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Nº 1575 - Ano 33
30.4.2007

Campanha salarial ainda que tardia

Eduardo Fajardo Soares**

Q

uando Lula ganhou as eleições em 2002, não tinha, honestamente, qualquer ilusão de que nós, funcionários das universidades federais, iríamos “nadar de braçada” ou “deitar e rolar”, só para ficar em duas expressões bem populares. Os tempos são outros. Vivemos sob a égide do império globalizado neoliberal, aliás, muito pior que a Nova República do Sarney, instaurada há mais de 20 anos. Ali, sim, recorrendo a outra expressão popular, tiramos a “barriga da miséria”. Ganhamos, nos extertores da ditadura, um plano de cargos e salários e fizemos a greve de 1984, uma das mais gloriosas páginas escritas pelo movimento sindical das universidades brasileiras.

Tudo isso durou até 1994, quando a era FHC implantou, com alguns anos de atraso, o neoliberalismo, caminho traçado por Pinochet, no Chile, em 1973, e seguido por Reagan, nos Estados Unidos, e, em doses cavalares, por Margareth Tatcher, a Dama de Ferro, na Inglaterra dos anos 80. Todos eles concentraram renda e capital, comprimiram a massa salarial, encareceram a vida, aumentaram o fosso social e desmontaram o Estado, confiando no princípio de que a mão invisível da livre concorrência regularia todas as relações. Durante mais de dez anos, os servidores federais não receberam aumento salarial e sequer tiveram reposição de perdas. Por outro lado, mesmo sem me iludir, esperava que o novo governo “popular” pelo menos fosse capaz de desafogar o funcionalismo do arrocho imposto pela gestão anterior. No final do governo FHC, já no início do terceiro milênio, a água do arrocho estava entrando pelas narinas, com todos nas pontas dos pés, quase morrendo afogados em dívidas. Mas com a vitória de Lula, cuja popularidade foi galvanizada na classe média por força das universidades federais, onde estão seus melhores quadros, esperávamos que ele drenasse tal alagamento na cintura, num primeiro momento, para depois nos levar, em terra firme, à construção de uma grande universidade pública de que tanto um país soberano necessita.

No entanto, o máximo que conseguimos foi que a água ficasse estacionada no queixo, num patamar suficiente apenas para evitar nosso afogamento. Mas a maior traição “a quem sempre lhe deu a mão” ainda estava por vir, com a aprovação, em ritmo de rolo compressor, de uma nova lei previdenciária, a famigerada Emenda Constitucional 41, que suprime ganhos históricos dos funcionários, institui impostos para os aposentados e estabelece que o pobre do servidor que for obrigado a aposentar-se precocemente o faça ganhando um quarto do salário.

Como se não bastasse, o atual governo tenta aplicar o antigo Plano Bresser, da era FHC, que considera como funcionários públicos apenas as típicas carreiras de Estado: fiscais, policiais federais e juízes. Nós, das universidades, seríamos dispensáveis, mão-de-obra facilmente terceirizável.

Com muita luta e energia excessivamente gasta na greve da reforma da Previdência, a Fasubra, nossa outrora combativa federação sindical, liderou um movimento que, no máximo, conseguiu um fajuto plano de carreiras e salários, todo pomposo, mas que, entre outros absurdos, admite uma vantagem pessoal nos salários, que penaliza o segmento dos servidores de nível superior, “beneficiários” dos mais aviltantes salários da categoria dos técnicos das universidades federais. Uma distorção comprovada pelo fato de que o teto dos servidores de Nível Superior (NS) é pouco mais que o dobro do piso do nível de apoio (NA), algo que redunda num evidente desestímulo para qualificação dos profissionais de NS e até mesmo de atração para os concursos. Trata-se, portanto, de um nível funcional fadado à extinção.

Já com grande atraso e após o anúncio do ridículo aumento salarial dado ao funcionalismo, sem qualquer respeito à data-base, o nosso sindicato (Sindifes-BH) encaminhou, em março, a campanha salarial da categoria. Até agora, foram realizadas três assembléias e o cenário da mobilização não é nada animador. O que presenciei foram assembléias pouco objetivas e cujos oradores, perdidos em intermináveis pedidos de informações e esclarecimentos, deixaram de discutir o essencial: a gravíssima situação salarial e das carreiras dos técnicos das universidades federais.

Apesar de tudo, ainda é possível enxergar, pelo menos, um ponto positivo nesse processo. Ao contrário das lideranças sindicais das universidades, que até agora não mostraram disposição para defender os interesses dos servidores, os formadores de opinião da categoria compareceram em grande número às assembléias. Recai sobre essas figuras combativas e respeitadas a esperança de que consigamos reverter o imobilismo vigente. Estamos diante de uma crise, mas percebemos que a base do movimento está disposta a lutar. O que se espera é que esse espírito contagie as lideranças do movimento, que precisam urgentemente assumir as rédeas de uma empreitada que promete ser árdua.

*Servidor técnico-administrativo da Escola de Arquitetura. Representa o segmento na Congregação da Unidade e é membro suplente do Conselho Universitário.

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