em contato com provas de olimpíadas de matemática levadas para casa pela mãe, Helena, professora de História em escola pública. “Ele sempre teve raciocínio lógico apurado e, como conseguia resolver os problemas, tomou ainda mais gosto”, conta Helena. João começou a participar da OBMEP no terceiro ano e, no sexto, já faturou a medalha de ouro. Dois anos depois, iniciou a preparação internacional. Chegou ao Coltec no ano passado e logo tirou outro primeiro lugar, concorrendo com alunos da escola que já haviam ganhado prêmios importantes.

Helena ressalta a dedicação e a independência do jovem, acostumado às viagens e aos compromissos com equações complexas, mas admite as saudades do filho, que chega a ficar um mês sem poder voltar a Passa Tempo para ver os pais e o irmão mais velho. “Respeitamos sua vocação e seu sonho”, diz a mãe, lembrando que João César sempre lidou tranquilamente com o talento especial e a rotina incomum. Na escola, o comportamento do rapaz também agrada: ele não faz pressão para elevar o nível das aulas, quase sempre aquém do que já conhece, como destaca o professor Carrião.

Discreto, mas sorridente e bem-humorado, João César transparece segurança, sem qualquer afetação. E leva uma vida normal, com muito estudo, mas com tempo para a namorada Alice, que cursa Licensiatura em Teatro na UFMG, para um filme ou série de TV, de vez em quando, e para o futebol, apenas como lazer. Diz que passou a gostar muito de matemática “quando quis gostar” e resolveu encará-la com seriedade. E que aprendeu cedo a estudar sozinho.

João revela fascínio por astronomia, mas garante que ainda não sabe por qual caminho da matemática vai enveredar – e talvez por isso não se espelhe em um cientista em particular. “Admiro os caras que têm ideias novas”, enfatiza o estudante. Apesar de não ter decidido em que área vai se aprofundar, ele vislumbra estudos em uma instituição como o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa) e escolas no exterior. “É importante ter contato com abordagens diferentes da matemática”, afirma o jovem, que, por ora, está concentrado na jornada de julho, quando tentará resolver seis ­problemas do outro lado do mundo.