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Nš 1497 - Ano 31
25.08.2005




Professor da Unesp defende redução de uso
de animais em práticas científicas

Stelio Luna aponta disparidade entre o número de cobaias sacrificadas
e o de produtos que chegam ao mercado

Ludmila Rodrigues

uso de animais em práticas de ensino e experimentações científicas foi tema da conferência Alternativas ao uso de animais: a realidade brasileira, proferida no último dia 19, no auditório da Reitoria da UFMG, pelo professor Stelio Pacca Luna, da Faculdade de Medicina Veterinária da Unesp, de Botucatu, São Paulo. A conferência integrou a programação do IV Simpósio de Ética em Pesquisa com Seres Humanos e o I Simpósio de Ética em Experimentação Animal.

Durante a conferência, o professor Luna traçou um panorama do uso de animais na pesquisa no Brasil. Segundo ele, apenas um produto – entre cerca de cinco mil testados em animais durante estudos e pesquisas – chega ao mercado. “É preciso reavaliar a relação quantidade versus qualidade”, defendeu o professor, ao apontar o elevado índice de sacrifícios de animais diante do número reduzido de publicações e produtos que alcançam o mercado.

O conferencista ressaltou que tal cenário não é privilégio do Brasil. “No Reino Unido, apenas 25% das pesquisas que utilizam cobaias são publicadas”, compara. E acrescenta: “É um grande desperdício de dinheiro, tempo e vida”.
O professor da Unesp questionou, em vários momentos de sua conferência, a necessidade de usar animais em algumas práticas científicas, que expõem essas criaturas a métodos dolorosos e cruéis. “Procuro me colocar no lugar deles. São indivíduos com suas particularidades”, afirmou Luna.

Segundo ele, muitos desses animais sofrem durante as experimentações, passam por desconforto, danos e lesões, além de medo e estresse. “Se sofrem ao servirem ao homem, temos que, no mínimo, tratá-los dignamente”, diz. Afinal, “os animais têm emoção? Têm inteligência? Comunicam-se?”, questiona. Para o professor, o ideal é repensar essas práticas e propor alternativas. “O importante é ter bom senso e saber cotejar, não podemos dizer que não se aprende com métodos alternativos”, completa.

Alternativas

Softwares, aparelhos simuladores, vídeos e utilização de cadáveres são algumas das alternativas que podem substituir o sacrifício de animais em práticas de ensino e pesquisa. “Métodos alternativos podem ser eficazes”, aponta Stelio Luna.

Como exemplo, ele cita os laboratórios de cosméticos que realizam testes em coelhos para detectar possíveis alergias e inflamações nos olhos causadas por produtos. “Hoje já existe uma proteína que simula as reações dos olhos humanos”, afirma. “Acredito que a transição deve ser gradual, é preciso inovar e mesclar técnicas”, finaliza.

Stelio Luna lembrou que há uma tendência mundial de diminuir o uso de animais em laboratórios e salas de aulas. Segundo ele, 70% das 126 escolas norte-americanas pesquisadas em estudo recente não possuem biotérios (viveiros de animais empregados nas experiências). Pesquisadores australianos já reduziram em 90% o uso de animais e, na Inglaterra, há cem anos não se utiliza cobaias em práticas de ensino.

 

Evento discutiu
visão abrangente da bioética

Realizados no campus Pampulha nos dias 18 e 19 de agosto, o IV Simpósio de Ética em Pesquisa com Seres Humanas e o I Simpósio de Ética em Experimentação Animal apresentaram, em conferências, uma visão abrangente da bioética. Entre os destaques, as palestras do filósofo Renato Janine Ribeiro (Responsabilidade ética), do professor Dirceu Greco, da Faculdade de Medicina (Uma só ética) e da professora Marilene Michalick (Biotérios: uma questão de ética), do ICB, além das mesas-redondas O ensino da ética e A ética no ensino e na pesquisa.
Os dois eventos foram organizados pelo Comitê de Ética em Pesquisa, que trata de estudos com seres humanos (Coep/UFMG), e pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal (Cetea/UFMG), que normatiza práticas com cobaias.
O Coep avaliou, apenas no ano passado, procedimentos em cerca de 600 pesquisas, doze vezes mais do que em 1997, ano de sua criação. “Esse crescimento resulta da maior conscientização dos pesquisadores e dos pré-requisitos das agências de fomento e das publicações científicas especializadas”, comenta a professora Maria Elena de Lima Perez Garcia, uma das coordenadoras do IV Simpósio de Ética em Pesquisa com Seres Humanos.

Já a professora Cleuza Maria de Faria Rezende, coordenadora do I Simpósio de Ética em Experimentação Animal e presidente do Cetea, também observa um franco crescimento do debate sobre a conduta ética nos experimentos animais, principalmente a partir do surgimento, em julho de 2000, do Comitê. Segundo ela, o Comitê definiu 15 princípios para a conduta do pesquisador. Entre eles, está o ideal de que os seres vivos só podem ser utilizados em estudos que resultem em benefícios para eles próprios e para os homens. Além disso, todo o sofrimento deve ser evitado. Em caso de seqüelas, os animais devem ser sacrificados, mas por especialista, e sem dor.