Busca no site da UFMG

Nº 1526 - Ano 32
13.04.2006

Em busca do acaso

Ernesto Magalhães*

o semestre passado, quatro alunos de graduação foram intimados a cumprir uma missão. Assim como um repórter é chamado pelo seu editor para fazer uma reportagem nas ruas de Belo Horizonte, nós, estudantes do curso de Comunicação Social, fomos chamados para uma tarefa especial. “Que tal vocês serem correspondentes internacionais do Centro de Comunicação da UFMG?”. Na hora parecia legal. Viajar, levar gravador, fita, e entrevistar, quem sabe, em outra língua. Aceitamos. Ernesto iria cobrir os acontecimentos nos Estados Unidos, Joyce mandaria notícias do Canadá, Marina contaria o que viu na França e Sílvia relataria o que se passa na Inglaterra. Digo-lhes que não é uma tarefa fácil. Mais tarde, ao entrevistar os correspondentes internacionais da Rede Globo, em Nova Iorque, pude perceber que esse problema também foi enfrentado por eles.

“Quando você está começando, até o inglês é complicado. Não é fácil entender a cultura, os significados”, me disse Heloísa Villela, 43 anos, que já está nos Estados Unidos há 17 anos. Jorge Pontual, 57 anos, que está lá há 10, concorda com a dificuldade da língua e lembra que, no início, a adaptação não é fácil: “Você lê, mas o inglês falado no dia-a-dia é muito diferente. É difícil atender ao telefone, porque a pessoa do outro lado da linha fala rápido. E também tem o inverno. Quando cheguei aqui, fazia um frio...”

Para nós, não foi diferente, acredito que até mais desafiante. Jovens, estudantes, cheios de responsabilidades, como morar sozinhos pela primeira vez, ter que estudar, procurar trabalho para ajudar nas despesas. E sem falar do lado emocional, que vai nas alturas. Sair, conhecer gente diferente, outra cultura, preocupar-se com o namoro que deixou aqui, ou com o que encontrou lá. Ainda assim tínhamos que sentar, pensar em pauta, nos corresponder com os jornalistas e estagiários do Cedecom para gravar a matéria por telefone. Sim, deu muito trabalho.

Mas, aos poucos, fomos nos virando, enxergando matérias em vários assuntos do cotidiano. Uma situação vivida também pelos correspondentes mais experientes, como o próprio Pontual: “O que a gente mais faz é coisa pequena, até porque é raro você ter a oportunidade de viver algo como um 11 de setembro. E não é a toda hora que se consegue entrevistar os grandes nomes. O que a gente faz é o dia-a-dia”.

E ainda assim, a Joyce teve a chance de entrevistar o Seu Jorge, quando ele se apresentou em Toronto. Às vezes, até parece que estamos vivendo ao acaso. Já me disseram que eu tenho muita sorte, que seria ótimo trabalhar comigo. A história da entrevista com os dois correspondentes é um exemplo disso. Em dezembro do ano passado, no dia em que cheguei em Nova Iorque, fiquei perdido, procurando a estação de metrô que me levaria para casa. Pensei em parar a primeira pessoa que passasse por mim para pedir ajuda. E lá vinha ela na minha direção. Mal podia acreditar. No meio de um aperto, precisando de informação, achei logo uma jornalista: Heloísa Villela. Foi a partir desse encontro inesperado que pensei em procurá-la depois para fazer uma entrevista. Acabei convidando também o Pontual. Gravei com ele no escritório da Globo e com ela, em sua casa, no Upper East Side.

Descobri coisas interessantes sobre os dois: que ele precisou mostrar em um dia, debaixo de chuva, por que Vancouver é a melhor cidade do mundo, e que ela se emociona com seu trabalho de repórter, mas não com suas matérias que vão ao ar. Também me assustei logo de cara, ao saber que os dois, com seu sotaque de carioca bem carregado são, na verdade, mineiros de Belo Horizonte.

Como disse, parece ser tudo um acaso. Mas vi que não. Acredito que estamos em busca do acaso: ao fazer Comunicação Social, ter sido estagiário do Cedecom, fazer intercâmbio pela Diretoria de Relações Internacionais e, aí sim, ter a sorte de contar, como parceira, uma Universidade pública de qualidade e que não tem medo do desafio e de apostar em projetos como esse.

“Eu achei sensacional. Porque na época em que era estudante nunca ouvi falar disso. Dessa oportunidade de conhecer uma outra universidade, um estudante de jornalismo de outro país, e até de fazer esse tipo de trabalho que vocês estão fazendo, fazer matéria... Imagina! Quando era estudante nunca sonhei com uma coisa dessas. É uma oportunidade muito bacana que vocês devem aproveitar ao máximo”, disse Heloísa quando soube do motivo que me levou a entrevistá-la. Já Pontual enxerga essa experiência como um ótimo início de caminhada na profissão. “Quando forem trabalhar, já terão uma vantagem enorme. Dominar outra língua, saber como se trabalha em outros países, o que é muito diferente no Brasil. É uma experiência muito boa”.

E esse projeto veio para ficar! Joyce continua no exterior e mais três correspondentes enviam matérias da Argentina e do Havaí. Boa sorte a eles e a nós, ex-correspondentes, que, com essa oportunidade incrível, pudemos realizar o sonho de ter o mundo ao nosso alcance.

*Aluno do 7o período do curso de jornalismo da Fafich e ex-correspondente do Cedecom nos Estados Unidos

Esta página é reservada a manifestações da comunidade universitária, através de artigos ou cartas. Para ser publicado, o texto deverá versar sobre assunto que envolva a Universidade e a comunidade, mas de enfoque não particularizado. Deverá ter de 4.000 a 4.500 caracteres (sem espaços) ou de 57 a 64 linhas de 70 toques e indicar o nome completo do autor, telefone ou correio eletrônico de contato. A publicação de réplicas ou tréplicas ficará a critério da redação. São de responsabilidade exclusiva de seus autores as opiniões expressas nos textos. Na falta destes, o BOLETIM encomenda textos ou reproduz artigos que possam estimular o debate sobre a universidade e a educação brasileira.