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Nº 1429 - Ano 30 - 11.3.2004

/Marcos Borato

“A crise não é de gestão”

Maurício Guilherme Silva Jr.

m entrevista ao BOLETIM, o vice-reitor Marcos Borato analisa esta que talvez seja a maior crise financeira já vivida pelas universidades federais e os ajustes que a UFMG está promovendo para enfrentá-la. “A crise não é de gestão”, garante Borato. Ele cita estudo feito pela Pró-Reitoria de Administração que mostra que a UFMG executa bem o apertado orçamento de que dispõe para manter os campi em boas condições de funcionamento.

Como a Universidade está respondendo aos desafios da crise financeira?

Antes de mais nada, temos questões de curto prazo. De imediato, não temos alternativa a não ser aumentar a arrecadação e realizar cortes. Estas são medidas internas. Sabendo que o orçamento de 2004 é muito semelhante ao de 2003, fizemos uma projeção e concluímos que, se nada fosse feito, chegaríamos a uma dívida de R$ 6,2 milhões. Mas as medidas mais importantes são externas e de natureza política. A Andifes, por exemplo, está negociando com o Ministério da Educação uma suplementação de R$ 66 milhões para que todas as universidades federais paguem suas dívidas de 2003. Também precisamos de uma suplementação para 2004, que, caso não venha, pode representar o início de um processo de perda de qualidade. Uma situação que muito nos preocupa é a redução das bolsas acadêmicas. As bolsas não servem apenas para ajudar as pessoas a se manterem. Sua principal função é a de viabilizar a participação de estudantes em projetos de ensino e extensão (as restrições não afetam os projetos de pesquisa, pois não houve corte de recursos do CNPq). Sem as bolsas, perdem os estudantes porque fica reduzida a possibilidade de participação deles em projetos acadêmicos; perde a Universidade porque fica sem pessoal para desenvolver projetos, e, em última instância, perde a sociedade, que precisa das iniciativas de extensão.

É possível fazer frente a esse déficit apenas cortando despesas? A Universidade não teria de buscar alternativas para aumentar receitas?

Para enfrentar o déficit só com cortes, eles teriam de ser ainda mais profundos do que os que propomos e, em muitos casos, seriam insuportáveis do ponto de vista acadêmico. Cortes mais drásticos também poderiam afetar a segurança e o próprio funcionamento das nidades. Por isso, estamos propondo um aumento de 2% para 5% da taxa de prestação de serviços – regulamentada pela resolução 10/95 – que se destina à Administração Central. Essa é uma proposta feita em caráter excepcional e que está sendo levada ao Conselho Universitário (o assunto será discutido em reunião marcada para o próximo dia 16). Esses 3% a mais que ficariam com a Administração Central seriam usados, como manda a própria resolução, no fomento acadêmico. Com esse adicional, poderíamos pagar as bolsas. Assim, sobrariam mais recursos do orçamento para arcar com despesas de pessoal terceirizado, energia, telefone e manutenção. Essa proposta, repito, precisa ser aprovada pelo Conselho Universitário. Mas desde já assumimos o compromisso de devolver valores aos projetos, caso o orçamento ganhe uma folga com a chegada de uma suplementação de recursos.

Essa crise é estrutural, relacionada à escassez de recursos, ou também seria conseqüência de deficiências de gestão, como alegam alguns críticos da Universidade?

No caso da UFMG, não é um problema de gestão. Recentemente, pedimos ao nosso pró-reitor de Administração (engenheiro Luiz Felipe Vieira Calvo), que visitasse algumas universidades do porte da UFMG – em tamanho e número de alunos – para verificar como são administrados seus campi. Depois de visitar a USP, a Unicamp e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ele constatou que nossos campi são bem cuidados, e a manutenção predial, bastante razoável. Considerando a área de nossos campi e o número de funcionários e alunos, ficou constatado que nosso gasto em segurança e manutenção é relativamente menor. Portanto, o problema não é de gestão.

O que houve, principalmente nos últimos dez anos, foi uma redução do financiamento da Universidade e a falta de reposição de quadros, principalmente de funcionários técnicos e administrativos. Passamos a usar verbas de custeio para pagar pessoal. Não há mais vagas para faxineiros, vigilantes e porteiros na carreira da Universidade. Todos esses postos de trabalho são licitados.

De que forma a gestão do Estado brasileiro nos últimos anos contribuiu para que áreas sociais importantes, como a saúde e a educação, chegassem a esse estágio de penúria?

É óbvio que esse quadro está relacionado com a política econômica, adotada, principalmente, a partir do governo Collor. É a política neoliberal, que prega o Estado mínimo, que vai encolhendo até deixar de exercer funções previstas na Constituição por falta de pessoal e recursos. Infelizmente, o Brasil optou pelo modelo de financiamento do déficit através de capitais voláteis, que aqui entram e saem à vontade, sem qualquer regulamentação. O Brasil oferece a esse capital uma taxa de juros muito alta, que elevou nossa dívida pública para cerca de 60% do PIB em 2003. E o governo Lula manteve essa política econômica, o que era até compreensível nos primeiros meses, porque poderia haver um descontrole das contas do país. Entretanto, a perpetuação desse tipo de modelo vai nos conduzir a um desastre. Esperamos que o governo Lula tenha a coragem de modificar a política econômica vigente. Precisamos que os investimentos públicos sejam retomados para reverter a elevada taxa de desemprego e diminuir as desigualdades sociais.