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Nº 1532 - Ano 32
25.05.2006

A inclusão no curso médico

Comunidade acadêmica defende medidas para ampliar participação de alunos pobres numa das áreas mais elitizadas da Universidade

ual é a cor do curso médico? O perfil socioeconômico de nossos alunos espelha a nossa sociedade? Nossos índices de evasão e de retenção são os mesmos para negros, brancos, ricos e pobres? Há algo que possamos fazer para que nosso espelho seja menos distorcido? Essas questões, segundo o professor André Cabral, coordenador do curso de Medicina, deveriam servir de ponto de partida em um debate sobre a inclusão no curso, um dos mais elitistas da Universidade.
Dúnia Capelli

Cabral: espelho

“De nada adianta sermos elitistas na qualidade se não formos democráticos na quantidade”, sentencia o professor, que acaba de assumir a coordenação do curso, cujo vestibular é o que reúne os candidatos com melhor desempenho na UFMG. Cabral acredita que há algumas particularidades do próprio Vestibular que dificultam a inclusão, como o caráter classificatório da prova de língua estrangeira. “Os candidatos mais favorecidos têm alto índice de acerto na comparação com os menos favorecidos. Talvez seja interessante termos uma prova de inglês apenas eliminatória. Ou seja, bastaria que o candidato conseguisse atingir uma média e, a partir daí, todos estariam em pé de igualdade”, defende Cabral.
Eber Faioli

Maria do Carmo:
reserva de vagas

A inclusão no curso médico também preocupa Janete Ricas, professora do departamento de Pediatria e ex-coordenadora do curso. Ela vê com bons olhos o debate aberto pelo reitor Ronaldo Pena. Segundo ela, o vestibular, por ser classificatório e extremamente disputado, deixa de fora estudantes com ótima formação e capacidade para seguir o curso. “Não acredito que haja diferença de inteligência potencial entre o estudante de escola pública e o da escola privada”, diz Ricas, acrescentando que o curso médico não requer apenas formação técnica: “Ele também exige maturidade, formação ética e vocação humanística, características que não vejo como predominantes neste ou naquele grupo”.
Foca Lisboa

Nilma Lino: “posição reticente”


A UFMG decidiu que a ampliação das vagas noturnas é a sua política preferencial de inclusão. Mas estudos da própria Universidade dão conta de que esse mecanismo é insuficiente em relação a cursos mais disputados ou cujo funcionamento só é possível durante o dia. “Nesses casos, temos que avaliar com muito cuidado, mas também com muito boa vontade, a questão da reserva de vagas”, defende a professora Maria do Carmo Lacerda Peixoto, diretora de Avaliação Institucional da UFMG.

O caso da Medicina, segundo ela, é emblemático. “Seu grau de competição é tão elevado que a diferença de pontuação entre os primeiros 50, 100 candidatos desclassificados é muito pequena em relação aos classificados. Precisamos estabelecer um critério que contemple os desafios da expansão e da inclusão. Devemos pensar a forma mais adequada para adotar a reserva de vagas”, pondera a professora.

Sensibilidade

Foca Lisboa

Antônia Aranha: democratização

Já a professora Nilma Lino Gomes, do Programa Ações Afirmativas, elogiou a iniciativa do reitor de abrir o debate sobre inclusão. “Ele começou seu mandato demonstrando sensibilidade diante da situação de desigualdade social no ensino superior em geral e, de maneira específica, na UFMG”. Ao defender que o assunto seja amplamente debatido pela comunidade acadêmica e pelo Conselho Universitário, Nilma criticou o que chama de “posição reticente” da UFMG diante da questão das cotas: “Isso, na minha opinião, só tem trazido desvantagens internas e externas. Internas, porque nega uma realidade de desigualdade social real reproduzida nos cursos e áreas do conhecimento existentes na universidade. E externas, porque nos coloca, em nível nacional, ao lado da opinião dos setores conservadores da universidade pública que acabam por ganhar expressão na mídia e conseguem interferir nas decisões dos órgãos acadêmicos e dos setores políticos”.

Outra integrante do Ações Afirmativas, a professora Antônia Vitória Soares Aranha, diretora da Faculdade de Educação, apóia o desafio lançado pelo reitor Ronaldo Pena. “Tratar de maneira igual os desiguais contribui para perpetuar as injustiças sociais. A proposta do reitor pode contribuir para tornar a universidade mais inclusiva e é um bom início para democratizar um dos cursos mais elitizados da Universidade”.

debate aberto pelo reitor Ronaldo Pena Durante a posse da nova diretoria da Faculdade de Medicina, o reitor Ronaldo Pena lançou o seguinte desafio: “Não seria esse o momento, senhoras e senhores, de construir uma experiência generosa e justa em que poderíamos oferecer o tratamento diferenciado que nosso espírito de solidariedade nos recomenda? A título de sugestão: não seria possível separar, adotando medidas de controle adequadas, 80 vagas ou 60, por exemplo, do total das 320, e oferecê-las apenas aos candidatos oriundos de escolas públicas que atingirem um determinado desempenho?”