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O livro entra em cena
Em obra de professor da Fale, o papel, além de meio físico, é protagonista
Patrícia Azevedo
ifícil
enquadrar o livro Tablados,do professor Luis Alberto Brandão, da
Faculdade de Letras, em algum gênero literário. Mas, como esta
informação é importante para posicionar o leitor sobre
determinada obra, vamos lá: Tablados é uma narrativa ficcional.
Na prática, porém, as histórias que o autor reúne
em seu livro são resultado de uma profusão de gêneros:
narrativa, conto, poesia e ficção. Histórias nada convencionais,
assim como a forma de contá-las.
Em Tablados, o autor explora o potencial especulativo do texto literário
trabalhando os espaços da página e do livro. Conforme sugere
o título, o papel é tratado como um palco onde ações
inesperadas se desenrolam. Além de suporte, as páginas e o
próprio livro transformam-se em protagonistas.
A idéia de escrever o livro nasceu da pesquisa que Brandão
desenvolveu em seu pós-doutorado, um trabalho teórico, centrado
na questão do espaço nas obras literárias. Dessa forma,
os conceitos de limite, linha, superfície, extensão, locação
e deslocamento no espaço textual deixam de ser somente reflexões
acadêmicas para serem incorporados às narrativas. “O
próprio trabalho teórico despertou a vontade de transformá-lo
em ficção”, explica Brandão.
Depois de detectado o desejo de realizar o livro, surgiram os desafios.
“Como vou explorar a questão do espaço?”, brinca
o autor, ao lembrar-se de seus questionamentos. Para pôr ordem na
casa e estabelecer uma linha de trabalho, ele concentrou-se na idéia
de que a página é um espaço a ser construído,
assim como o livro.
Tablados divide-se em três partes: Páginas, Livros e Leituras.
Na primeira parte, a página converte-se em muitos lugares: casa,
cais, janela, ruínas impérios. É também cenário
de ações e conflitos. Em um dos textos, o protagonista “se
desespera” ao encontrar a linha extrema da página, que, para
ele, representa o fim do Universo.
Na segunda parte, o livro deixa de ser um simples veículo para tornar-se
agente. Já a terceira parte apresenta reflexões sobre o ato
de ler e os rituais que esse processo envolve. O que significa ler? Para
o autor, pode significar muitas coisas, assim como são as múltiplas
interpretações possíveis para um texto. O ato de ler
pode estar associado a viagem, ao acúmulo de conhecimentos, ao desejo
de dar atenção ao invisível.
Arte ambiciosa
Para muitos, o trabalho de Luis Alberto poderia ser definido como uma “viagem”,
mas o autor garante que não tirou os pés do chão. “A
obra deve ser, antes de tudo, compreensível”, afirma. Os leitores,
garante, encontrarão elementos convencionais da narrativa, como espaço
e personagens. Mas não da maneira com que estão acostumados.
“Queria subverter tudo isso. O livro foi pensado para ser provocativo.
Não desejava simplesmente repetir essa literatura produzida em massa.
Acredito que a arte pode ser algo mais do que mero espelho da realidade.
Pode ser mais ambiciosa e instigadora”, afirma.
Admirador de João Cabral de Melo Neto, que chegava a trabalhar anos
em um mesmo poema, Luis Alberto acredita que a literatura não pode
ser feita sem esforço e dedicação. “A arte exige
trabalho”, diz.
Segundo a crítica e poeta Maria Esther Maciel, que escreveu a ‘orelha’
do livro, cada linha do texto é minuciosamente pensada, de elegância
precisa e beleza matemática. “Tablados explora, com uma inventividade
singular, todas as possibilidades do espaço dentro dos limites ilimitados
de uma página ou de um livro, levando o exercício da metalinguagem
a lugares incomuns e até então intransitados”, conclui
Maria Esther.