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Nº 1527 - Ano 32
20.04.2006

Imagem, esta ilustre excluída

A partir da representação feminina na publicidade, dissertação analisa papel secundário atribuído pelas escolas ao chamado “texto não-verbal”

Manoella Oliveira

insistência das instituições de ensino em se aprofundar no mundo das letras exclui, muitas vezes, outras formas importantes de texto, como a imagem. É o que conclui a professora de português Carolina Duarte, em dissertação de mestrado defendida recentemente junto à Faculdade de Letras. A pesquisadora, que entende e ensina texto como “tudo que pode ser lido e interpretado”, sempre observou que seus alunos tinham dificuldades para apreender esse conceito e ocupou-se do tema. “É paradoxal. A escola tenta fazer com que as pessoas leiam melhor, mas se concentra apenas na escrita”, afirma.

Peças publicitárias com mulheres representadas, extraídas da revista Veja, foram o material básico para analisar a imagem como texto não-verbal. “É interessante pensarmos a representação da mulher na publicidade e o espaço social que ela, de fato, ocupa”, diz a professora. “Nas publicidades femininas, a representação de mulheres aparentemente independentes, que exercem ocupações extra-domésticas, coexiste com a evocação de lugares comuns, como a crença de que a beleza física é a principal manifestação do poder feminino”, explica.

Segundo Carolina Duarte, como dão significado às imagens, os publicitários partem de relações e idéias existentes para ultrapassá-las. No caso da mulher, essa mudança de conceitos é lenta e gradual. Os anúncios evoluem a partir da percepção do público, que não absorve todo o volume de informações transmitido. Assim, os reclames parecem reafirmar padrões. “Gênero social não é a diferença entre os sexos, mas o conjunto de expectativas em relação aos comportamentos sociais esperados de acordo com o sexo”, define Carolina. E a expectativa em relação à mulher, segundo ela, não evoluiu como seria desejado, devido à forma como é retratada pela mídia, ainda que sua representação social tenha se modificado.

Leitura ingênua
Segundo a pesquisadora, imagens não são óbvias, mas o ensino privilegia outros conteúdos, e as idéias transmitidas pelas imagens adquirem papel secundário. “Receio a leitura ingênua, o não-posicionamento crítico em relação ao que se vê. As pessoas ficam alienadas imageticamente porque perdem as informações contidas ali”, diz Carolina Duarte.

No início de sua escolarização, as crianças entram, ludicamente, em contato com gravuras e desenhos. Só que o processo é interrompido para dar espaço às letras, e a imagem volta à cena na vida dessas pessoas muito tempo depois, às vésperas do ingresso na universidade. “Ao se deparar com a imagem, o indivíduo ainda a reconhece como ilustração, não consegue ler a ideologia nela contida”, afirma a professora.

A sociedade é multimodal, trabalha várias linguagens ao mesmo tempo, e a cultura a cada dia se torna mais imagética. Características que se devem, em parte, aos meios de comunicação. De acordo com a professora, em um país em que as oportunidades culturais são pouco democráticas, as pessoas tendem a absorver os conteúdos que chegam até elas da maneira mais fácil, notadamente aqueles que recorrem ao apelo visual. “Quando lemos um jornal, por exemplo, temos a opção de selecionar as notícias que queremos ler. A imagem exclui essa possibilidade, querendo ou não você vai vê-la, é um processo muito rápido”, argumenta.

A leitura inadequada de um texto causa danos ao próprio indivíduo, afirma Carolina Durarte. Para ela, caberia à escola a função de reduzir as diferenças sociais no quesito leitura. “Vejo dificuldade de as pessoas se posicionarem até em relação ao que lêem. E o que a sociedade lê? O que a sociedade vê?”, questiona.

Dissertação: A imagem da mulher em peças
publicitárias: a construção de uma interface entre
gênero social e multimodal

Autor: Carolina Duarte de Azevedo Morais Santana
Defesa: fevereiro de 2006, na Faculdade de Letras
Orientadora: Sônia Maria de Oliveira Pimenta