‘Foi como ganhar o Oscar’, diz vencedor do Prêmio José Reis

Reinaldo José Lopes durante conferência na Reunião da SBPC. Foto: Cláudia Mariz / CNPq

[*Coordenação de Comunicação Social do CNPq]

Agraciado com o Prêmio José Reis de Divulgação Científica, do CNPq, o jornalista Reinaldo José Lopes, disse, em conferência na 69ª Reunião Anual da SBPC, que vencer o prêmio foi como ganhar um Oscar. Ele trabalhou no jornal Folha de S.Paulo, onde manteve uma coluna de ciência, e lamenta que a área esteja perdendo espaço na cobertura da grande mídia, apesar de ser um assunto de grande interesse.

“Grandes jornais não têm hoje uma equipe específica para escrever sobre ciência”, disse. “E eu acho que o jornalismo científico é uma das melhores, se não a melhor, maneira de fazer jornalismo, por sua amplitude e profundidade”.

Reinaldo José Lopes concedeu a seguinte entrevista à reportagem do CNPq, na qual falou sobre a importância do Prêmio José Reis de Jornalismo, o único voltado no Brasil para o reconhecimento de esforços na área de divulgação científica, sobre a formação dos profissionais para escrever sobre ciência e sobre a ausência no Brasil de cientistas que também sejam intelectuais públicos.

Qual a importância de conquistar o Prêmio José Reis de Divulgação Científica?

Foi como ganhar o Oscar. Falo meio brincando, mas tem um fundo de verdade. Para quem trabalha na área no Brasil, o José Reis é o padrão-ouro do reconhecimento, até porque ele é o único prêmio nacional voltado exclusivamente pra divulgação científica, por premiar jornalistas apenas de três em três anos e por avaliar o conjunto do trabalho do profissional, não algo específico e pontual. Por tudo isso, é uma alegria imensa e uma grande responsabilidade.

Como você vê iniciativas como essa para estimular a divulgação e jornalismo científicos?

O que desanima um pouco é saber que iniciativas desse tipo são raríssimas no Brasil – o José Reis é mesmo único.

Sua trajetória no jornalismo sempre foi na área de ciência?

Praticamente, com alguns desvios de trajetória interessantes. Meu primeiro emprego na grande imprensa (fora um estágio no Primeira Página, o jornal da minha cidade natal, São Carlos) foi uma cobertura de férias na editoria de Ciência da Folha, quando já me apaixonei de cara pela área. Foi na semana do 11 de setembro de 2001, e eu ajudei a fazer o infográfico com a explicação de ciência dos materiais sobre a queda das Torres Gêmeas. Em seguida, fui cobrir a licença de um colega em Veículos, o caderno sobre automóveis da Folha, hoje extinto, durante três meses, e foi um pesadelo, porque não entendo nada de carro. Depois, consegui voltar para Ciência, cobrindo o ano sabático do meu mentor Marcelo Leite, e aí não parei mais.

Mas, curiosamente, desde que fui para o G1, em 2006, e depois do meu retorno à Folha, tenho combinado a cobertura de ciência com a cobertura de religião, em especial nos aspectos históricos e arqueológicos e na análise do Vaticano e das tendências do catolicismo (em parte porque sou católico e me interesso pessoalmente pelo tema). Acho salutar promover o diálogo entre as duas áreas, então tem sido uma experiência ótima, apesar de ter de lidar com fundamentalistas de ambos os lados de vez em quando.

Como anda o jornalismo científico no país? Temos formação adequada para isso? O que podemos melhorar?

A nossa situação é paradoxal. Nunca tivemos tanta gente com boa formação, experiência e tarimba pra trabalhar na área quanto hoje. Além disso, quem não tem formação universitária em jornalismo, mas nas áreas de ciências biológicas e exatas, está se interessando cada vez mais pelo ramo e dando contribuições importantes, às vezes de modo mais informal, em veículos como blogs e o YouTube. O problema é que em crises econômicas como a atual o investimento em jornalismo científico é o primeiro a ser cortado. Acho isso de uma miopia tremenda, inclusive do ponto de vista da audiência – os dados da internet mostram que o público mais jovem tem grande interesse pelos temas científicos. É preciso reverter essa tendência o quanto antes, ou vamos desperdiçar muito potencial.

Você acha que a imprensa e os meios de divulgação em geral podem contribuir para a percepção da sociedade da importância da ciência para um país. Estamos falhando nesse propósito?

Definitivamente, sim, ao menos como possibilidade. É claro que a gente não vai conseguir ensinar ciência do zero. Esse é um papel que vai continuar sendo da escola, da educação pública e privada. Mas a gente poderia fazer muito mais para ajudar o público a entender o método científico e a importância que ele tem na vida de uma sociedade moderna. E, sim, infelizmente temos falhado coletivamente pelos motivos que mencionei na pergunta anterior: falta investimento, falta uma visão estratégica, acho que falta conhecimento básico sobre ciência mesmo entre muitos tomadores de decisão do jornalismo. A Folha, graças a Deus, é uma exceção, por uma postura histórica quase iluminista, eu diria, do jornal, mas a gente precisa fazer muito mais do que tem feito.

Como estimular o interesse da sociedade pela ciência?

É difícil saber por onde começar, porque o problema é multifacetado, e as nossas carências como sociedade, em especial do ponto de vista educacional, são profundas. Além de um ensino de ciências que seja estimulante com infraestrutura decente (de laboratórios, por exemplo), e de um jornalismo científico muito mais presente, crítico e estimulante, eu acho que precisamos de cientistas que sejam intelectuais públicos. Cadê o nosso Carl Sagan, o nosso Dawkins (fora a parte do ateísmo), o nosso Neil DeGrasse Tyson? Quando pedem pras pessoas citarem um grande cientista brasileiro, elas só lembram do Santos Dumont, isso quando lembram. A ciência brasileira precisa dar mais a cara a tapa e entrar de forma mais compreensível e combativa nas grandes questões do país.

*Este espaço é aberto a colaborações jornalísticas produzidas por instituições que participam da 69ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)